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quinta-feira, 16 de agosto de 2012

Esclarecimentos sobre a extinção dos contratos no direito brasileiro

 

 

Como todo negócio jurídico, o contrato cumpre seu ciclo existencial que vai do nascimento com o advento do consentimento, desenvolve-se, e termina. É patente que o direito obrigacional que é alimentado pelo contrato, é essencialmente transitório.

 

 

Normalmente, cessa com a prestação, a solutio é o que chamamos de sua morte natural, com consequente liberação do devedor e, a correspectiva satisfação do credor. Não importa a natureza da solução que é tema mais propício ao direito das obrigações.

 

 

Por vezes, a morte do contrato é abrupta posto que seja fulminado pela declaração de sua invalidade, quando ocorre defeito na sua formação subjetiva, ou de ordem objetiva, ou ainda de ordem formal travando assim o pleno e completo desenvolvimento da declaração de vontade e a produção de todos seus efeitos. Obstando desta forma tanto sua validade como sua eficácia.

 

 

Alude claramente Caio Mário as causas de rescisão contratual e por motivos especiais. Assim esses são revogados por fraude contra credores (tanto no caso de insolvência quanto no de falência).

 

 

Quando abordamos a teoria das arras que embora tenha função acessória, e de caráter notadamente penitencial, o que faculta obviamente o arrependimento e o desfazimento do vínculo contratual mediante a perda das arras ou sua restituição em dobro.

 

 

Já a impossibilidade da prestação que tanto na obrigação de dar quanto na de fazer, autoriza a resolução contratual com pedras e danos, se houver culpa do devedor, ou sem ressarcimento indenizatório se não a houver.

 

 

Pari passu é fundamental demonstrar que o caso fortuito e a força maior são escusativas excludentes de responsabilidade com a liberação do devedor. Salienta o insigne mestre Caio Mário que o caso fortuito é o acontecimento natural, ou o evento derivado de força da natureza, ou fato das coisas.

 

 

Conceitua-se força maior como damnum originado por fato de outrem como a invasão de um território, guerra, revolução, motim, ato emanado por autoridade (factum princpis), a desapropriação ou furto.

 

 

Não é qualquer acontecimento, mas somente aquele que impossibilita o adimplemento da obrigação. Para Caio Mário a onerosidade excessiva não se configura quer como caso fortuito, quer como força maior.

 

 

O obstáculo ao adimplemento tem que ser alheio ao poder dos contratos, oriundo da natureza ou de fato de terceiro. Requer-se, portanto que seja inevitável. E, há doutrinadores que ainda reforçam a exigência com a imprevisibilidade, o que Caio Mário repudia pois se surgiu a força indomável e suficiente para obstar o cumprimento da obrigação, o devedor não responde pelo prejuízo.

 

 

Por vezes, a imprevisibilidade determina a inevitabilidade.

 

Para o direito positivo brasileiro tanto o caso fortuito como a força maior operam a exclusão da responsabilidade por inadimplência obrigacional.

 

 

Já na resilição voluntária temos o atuar da vontade humana que é declarada em consonância com a ordem jurídica, e como é dotada de poder jurígeno capaz de criar o contrato e, também, capaz de desfazê-lo. A resilição poderá partir de uma das partes ( a unilateral), ou de ambas partes( bilateral ou distrato).

 

 

A resilição bilateral ou distrato é prevista pelo art. 472 C.C., é o contrario consensus dos romanos gerando o contrato liberatório, também chamado de mútuo dissenso. A referida avença liberatória rompe o liame contratual. A lei, no entanto, determina que deve adotar a mesma forma (grifo nosso) que se utilizou para contratar. O distrato produz efeitos normalmente ex nunc.

 

 

A resilição unilateral possui caráter de exceção por força do princípio da obrigatoriedade do contrato. O comodato, o mandato, o depósito por sua própria etiologia admitem tranquilamente a resilição unilateral. Posto que sejam contratos unilaterais e, por vezes, até bilaterais imperfeitos.

 

 

Também os contratos de execução continuada ou trato sucessivo quando por prazo indeterminado comportam a resilição unilateral ou denúncia que é promovida por uma das partes contratantes.

Observe-se que no contrato laboral regido pela CLT por prazo indeterminado embora comporte a resilição unilateral, temos que observar forçosamente o aviso prévio, variável em função do regime salarial. Advirto, porém, que antes se consulte a recente Lei 12.506/2011.

 

 

Os efeitos da resilição unilateral (denúncia) e a resilição bilateral (distrato) divergem substancialmente quanto aos seus efeitos.

 

 

É o que expõe o parágrafo único do art. 473 do C.C. e, dependendo da natureza do contrato, a denúncia unilateral só produzirá efeito depois de transcorrido prazo compatível com a etiologia particular do contrato e ainda com o vulto dos investimentos realizados. Essa é uma novidade trazida à baila pelo Código Civil de 2002.

 

 

Assim, caberá o ressarcimento de perdas e danos. Porém, é curial alertar que não é qualquer contrato onde é aplicável o referido parágrafo único do art. 473 C.C., pois existem avenças, como por exemplo, o mandato, admite tranquilamente a resilição unilateral incondicional posto que tenha como base a relação de confiança entre mandante e mandatário. Restando aos prejudicados apenas a indenização pelos eventuais danos sofridos, sem a possibilidade compulsória de sua dilatação obrigatória ou compulsória.

 

 

No contrato personalíssimo ou intuitu personae a impossibilidade executiva sem culpa se dá com a morte daquele pessoalmente envolvido pelo vínculo contratual traz fatidicamente a resilição unilateral uma vez que é insubstituível o contratante falecido. Pode-se dizer, no entanto, que é trata-se de modalidade de resilição convencional tácita posto que a extrema pessoalidade do vínculo contratual também ajustou uma cláusula implícita de extinção. (Mazeaud et Mazeaud)

 

 

Como o brilhante Pablo Stolze Gagliano destaca o intrincado tema da extinção contratual está emaranhado em relevantes questões correlatas como a exceção do contrato não cumprido, a teoria da imprevisão e o inadimplemento contratual, com a responsabilidade civil. Todos esses temas deverão estar sob a égide do princípio da função social do contrato e da boa-fé objetiva.

 

 

Convém, em boa hora, destacarmos as importantes distinções entre os termos resilição, resolução e rescisão.

 

 

Resilição será somente para extinção baseada na declaração de vontade posterior de uma ou das duas vontades; resolução para extinção contratual baseada no descumprimento contratual e rescisão como modalidade específica de dissolução para os contratos.

 

 

A extinção natural do contrato quer pelo cumprimento ou pagamento do pactuado ou a verificação de fator eficacial. Extinção posterior por causa anterior ou contemporânea à celebração quer por nulidade, cláusula resolutória, direito de arrependimento e redibição. Extinção posterior por causa posterior à celebração seja por resilição, resolução, rescisão ou ainda por morte do contratante.

 

 

Compreende-se na resilição unilateral a declaração unilateral de vontade, manifestada em função de cláusula ajustada em contrato bilateral. Apear de haver notificação unilateral ocorre a cessão contratual que é efeito bilateral, o que levou a certos doutrinadores a denominá-la de resilição convencional.

 

 

No antigo direito romano havia na compra e venda uma cláusula (lex commissoria) segundo a qual se operava a resolução contratual por falta de pagamento do preço. Nos contratos inominados, o pretor criou mais tarde, uma condictio, pela qual o contratante se esquivava do prometido em face do descumprimento da outra parte.

 

 

Foi na Idade Média que a praxe inseriu em todos os contratos uma lex commissoria pactuando assim a resolução por inadimplemento. E, coube aos canonistas fazer seu fortalecimento por meio dos princípios morais em respeito à boa fé.

 

 

Os Códigos modernos adotaram a cláusula resolutiva tácita presente em todo contrato bilateral, onde a inexecução por uma das partes tem como efeito facultar à outra parte poder de promover sua resolução, se não preferir a alternativa de reclamar a prestação, muito embora não tenham sido ajustadas estas consequências.

 

 

Grande busilis paira sobre o fundamento da cláusula resolutiva tácita. Alguns doutrinadores assentam-na na teoria da causa, sob a alegação de que nos contratos bilaterais e sinalagmáticos, sendo a obrigação de uma parte corresponde a causa da outra, e vice-versa, o seu descumprimento gera a resolução do contrato.

 

 

A explicação não satisfaz, pois a cláusula resolutiva tácita não é incompatível com os sistemas não causalistas (como é o brasileiro) porque o credor pode exigir do devedor a execução do obrigado, ao invés da resolução contratual.

 

 

Por outro lado, se a causa é erigida em elemento do negócio contratual, sua falta gera a nulidade e, não necessariamente a resolução.

 

 

Para Picard e Prudhomme seu fundamento é a equidade (grifo nosso) que não admite a execução contratual quando ocorre desequilíbrio gerado pela inexecução.

 

 

Assentada no bojo contratual a interdependência das prestações avençadas, a inexecução de qualquer dessas traz a resolução por inexecução.

 

 

A teoria da cláusula tácita resolutiva remonta diretamente a interdependência das prestações, devendo ser expressa como hipótese de resolução por inexecução de um dos contratantes como consequência natural.

 

 

Quanto à atuação da clausula resolutiva tácita, dois entendimentos doutrinários desenham suas respectivas repercussões legislativas. O primeiro é do direito alemão capitaneado pelo BGB § 326: nos contratos bilaterais, um dos contratantes pode assinar ao outro, que esteja em mora, prazo para efetuar a prestação que lhe compete, sob pena de recusá-la, após a sua expiração, resolvendo o contrato ou exigindo a reparação das perdas e danos.

 

 

No sistema alemão é desnecessário o pronunciamento judicial, operando-se ex lege a cláusula tácita a resolução do ajuste, mediante a atuação direta do próprio interessado.

 

 

O segundo entendimento corresponde ao sistema francês: descumprindo o contrato bilateral, abre-se uma alternativa ao lesado para exigir a sua execução ou resolvê-lo com perdas e danos. Mas não cabe a atuação direta do interessado. Somente é admissível a resolução mediante sentença, em que o juiz aprecia a conduta do contratante acusado.

 

 

Por esse sistema, o interessado não tem direito à resolução automática da avença, porém a legitimidade ad causam para iniciar o processo judicial visando esse objetivo. Indo além, o Código francês confere ao juiz a faculdade de conceder ao contratante-réu, um prazo, conforme as circunstâncias.

 

 

Inclinou-se o Código Civil pátrio pela orientação francesa o que afina melhor com princípios dominantes em nosso direito anterior. Desta forma, a parte lesada pelo inadimplemento pode requerer a resolução contratual com perdas e danos (art. 475 C.C).

 

 

Salienta que o art. 474 do C.C. que a condição resolutiva tácita depende de interpelação judicial com fixação de prazo para que a parte faltosa efetue a prestação que lhe compete, sob pena de resolução contratual.

 

 

Caio Mário aplaudia nosso sistema vigente. Mas frequentes são os descontentamentos e as partes ajustam que a inexecução da obrigação importa na resolução de pleno direito. É o ressuscitar da antiga lex commissoria que opera a ruptura do vínculo contratual como consequência da vontade mesma criadora deste, diante da cláusula resolutiva expressa.

 

 

Todavia, se o contratante descumpre a obrigação na forma e no tempo ajustado, resolve-se automaticamente a avença sem a necessária interpelação do contratante faltoso (arts. 474 e 128 do C.C.). É um efeito da mora ex re nas obrigações líquidas a prazo certo que opera a resolução e ainda sujeitar o inadimplente às perdas e danos.

 

 

A resolução pleno iure do contrato sem a devida proteção dos economicamente débeis tem sugerido ao legislador a sua proibição quando interfere com a economia popular.(Dec.-Lei 58/1937, Lei 6.766/79 onde a interpelação é sempre necessária; ou na venda com reserva de domínio, em que o protesto do título cambial é requisito essencial da ação de apreensão da coisa ( art. 1.071 do CPC).

 

 

Não se confunde a resolução contratual por cláusula resolutiva tácita ou expressa com a declaração de nulidade ou anulabilidade do contrato. É certo que a resolução opera-se retroativamente, não faz abstração do negócio jurídico desfeito.

 

 

É que nos contratos de trato sucessivo não se restituem as prestações já efetuadas (art. 128 CC) e nas demais, não se entrega a coisa devida (res debita) posto que a relação jurídica contratual deixa de existir.

 

 

Mas aquele que dá causa a resolução contratual arcará com as perdas e danos, ou com a cláusula penal estipulada.

 

 

Já diferentemente a ineficácia pressupõe uma declaração de vontade inoperante, ou um defeito de ordem formal e o desfazimento opera-se ex tunc, fulminando desde a origem (nulidade); ou ex nunc (anulabilidade) atingindo-o a partir da sentença mas sem sujeitar qualquer dos contratantes a perdas ou danos ou à multa convencionada.

 

 

A exceptio non adimpleti contractus é uma defesa substancial oponível pelo contratante demandado em face do inadimplente tendo em vista a interdependência das prestações. É expressa no art. 476 do C.C./2002 e, também o BGB expede regra análoga, mas a regra vigora como decorrência natural do contrato sinalagmático.

 

 

A exceptio é causa impeditiva de exigibilidade daquele que não efetuou a prestação por parte daquele que não efetuou a sua, franqueando ao outro uma atitude de justa expectativa, enquanto aguarda a normal execução do contrato.

 

 

Vige grande controvérsia sobre a origem da exceptio. Frederic Girard, grande romanista defende sua origem romana. Cassim em monografia especializada ao tema, já atribui o instituto aos canonistas. É certo que nos contratos bonae fidei ao contratante acionado pelo não havia adimplido reconhecia uma exceptio doli que seria um germe da exceptio non adimpleti contractus. É instituto desenvolvido e dotado de efeitos específicos e, Serpa Lopes também lhe atribui aos canonistas.

 

 

Assim, se um dos contratantes não adimple de forma plena e completa pode o outro opor-lhe em defesa esta exceção levada ao extremo de recusar a res debita, é a exceptio non adimpleti rite contractus, onde há inexatidão do implemento da outra parte equivale à falta de execução desta.

 

 

Animado o instituto pela equidade e pela boa fé não pode erigir-se em pretexto para descumprimento contratual. Se ambas as prestações têm de ser realizadas sucessivamente.

 

 

Não cabe invocar a exceptio por parte quem deve em primeiro lugar adimplir, pois que a prestação do outro não é devida; mas ao que tem de prestar em segundo lugar, cabe o poder de invocá-la, se o primeiro deixou de cumprir.

 

 

O art. 475 do C.C. autoriza o contratante que deveria em primeiro lugar adimplir, o direito de recusar-se a prestar, se depois de concluído o contrato, sobreviver ao outro contratante alteração econômica capaz de comprometer ou tornar duvidosa a prestação a que se obrigou.

 

 

Cinge-se como medida excepcional, pois que ajustadas prestações combinadas. Não há predeterminação de garantia que pode ser fidejussória ou real. Uma vez que prestada a caução esta caduca com a prestação devidamente cumprida.

 

 

Quanto à resolução por onerosidade excessiva, cumpre destacar que em todo contrato há previsão de lucro ou prejuízo. O direito não pode restar insensível às vicissitudes que constritas ao lícito, podem afetar a execução do contrato.

 

 

A teoria tornou-se conhecida como cláusula rebus sic stantibus e consiste, resumidamente, em presumir nos contratos comutativos, uma cláusula implícita, segundo a qual os contratantes estão adstritos ao seu cumprimento rigoroso, no pressuposto de que as circunstâncias ambientes se conservem inalteradas no momento da execução, posto que idênticas àquelas que vigoravam na ocasião da celebração contratual.

 

 

A Primeira Grande Guerra mundial (1914-1918) trouxe grande abalo e desequilíbrio nas relações contratuais de longo prazo. Votou a França, a Lei Faillot de 21/01/1918 que versava sobre os contratos de fornecimento de carvão, concluídos antes da guerra; ao mesmo tempo na Inglaterra, vigeu a doutrina do Frustation of adventure; retomou-se na Itália a cláusula rebus sic stantibus, reconstituindo-se em toda parte, a proteção do contratante contra a onerosidade excessiva superveniente, o que pendeu para o princípio da justiça no contrato.

 

 

Jair Lins, Mendes Pimentel, Epitácio Pessoa, Sá Pereira, Eduardo Espínola, Espínola Filho, Bento de Faria, Jaime Landim, Jorge Americano, Caio Mário da Silva Pereira, San Tiago Dantas, Gabriel Resende, Filadelfo de Azevedo, Orlando Gomes, Serrano Neves, todos esses doutrinadores foram defensores da teoria da imprevisão, num tempo em que a nota individualista liberal do contrato era a nota dominante.

 

 

Apesar de que o CDC em seu art. 6, V já tinha resolvido entre nós sobre a incidência da chamada teoria da imprevisão e o Código Civil de 2002 resolveu de vez a questão, ao disciplinar a resolução por onerosidade excessiva explicitamente nos seus arts. 478 a 480 do C.C.

 

 

Não se justifica a apreciação subjetiva do desequilíbrio das prestações, porém a ocorrência de fato extraordinário que opere mutação no ambiente objetivo, de forma que o cumprimento do contrato acarrete forçosamente o enriquecimento de uma parte e o ao mesmo tempo o empobrecimento da outra.

 

 

É necessária a apuração de certos requisitos: a vigência de um contrato de execução diferida ou continuada; a radical alteração das condições econômicas objetivas no momento da execução contratual, em confronto com o ambiente objetivo presente na celebração; onerosidade excessiva para um dos contratantes e o benefício exagerado para outro, a imprevisibilidade daquela drástica modificação.

 

 

Nunca haverá lugar à aplicação da referida teoria nos casos em que há onerosidade excessiva provém da álea normal e não de acontecimentos imprevistos, e, ainda nos contratos aleatórios.

terça-feira, 14 de agosto de 2012

Elementos da perspectiva constitucional

 

Uma parte da eternidade, uma das quatro dimensões, corresponde ao tempo que é capaz de mostrar que a mudança é contínua em todo universo, o que erige para o jurista a necessidade de se procurar um valor essencial.

 

Toda norma jurídica é uma tentativa de estabilização das relações sociais em perpétuo devir, toda ordem jurídica corresponde a um desafio ao tempo, um esforço de conservação do estado social que esta estabelece. De sorte, que a importância do princípio para o fenômeno jurídico é representar um vetor de ajuste entre a realidade e literalidade.

 

 

O direito[1] de hoje se fez com o direito de ontem como o de amanhã será oriundo do direito de hoje... O que corrobora com a expressão de Rousseau: “a imagem móvel da imóvel eternidade”.

 

 

Assim não se pode compreender adequadamente o direito contemporâneo sem cotejar o direito anterior, e nem prever o direito futuro, sem extrapolação do direito atual. Compreender- lhes as fontes, o seu teor abstrato das crenças e dos saberes que estão bem impressos nos princípios gerais de direito.

 

 

Captar a alma constitucional é tarefa complexa, posto que se deve observar o corpo integral, orgânico e, ainda os valores filosóficos, morais, históricos, sociais, jurídicos e principalmente econômicos. Temos que entendê-la como lei funcional, fundamental e suprema do país.

 

 

E, nessa tarefa hercúlea, o Direito vem sido envolvido e penetrado pelos muitos valores jurídicos fundamentais dominantes na comunidade. A doutrina contemporânea prevalente reconhece que as atuais constituições são tributárias de certos valores que albergam em seu bojo normativo as diretrizes, comandos e objetivos a serem alcançados por todo sistema normativo e, obviamente também pelos operadores do Direito.

 

 

Nessa sua recente fase do Direito constitucional procura-se desmistificar a neutralidade axiológica da Constituição que vinha sendo apontada pela anterior doutrina, e que sempre foi mais aparente do que real. É certo que os valores habitam o plano axiológico enquanto que os princípios moram no plano deontológico, conforme bem esclareceu Robert Alexy.

 

 

De certa forma, os valores consagrados constitucionalmente significam o reconhecimento de um direito natural de conteúdo democrático. Embora que se pondere como o faz Cabral de Moncada, se os valores não constituem objeto independente do conhecimento histórico das normas jurídicas positivas que lhe fornecem maior concretização e, de por outro lado, que é peculiar ao procedimento democrático de escolha que depende do essencial e respectivo conteúdo.

 

 

Os valores significam outro material positivo e que são obviamente anteriores as normas, apenas sucedendo que estas concretizam o vago conteúdo axiológico em causa, transformando-o em regras deontológicas de conduta.

 

 

Tecnicamente resta evidente que os valores são estranhos a essência normativa, externos a esta, mas que nesta influenciam diretamente. Ademais, lembremos que o Direito apesar de ter conceito interpretativo, não é um fim em si mesmo, e sim uma medida, um instrumento capaz de propiciar um relacionamento social seguro[2].

 

E, como tal deverá refletir as aspirações e valores sociais desejados. E tal carga axiológica se faz particularmente presente no constituinte quando os representantes diretos do povo irão estabelecer as normas fundamentais.

 

 

Portanto, os valores ora representam autênticas normas posto que inseridas no corpo textual da constituição como também servem de diretrizes interpretativas. Posto que tragam certa concepção moral e histórica da realidade.

 

 

As constituições contemporâneas consagram-se em ser um natural receptáculo dos valores dominantes da sociedade. E, são positivados por meio dos princípios constitucionais que uma vez adotados desagua a carga axiológica incorporada pelo ordenamento jurídico.

 

 

A ideia de princípio cunhada pela Teoria Geral do Direito é multifacetada posto que ora designe a formulação dogmática de conceitos estruturados por sobre o direito positivo, e ora designe determinado tipo de norma e, ora estabeleça teóricos postulados e proposições jurídicas concretas ou de institutos de direito ou normas legais vigentes.

 

 

Os princípios gerais podem de início poderão parecer ser resultante da síntese de textos legislativos esparsos, ou extraídos da lei, por indução amplificadora, pois a jurisprudência utiliza a sistematização operada pela doutrina e as ideias mestras que esta discerniu dos textos.

 

 

Jeanneau acautelava que os princípios gerais não têm por si sós, nenhuma existência própria: compete ao juiz[3] dar-lhes força e vida. Assim significam o espírito da lei, fruto das aspirações latentes do corpo social. Daí justificar-se sua intensa generalidade, permanência e a transcendência.

 

Sampaio Dória definiu os princípios do Direito Constitucional como bases orgânicas dos Estados, são aquelas generalidades do direito público, como sendo as naus da civilização que devem sobrenadar às tempestades políticas, e às paixões dos homens.

 

 

Os princípios constitucionais brasileiros são cânones com os quais não existiriam a União, tal qual é em suas características essenciais. Enfim, a Constituição[4] em sua missão de Lei Maior do Estado, possui contorno e determina âmbitos para as demais normas do sistema jurídico, sendo fundamento necessário de sua validade, argumento há muito tempo desenvolvido por Kelsen.

 

 

Conclui-se que os princípios elevados à esfera constitucional angariaram maior importância sobre os demais princípios jurídicos. Servem de pautas ou critérios por excelência para avaliação de todos os conteúdos normativos, recebem positivação em elevado grau e instauram uma instância valorativa máxima, dando hegemonia às normas constitucionais, se convertem, pois em norma normarum, ou seja, norma das normas.

 

 

Os princípios constitucionais também norteiam o legislador ordinário, o judiciário e até mesmo o executivo. Posto que se situem no ápice do sistema jurídico, segundo Rolando E. Pina, em análise à jurisprudência alemã atentamente observou que é contínua a utilização da expressão “princípio jurídico-constitucional” nas decisões da Corte suprema germânica.

 

 

Os princípios essenciais são os summa genera do direito constitucional trazendo fórmulas basilares, postos-chaves, de interpretação e construção teórica do constitucionalismo, e daí, se justifica a enorme atenção doutrina desenvolvida em sua descoberta e elucidação.

 

Os princípios gerais correspondem aos tópicos de Aristóteles, ou às máximas do Digesto, ou ainda, aos primeiros princípios de todas as leis. Em verdade, essa noção permanece obscura e de natureza incerta, como permanece a incerteza de suas fontes.

 

 

Admite-se a colidência entre princípios e tal situação pode ser resolvida por meio da aplicação do princípio da proporcionalidade[5]. Em verdade um valor vigora até determinado ponto a partir do qual recebe o influxo de um valor em sentido contrário.

 

 

E, ressalte-se que não existe hierarquia normativa[6] entre princípios. Apesar de que poderá existir uma distinção axiológica, mas não exatamente uma hierarquia normativa, posto que todas as normas constitucionais se encontrem num mesmo patamar, e não se pode atribuir superioridade apriorística, em relação de outro princípio, por força de algum valor relevante que no primeiro se vislumbre.

 

 

Com lucidez asseverou Eros Grau que um sistema ou ordenamento jurídico jamais será integrado exclusivamente por regras. Pois neste há princípios jurídicos ou princípios de Direito. É fato, portanto que os princípios de Direito, pois sempre esteve presente nos ordenamentos jurídicos.

 

 

A juridicidade dos princípios aponta para três fases distintas ao longo da evolução histórica: a jusnaturalista, a positivista e a póspositivista.

 

 

Na primeira fase, os princípios eram como axiomas, verdades universais, estabelecidos pela razão, Cabral de Moncada aponta que são premissas de onde se retiram as soluções mais adequadas, algo ao jeito dos édoxas aristotélicos ou regras indiscutidas por serem de aceitação geral a partir das quais se desenvolvem propostas dialéticas[7].

 

 

Dentro da acepção formalista, os princípios gerais do Direito assumem seu caráter positivo, sendo consagrados pelos códigos, mas apenas na exata medida da necessidade de colmatarem eventuais lacunas. Nessa fase, eram os princípios apenas considerados fontes secundárias do Direito, não estavam acima das leis, mas ao lado, quando necessário fosse.

 

 

Espíndola aponta dois sentidos diversos de princípios jurídicos, primeiro como princípios positivos do Direito e, no segundo, como princípios gerais de Direito. Tal divisão alude àquela fase em que em que os princípios gerais do Direito eram considerados decorrentes da ideia de Direito como externos ao Direito positivo, servindo apenas aos casos em que o Direito positivo, especialmente representado pela lei, não fosse capaz de fornecer solução específica, nos casos de lacuna da lei.

 

 

Na fase póspositivista teve a presença das novas constituições promulgadas acentuam a hegemonia axiológica dos princípios, convertidos em pedestal normativo sobre o qual assenta todo o edifício jurídico dos novos sistemas constitucionais.

 

De fato, a doutrina italiana já firmou entendimento sobre a força normativa dos princípios, e Bobbio ainda mais ressalta o caráter de normas fundamentais ou generalíssimas do sistema. Em verdade é velha a questão entre os doutrinadores, sobre saber se os princípios são normas. Para Bobbio definitivamente são normas tanto como todas as demais.

 

De qualquer forma, a expressão é evitada nos Códigos. Mas Bobbio lembrou de que a expressão “princípios gerais do Direito” foi usada pelo legislador de 1865, mas pelos equívocos que poderia suscitar, quando se deveria entender por Direito, posto havia a dúvida se referia ao direito natural ou ao direito positivo.

 

 

A Constituição Espanhola conforme alude Peces-Barba que o motivo pelo qual se preferiu o uso da expressão “valores superiores” e se deu para superar a antítese jusnaturalismo versus juspositivismo que é permanentemente latente na cultura jurídica contemporânea.

 

 

Contudo, o Brasil tomou caminho contrário, basta que observemos a Lei de Introdução ao Código Civil, o projeto primitivo de Beviláqua, o projeto de Coelho Rodrigues, que cogitava somente em princípios que se deduzem do espírito da lei. E, foi indicação de Lacerda de Almeida, membro da Comissão Revisora e sustentáculo da boa doutrina do Direito Natural (...) que enfim adotou a expressão “princípios gerais do direito”.

 

Segundo Bergel são regras de direito objetivo e não de direito natural ou ideal, expressas ou não nos textos, mas aplicadas pela jurisprudência e dotadas de um caráter suficiente de generalidade. Porém não são necessariamente enunciados por regras de direito positivo, são menos rígidos e menos precisos do que as prescrições textuais formais.

 

 

Podem ser formulados ou não pelo juiz, comportam uma autoridade, um rigor e uma aplicabilidade que, sem isso, a vontade do legislador, que estes exprimem e concretizam. Porém, nem todas as regras que a jurisprudência aplica sem texto, nem todas correspondem aos princípios gerais de direito.

 

 

A preconizada fusão da maioria dos princípios gerais de Direito pela concepção jusnaturalista ou positivista conforme nas constituições atuais possui reconhecida força normativa, fez essa categoria sofrer aquela transformação mencionada, que os trouxe à fase póspositivista.

 

 

Celso Ribeiro Bastos professa que os princípios gerais de Direito encontram-se na Constituição, bem como servem de fundamento às demais áreas de nosso ordenamento jurídico. Portanto, estão presentes os princípios, como derradeira justificativa de legitimidade.

 

 

Num retrocesso histórico, no direito pátrio já existiam os princípios gerais de direito que já foram elevados ao status constitucional na Carta Política de 1934, em seu art. 113, n. 37 que in verbis: “Nenhum juiz deixará de sentenciar por motivo de omissão da lei. Em tal caso deverá decidir por analogia, pelos princípios gerais de direito ou por equidade.” Era então, uma concepção predominante à época, que atribuía a estes um caráter meramente subsidiário na superação das lacunas da lei.

 

Os preâmbulos das Constituições francesas de 1946 e 1958 fazem referência aos princípios fundamentais. Os princípios gerais são muito heterogêneos quanto à forma e ao conteúdo. Alguns assumem forma de máximas, em geral de locuções latinas. Quanto ao conteúdo, certos princípios gerais parecem extraídos da moral, da equidade, ou do direito natural, assim o princípio da boa-fé[8], o brocardo fraus omnia corrumpit são, clara evidência de inspiração ética-moral.

 

Sobre esta subsidiariedade que fora assumida pelos princípios gerais de Direito, basta atentar para o teor do art. 4º da Lei de Introdução ao Código Civil. Contudo, há outro significado possível para a expressão “princípios gerais do Direito” correspondente aos princípios constitucionais gerais e meros princípios constitucionais.

 

A doutrina tem procurado distinguir, dentre os próprios princípios, alguns, que são expansivos e mais relevantes para o Direito considerado como um todo, e de outros mais específicos de determinados setores. Com esse objetivo, é comum cogitar-se em princípios fundamentais, princípios políticos fundamentais, princípios da Administração Pública, e outros tantos.

 

 

Enfim, os princípios constitucionais funcionam como cimento da sistemática jurídica[9], e traduzem uma unidade congruente de normas. Todas as leis, decretos e atos normativos de qualquer índole devem obediência e respeito aos mais altos cânones normativos, ou seja, aos princípios normativos. É assim que ocorre com todos os denominados ramos do Direito, seja o Direito Penal, o Civil, o Trabalhista, o Tributário, Processual ou qualquer outro.

 

 

Os princípios gerais, em sentido lato, constituem o arcabouço do pensamento jurídico e desempenham importante papel na interpretação da lei. Assim os princípios gerais poderão ser diretores ou corretores. Serão diretores posto que a ordem social dependa deles, é assim o princípio que informa que se supõe que ninguém ignora a lei, o da autoridade da coisa julgada, o princípio da igualdade perante a lei e perante os encargos públicos, as liberdades fundamentais, o princípio da não-retroatividade, o princípio de legalidade dos delitos e das penas. Já os princípios corretores de soluções legais são como o princípio de boa-fé são princípios incontestavelmente dessa natureza.

 

Existem muitos princípios que são alternadamente princípios diretores ou corretores conforme as situações em que são invocados e os outros princípios com que são confrontados. É também um princípio corretor o da autonomia da vontade. No direito francês há hierarquia dos princípios, na cumeeira os princípios fundamentais constantes na Constituição e nos textos com valor constitucional. E, os princípios e regras com valor constitucional são aqueles no preâmbulo da constituição e nos tratados e acordos internacionais.

 

Os princípios gerais simples constam das leis e textos legislativos infraconstitucionais (tais como leis ordinárias, decretos, leis complementares, e etc).

 

Nessas searas jurídicas é onde os princípios estão albergados infraconstitucionais, ou seja, são configurados em específicos setores do Direito, que os restringe sua aplicação. No caso brasileiro que é paradigmático no que se refere à ampla constitucionalização promovida, é possível afiançar que os principais princípios encontram-se realmente já plasmados na Constituição, apesar de serem reiterados pelas normas infraconstitucionais. E, nesse caso, prevalece a força normativa constitucional.

 

Ronald Dworkin[10] trata da diferença entre princípios e regras apontando para intensa abstratividade daqueles em face destas. Destaca que os princípios possuem a dimensão que as regras não possuem. O melhor traço distintivo entre regras e princípios reside exatamente no maior grau de abstração destes, posto que não se reportem a nenhuma descrição de situação fática (hipotética) em particular, adquirindo assim o grau máximo de abstração (objetividade).

 

No âmbito do superconceito de norma de Canotilho torna-se difícil a distinção. E, aponta o doutrinador lusitano para alguns critérios, entre eles o grua de abstração, de determinabilidade, proximidade da ideia de direito e, principalmente, o caráter de fundamentabilidade que representam os princípios para as fontes de direito.

 

Aduz Canotilho que os princípios são normas de natureza e com o papel fundamental no ordenamento jurídico devido à sua posição hierárquica no sistema das fontes, ou à sua importância estruturante dentro do sistema jurídico (como por exemplo, o princípio do Estado de Direito).

 

Assim, considerados como exigências de otimização permitem o balanceamento de valores e interesses, consoante o seu peso e ponderação de outros princípios eventualmente aplicáveis e conflitantes. As regras não deixam espaço para qualquer outra solução, posto que se existir uma regra validade esta deve ser cumprida em sua exata medida de suas prescrições.

 

Cabral de Moncada não viceja tal distinção qual igual nitidez, pois que calcada em meros critérios estruturais. Portanto, os princípios e regras apenas se distinguem quantitativamente, e, além do mais, a distinção dependeria sempre um elemento aleatório, a vontade do legislador pois que este pode até certo ponto manipular o alcance linguístico dos enunciados legislativos sem perda de conteúdo, apresentando-os de uma ou de outra forma.

 

A nota principiológica dos direitos fundamentais[11] impõe uma força normativa e, por consequência, uma norma, mas, em virtude de seu valor, como fundamental por óbvio, assume condição de princípios, tidos como posições jurídico-subjetivas, isto é, normas definidoras de direitos e garantias[12], mas também de deveres fundamentais.

 

 

Desta forma, o reconhecimento de direitos humanos não deva mais operar apenas verticalmente, ou seja, na relação existente entre liberdade-autoridade, entre o particular- Estado. E, contemporaneamente há a grande ênfase na eficácia horizontal dos direitos humanos (e direitos fundamentais).

 

 

O enorme busilis do Direito contemporâneo é não prover previsão normativa para todas as demandas sociais, mas sim oferecer uma das diversas soluções encontráveis no sistema, particularmente nas constituições, como a mais adequada, o que envolve problemas de racionalização dos princípios existentes e justificação da escolha feita. Lembremos que apesar de nossa modernidade tardia, a Constituição garante o acesso à justiça e o direito à duração razoável do processo impõe uma hermenêutica célere, eficaz e justa.

 

 

Referências

ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Tradução Ernesto Garzon Valdés. Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 1997.

BERGEL, Jean-Louis. Teoria Geral do Direito. Tradução de Maria Ermantina Galvão. São Paulo: Editora Martins Fortes, 2001.

CANOTILHO, J.J. Gomes. Direito constitucional 6. Ed . Coimbra: Almedina, 2009.

DÓRIA, A. de Sampaio. Princípios constitucionais. São Paulo: Editora São Paulo, 1926.

DWORKIN, Ronald. Taking rights seriously - Levando os Direitos a Sério. Cambridge: Harvard, 1997. Tradução livre das autoras.

GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na Constituição de 1988. 3. Ed. São Paulo: Editora Malheiros, 1997.

TAVARES, André Ramos. Elementos para uma teoria geral dos princípios na perspectiva constitucional. In Dos Princípios Constitucionais – Considerações em torno das normas principiológicas da Constituição – George Salomão Leite (coordenação) 2. ed. ver. atual. e ampl. São Paulo: Editora Método, 2008;

JEANNEAU, B. La nature des príncipes généraux du droit français. Travaux et recherches de l’l Institut de droit compare de L’université de Paris, t. XXIII, 1962. Tradução livre das autoras.

DESCAMPS, Christian. As ideias filosóficas contemporâneas na França. Rio de Janeiro: Editora Zahar, 1991.

BOBBIO, Norberto. A teoria da norma jurídica. Tradução de Fernando Pavan Batista. Apresentação de Alaôr Caffé Alves 2. Ed. São Paulo: EDIPRO, 2003.

MONCADA, Luís S. Cabral de. Estudos de direito público. Coimbra: Editora Coimbra, 2001.

SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001.


[1] A palavra "direito" é usada, na acepção comum, para designar o conjunto de regras com que se disciplina a vida em sociedade, regras essas que se caracterizam pelo caráter genérico, concernente à indistinta aplicação a todos os indivíduos, e jurídico, que as diferencia das demais regras de comportamento social e lhes confere eficácia garantida pelo Estado. As referidas normas de conduta encontram-se nas leis, nos costumes, na jurisprudência, nos princípios gerais do direito, constituindo o direito objetivo e positivo, posto uma sociedade por uma vontade superior. (In GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil 1, Parte Geral, 8.ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2010, p.20 apud AMARAL, Francisco. Direito Civil: introdução, p.2 ).

[2] “A complexidade e o dinamismo das relações sociais determinaram a criação, no país, de verdadeiros microssistemas jurídicos, decorrentes da edição de leis especiais de elevado alcance social e alargada abrangência como a Lei 11.441/2007, o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei n. 8.069/90), a Lei dos Registros Públicos Lei n.6.015173), a Lei 12.210/2009 e outras, que fixam verdadeiro, arcabouço normativo para setores. inteiros retirados do Código Civil, provocando insinuações no sentido de que o Código Civil não estaria mais no centro do sistema legal, passando a desempenhar, muitas vezes, um papel subsidiário, como no caso d0 Código de Defesa do Consumidor (Leinc8.078/90) da Lei do Inquilinato (Lei 8.245/91), por exemplo.” (In GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil 1, Parte Geral, São Paulo: Editora Saraiva, 2011 , p.36)

[3] O juiz, no sentido genérico designa in casu, todos os órgãos que exercem a função judiciária.

[4] A Constituição é o espaço garantidor das relações democráticas entre o Estado e a Sociedade (Ribas Vieira). (...).

[5] O texto constitucional brasileiro não prevê expressamente sobre o princípio da proporcionalidade, como o faz a Constituição portuguesa em seu art. 18º. Porém isso não impede seu reconhecimento posto que seja imposição natural de qualquer sistema constitucional que consagra as garantias fundamentais. É elemento intrínseco e essencial do documento jurídico que instaura Estado de direito democrático, posto que se preocupe com a preservação dos direitos fundamentais.

[6] Embora o direito francês entenda diferente.

[7] Os raciocínios dialéticos repousam num conjunto de meios empregados na discussão com o fito de mostrar, refutar e trazer a convicção. Aplicam-se não às demonstrações científicas, mas às deliberações de controvérsias. Não excluem o silogismo.

[8] A socialização dos direitos trazida pela teoria do abuso dos direitos que previu que em quase todos os direitos é possível ocorrer o abuso, como por exemplo, o direito de propriedade, no contrato, no direito de greve. Portanto, não basta, para escapar de sua tipificação, entrincheirar-se por trás do fato de que é o titular de um direito, é indispensável não abusar desse direito. Posto que o abusador deva reparar prejuízo que causa a outrem. Concluímos que os direitos do indivíduo não são, portanto, absolutos e devem ser levados em conta o interesse social ao lado do interesse próprio.

[9] Em interessante entrevista ao CONJUR, Lênio Luiz Streck responde: Os princípios estão substituindo as leis? A era dos princípios não veio para transformar o Direito em um império de decisões baseadas na consciência individual de cada julgador. Princípios têm a função de resgatar o mundo prático no Direito. Por outro lado, decisionismos e/ou ativismos não são bons para a democracia. Se cada um decide como quer, os tribunais — mormente o STJ e o STF — acabam entulhados de processos. No fundo, a repercussão geral e as súmulas são uma resposta darwiniana a uma espécie de estado de natureza hermenêutico que criamos. Veja só: se fundamentarmos cada decisão até o limite, teremos uma maior accountabillity [prestação de contas em cada decisão]. Mais: se anulássemos decisões mal fundamentadas, não teríamos essa proliferação de embargos declaratórios. Sugiro, portanto, que cumpramos o artigo 93, inciso IX, da Constituição Federal [estabelece que os julgamentos têm que ser públicos e as decisões, fundamentadas] que, antes de ser um direito, é um dever fundamental do juiz.

(Disponível em http://leniostreck.com.br/index.php?option=com_content&task=view&id=87&Itemid=2).

[10] Ronald Dworkin tem razão quando afirmou que a interpretação do juiz deve ser constrangida pelo princípio da coerência normativa face à história do seu direito e da sua cultura jurídica. Entenda-se bem esse constrangido: Dworkin fala em have a duty.

[11] A Súmula Vinculante 11 do STF indicou que as algemas são excepcionais e, ainda quando necessárias, o seu uso deve preservar os direitos fundamentais. Preconizou prudência no uso das algemas e retirou a arbitrariedade lesiva por parte do algemador.

[12] O garantismo é visto como maneira de fazer democracia dentro do Direito e a partir do Direito, é um tipo ideal. Porém em fase aguda de crise do positivismo, o garantismo prega ente outros significados, que a Constituição em sua totalidade deve ser paradigma hermenêutico de definição do que seja um texto normativo válido ou inválido.

http://br.mc1613.mail.yahoo.com/mc/welcome?.gx=1&.tm=1344950075&.rand=6dgt33olmtvem

domingo, 12 de agosto de 2012

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Educação como o segundo direito fundamental

Procura-se destacar a educação como um princípio fundamental principalmente em face da farta positivação dos direitos fundamentais tão presente nas Constituições contemporâneas e que representa evidente contribuição da modernidade.

Igualmente corresponde a consciência de que todos os humanos são sujeitos de direitos e, portanto, são credores de condições mínimas de existência capazes de assegurar sua dignidade, o que nos remete ao estatuto do patrimônio mínimo de Luiz Edson Fachin.

Luiz Edson Fachin[1] criou a teoria do estatuto jurídico do patrimônio mínimo, que procura garantir um mínimo de patrimônio com base no ordenamento jurídico, ou seja, deve o indivíduo ter o mínimo existencial como forma de garantir-lhe a sua dignidade.

Esta teoria não tem o interesse de atacar a propriedade privada nem o direito creditício, mas afasta o caráter patrimonial das relações jurídicas privadas. O intuito é remodelar estes institutos e adequá-las às novas premissas do Direito Civil, (particularmente ao Direito Civil Constitucionalizado) determinando que os mesmos não se sobreponham à dignidade do indivíduo. Na dicção sábia de Fachin:

“Em certa medida, a elevação protetiva conferida pela Constituição à propriedade privada pode, também, comportar tutela do patrimônio mínimo, vale dizer, sendo regra de base desse sistema a garantia ao direito de propriedade não é incoerente, pois, que nele se garanta um mínimo patrimonial. Sob o estatuto da propriedade agasalha-se, também, a defesa dos bens indispensáveis à subsistência. Sendo a opção eleita assegurá-lo, a congruência sistemática não permite abolir os meios que, na titularidade, podem garantir a subsistência (pág. 232).” In FACHIN, Luiz Édson. Estatuto Jurídico do Patrimônio Mínimo. Rio de Janeiro: Renovar, 2001.

Enfatizamos que o homem como ser social constrói a sua interação com o mundo e sua identidade por meio de processo educativo, e ao longo do tempo, se realiza em ambiente estruturado e formal representado pela escola, universidade e, etc.

De fato, a educação como direito constitucionalmente reconhecido tem sido tema recorrente em diversos eventos acadêmicos e mesmo nos debates sobre as políticas públicas.

O primado da educação é antigo princípio já presente nas clássicas fontes da pedagogia. É, sem dúvida, um primado antropológico, psicossocial, político e jurídico (além de econômico). É inerente à essência humana a necessidade de aprender, e ipso facto, da educação.

Para o ingresso do mundo adulto e para garantir a sobrevivência é indispensável à apropriação de conhecimentos socialmente produzidos. E, em seus primórdios começam nas experiências vividas no seio da família e do grupo social em que se insere, e, depois, pela socialização secundária, se processa então nas instituições tais como escolas, clubes, universidades e cursos.

Na socialização secundária é de se reconhecer que a educação possua papel estratégico[2], principalmente para a construção da identidade individual e da cidadania. Se nas sociedades primitivas o procedimento educativo se concentrava nas tradições e costumes, na sociedade moderna concentra-se em duplo aspecto: o formal-instrumental (ler, escrever, contar) e o concreto (conteúdo de conhecimento) e, finalmente, na aprendizagem de ofício.

Desta forma, se vislumbra que a educação é um direito inalienável do ser humano, e a liberdade, a democracia bem como o desenvolvimento humano dependem diretamente desse direito. Reafirma-se que a educação é um dos direitos dos homens, que são fundamentais e universais, pois exprimem as aspirações inerentes à dignidade de todo ser humano.

A educação é um direito completo posto que seja objeto de várias pretensões de direito: dos pais, dos governos, das religiões e dos educandos. A educação se apresenta não apenas como interesse individual, mas, sobretudo como direito coletivo pertencente à sociedade.

Em sua obra “Educação como prática de liberdade”, Paulo Freire coerentemente explica que a educação representa a capacidade de “ser gente”. Assim garantindo ao indivíduo, ao cidadão e a sociedade ser construtora da realidade, ser autor de sua própria história e identidade.

O direito à educação e o direito de aprender são direitos de todos, e particularmente das crianças e adolescentes. Mas não se refere a uma educação qualquer ou meramente burocrática. É direito que deve ser atendido sem quaisquer tipos de discriminações, independentemente de origem geográfica, étnica, racial, social ou até mesmo de orientação sexual.

Nesse sentido é curial apontar a Lei 11.199, de 12 de julho de 2002, que prevê em seu artigo oitavo, in litteris:

“Artigo 8º - É proibido impedir o ingresso, a matrícula ou a inscrição de portador do vírus HIV ou pessoa com AIDS em creches, escolas, centro esportivos ou culturais, programas, cursos e demais equipamentos de uso coletivo, em razão desta condição.”

Confirme-se a educação como direito de brancos, negros, mestiços, indígenas, pobres, ricos, imigrantes, refugiados, dos presos, dos sem terra e de todas as minorias. Apesar disso, segundo pesquisas do Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira), os afrodescendentes constituem a maior parte dos analfabetos do Brasil e das crianças com baixo rendimento escolar.

E, segundo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), a taxa média de analfabetos no Brasil é de 13,8% segundo o Censo Demográfico de 2000. Os afrodescendentes constituem a maior parte dos analfabetos do país e das crianças com baixo desenvolvimento escolar.

Assim como todos os direitos do homem, o direito à educação impõe três níveis de obrigações: a de respeitá-lo, protegê-lo e realiza-lo (facilitá-lo o seu exercício e o de assegurá-lo) conforme a Declaração de Quito, de 24 de julgo de 1998 que trata da exigibilidade e a realização dos Direitos econômicos, Sociais e Culturais.

Desta forma, a educação significa um bem coletivo que deve ser acesso a todos e realizar a qualidade de ensino e a equidade social. E, para tanto o direito à educação deve cumprir os princípios da universalidade, progressividade, independência e a escola representa parte integrante do sistema de garantia de direitos, é considerado lugar privilegiado para assegurar a cada um, em particular, à criança e ao adolescente, o direito a aprender...

Enfim, a educação deve constituir-se como prática de liberdade. Ao contrário daquela que é pura prática de dominação, e implica na negação do homem abstrato, isolado, solto e desconexo do mundo. Assim, como na negação do mundo enquanto realidade ausente nos homens. (In FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido, 1975, p. 81).

O maior fundamento da pedagogia é o diálogo, que é principal meio de educação exercido como prática de liberdade. A essencialidade do diálogo endossa o papel do educador configurado como libertador. Assim o educador é comprometido com o pensamento crítico que só se materializa quando há humildade, e comprometimento de aprender a aprender, e, sobretudo a função de capacitar o educando.

A educação em sua missão emancipadora visa à construção diária e contínua da autonomia do educando, tornando sujeito e não objeto. Portanto, é inegável que a educação é inalienável direito sendo credencial imprescindível para o desenvolvimento humano e social.

Na história o direito à educação surge propriamente no final do século XIX e no início do século XX na Europa. Mas, no Brasil o ensino fundamental é tido como direito reconhecido desde 1934, sendo manifestamente um direito público subjetivo, a partir de 1988.

Importantes contribuições ao direito à educação foram dadas por diversos diplomas legais, a saber: Decreto Universal dos Direitos Humanos – 10 de dezembro de 1948, art. 26, Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem – Bogotá, Resolução XXX, Ata final, abril de 1948; Declaração Universal dos Direitos da Criança de 20 de novembro de 1959; Pacto Internacional de Direitos econômicos, sociais e culturais – 16 de dezembro de 1966 e ratificado pelo Brasil em 24 de janeiro de 1992; Convenção Americana sobre os Direitos Humanos de 22 de novembro de 1969, e ratificada pelo Brasil em 25 de setembro de 1992 (Pacto de San José da - Costa Rica); Convenção sobre os Direitos da criança e do adolescente , 20 de setembro de 1990; Constituição Federal Brasileira de 1988; Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei 8.069, de 13 de julho de 1990; LDB – Lei de Diretrizes e Bases da Educação, Lei 9.394, de 20 de dezembro de 1996.

Manifestamente reconhecida como direito fundamental, a educação conta ainda com o registro em outros documentos tais como a Declaração Mundial sobre a Educação para Todos e o Plano de Ação para a Década das Nações Unidas para a Educação no Domínio dos Direitos do Homem (1995-2004).

Ao direito à educação corresponde especificamente ao dever de educar, e pelo atual Estado brasileiro, é um dever do Estado, um dever da sociedade e de cada indivíduo, o que permite a pertinente intervenção do Estado na garantia deste direito individual através de medidas judiciais.

Espera-se que seu cumprimento ocorra voluntariamente, mas isso não exime o Estado de prover as medidas necessárias para efetivo cumprimento, assim o art. 4º da LDB[3] estatui o dever do Estado e o princípio garantista.

Desta forma é possível a atuação do Ministério Público para acionar o Poder Público e garantir o acesso ao ensino. O art. 58 da LDB ainda conceitua e cogita da educação especial, como modalidade de educação escolar, oferecida preferencialmente na rede regular de ensino aos portadores de necessidades especiais, visando sua concreta integração á vida social, e acesso igualitário aos benefícios e aos programas sociais suplementares disponíveis para o respectivo ensino.

E, ainda há a preocupação em se combater o analfabetismo funcional posto que abranja além da leitura, escrita e do cálculo e considera as competências funcionais tais como expressão oral, informática, resolução de problemas e habilidades interpessoais aplicadas a diferentes contextos como a economia doméstica, saúde, trabalho, recursos comunitários, leis e o governo.

A ampla disseminação do termo analfabetismo funcional em âmbito

mundial deveu-se basicamente à ação da Unesco, que adotou o termo

na definição de alfabetização que propôs, em 1978, visando padronizar

as estatísticas educacionais e influenciar as políticas educativas

dos países-membros.

A definição de alfabetização que a Unesco propusera em 1958 fazia referência à capacidade de ler compreensivamente ou escrever um enunciado curto e simples relacionado à sua vida diária. (In RIBEIRO, Vera Magalhães. Alfabetismo funcional: Referências conceituais e metodológicas para a pesquisa. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/es/v18n60/v18n60a8.pdf Acesso em 11/08/2012.).

Lembremos que além do aceso, a permanência também é um direito dos educandos e os números das pesquisas no Brasil acenam com melhorias. Pois já demonstram que 95,4% das crianças de 7 a 14 anos estão matriculadas na escola, mas há ainda 1,8 milhão de crianças que permanecem fora da escola.

Apenas 59% das crianças que iniciaram o ensino fundamental (de 1ª. a 8ª. serie) completam os oito anos de estuo e apenas 27,3% dos adolescentes de 14 anos cursam a série que corresponde à sua idade. (Dados disponíveis no http:// www.unicef.org/brazil).

Mais que a garantia jurídica à educação, requeremos consciência para implementar rotinas de reconhecimento dos direitos humanos, direitos fundamentais, conferindo maior reconhecimento profissional e salarial aos professores, equipando melhor nossas escolas e universidades e reconstruindo assim as práticas sociais capazes de construir uma sociedade mais solidária, mais justa e humanitária.

A educação como segundo direito fundamental que é, e tão requerida pela sociedade contemporânea, não precisa de cidadãos passivos e indiferentes, porém daqueles que sejam capazes de redigir a própria história e participar do debate construtivo da democracia.

Negar o direito à educação é, em suma, negar o direito à cidadania e o direito à vida digna. Frisando-se que a dignidade da pessoa humana está na categoria de fundamento da república brasileira. Honremos esse fundamento e lutemos pela concreta realização do direito à educação em todos os níveis.

Referências

RIBEIRO, Vera Magalhães. Alfabetismo funcional: Referências conceituais e metodológicas para a pesquisa. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/es/v18n60/v18n60a8.pdf Acesso em 11/08/2012.

BARUFFI, Helder. A Educação como Direito Fundamental: Um princípio a ser realizado. In: Direitos Fundamentais e cidadania. Zulmar Fachin (coordenador). Acelino de Rodrigues Carvalho [et al.] São Paulo: Editora Método, 2008.

FREIRE, Paulo. Educação como prática de liberdade. 26. Ed. Rio de Janeiro: Editora Paz e Terra, 1977.

______________. Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro: Editora Paz e Terra, 1975.

UNICEF – http://www.unicef.org/brazil Acesso 11 de agosto de 2012.

FACHIN, Luiz Édson. Estatuto Jurídico do Patrimônio Mínimo. Rio de Janeiro: Renovar, 2001.


[1] A partir da leitura que, em meio ao contexto de despatrimonialização ou repersonalização do Direito Civil, Fachin criou a teoria do estatuto jurídico do patrimônio mínimo, segundo a qual o indivíduo deve ter sempre resguardado um direito ao patrimônio mínimo como meio de se promover a sua dignidade. Indubitavelmente, a teoria acima aludida é de extrema relevância para o Direito Civil, sendo responsável por uma remodelagem do estudo dos bens jurídicos nesta seara do Direito.

[2] Nesse sentido o brincar é considerado educativo, pois propicia a interação com diversos ambientes. Por essa razão é muito importante à educação infantil e fundamental o papel do professor.

[3] Art. 4º O dever do Estado com a educação escolar pública será efetivado mediante a garantia de: (...).

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sábado, 11 de agosto de 2012

Estudar Direito

 

Estudar Direito

Elementos da perspectiva constitucional

Uma parte da eternidade, uma das quatro dimensões, o tempo é capaz de mostrar que a mudança é contínua em todo universo, o que erige para o jurista a necessidade de se procurar um valor essencial.

Toda norma jurídica é uma tentativa de estabilização das relações sociais em perpétuo devir, toda ordem jurídica corresponde a um desafio ao tempo, um esforço de conservação do estado social que esta estabelece. De sorte, que a importância do princípio para o fenômeno jurídica é representar um vetor de ajuste entre a realidade e literalidade.

O direito de hoje se fez com o direito de ontem como ode amanhã será oriundo do direito de hoje... O que corrobora com a expressão de Rousseau: “a imagem móvel da imóvel eternidade”.

Assim não se pode compreender adequadamente o direito contemporâneo sem cotejar o direito anterior, e nem prever o direito futuro sem extrapolação do direito atual. Compreender- lhes as fontes, o seu teor abstrato das crenças e dos saberes que estão bem impressos nos princípios gerais de direito.

Captar a alma constitucional é tarefa complexa, posto que se tem que observar o corpo integral, orgânico e ainda os valores filosóficos, morais, históricos, sociais, jurídicos e principalmente econômicos. Temos que entendê-la como lei funcional, fundamental e suprema do país.

E, nessa tarefa hercúlea o Direito vem sido envolvido e penetrado pelos muitos valores jurídicos fundamentais dominantes na comunidade. A doutrina contemporânea prevalente reconhece que as atuais constituições são tributárias de certos valores que albergam em seu bojo normativo as diretrizes, comandos e objetivos a serem alcançados por todo sistema normativo e também pelos operadores do Direito.

Nessa sua recente fase do Direito constitucional procura-se desmistificar a neutralidade axiológica da Constituição que vinha sendo apontada pela anterior doutrina, e que sempre foi mais aparente do que real. É certo que os valores habitam o plano axiológico enquanto que os princípios moram no plano deontológico, conforme bem esclareceu Robert Alexy.

De certa forma, os valores consagrados constitucionalmente significa o reconhecimento de um direito natural de conteúdo democrático. Embora que se pondere como o faz Cabral de Moncada se os valores não constituem objeto independente do conhecimento histórico das normas jurídicas positivas que lhe fornecem maior concretização e, de por outro lado, que é peculiar ao procedimento democrático de escolha que depende do essencial e respectivo conteúdo.

Os valores significam outro material positivo e que são obviamente anteriores as normas, apenas sucedendo que estas concretizam o vago conteúdo axiológico em causa, transformando-o em regras deontológicas de conduta.

Tecnicamente resta evidente que os valores são estranhos a essência normativa, externos a esta, mas que nesta influenciam diretamente. Ademais, lembremos que o Direito apesar de ter conceito interpretativo, não é um fim em si mesmo, e sim uma medida, um instrumento capaz de propiciar um relacionamento social seguro.

E, como tal deverá refletir as aspirações e valores sociais desejados. E tal carga axiológica se faz particularmente presente no constituinte quando os representantes diretos do povo irão marcar as normas fundamentais.

Portanto, os valores ora representam autênticas normas posto que inseridas no corpo textual da constituição como também servem de diretrizes interpretativas. Posto que tragam certa concepção moral e histórica da realidade.

As constituições contemporâneas consagram-se em ser um natural receptáculo dos valores dominantes da sociedade. E, são positivados por meio dos princípios constitucionais que uma vez adotados desagua a carga axiológica incorporada pelo ordenamento jurídico.

A ideia de princípio cunhada pela Teoria Geral do Direito é multifacetada posto que ora designe a formulação dogmática de conceitos estruturados por sobre o direito positivo, e ora designe determinado tipo de norma e ora estabeleça teóricos postulados e proposições jurídicas concretas ou de institutos de direito ou normas legais vigentes.

Os princípios gerais podem de início parecer ser resultante da síntese de textos legislativos esparsos, ou extraídos da lei, por indução amplificadora, pois a jurisprudência utiliza a sistematização operada pela doutrina e as ideias mestras que esta discerniu dos textos.

Jeanneau acautelava que os princípios gerais não têm por si sós nenhuma existência própria: compete ao juiz[1] dar-lhes força e vida. Assim significam o espírito da lei, fruto das aspirações latentes do corpo social. Daí justificar-se sua intensa generalidade, permanência e a transcendência.

Sampaio Dória definiu os princípios do Direito Constitucional como bases orgânicas dos Estados, são aquelas generalidades do direito público, como sendo as naus da civilização que devem sobrenadar às tempestades políticas, e às paixões dos homens.

Os princípios constitucionais brasileiros são cânones com os quais não existiriam a União, tal qual é em suas características essenciais. Enfim, a Constituição em sua missão de Lei Maior do Estado, possui contorno e determina âmbitos para as demais normas do sistema jurídico, sendo fundamento necessário de sua validade, argumento há muito tempo desenvolvido por Kelsen.

Conclui-se que os princípios elevados à esfera constitucional angariaram maior importância sobre os demais princípios jurídicos. Servem de pautas ou critérios por excelência para avaliação de todos os conteúdos normativos, recebem positivação em elevado grau e instauram uma instância valorativa máxima, dando hegemonia às normas constitucionais, se convertem, pois em norma normarum, ou seja, norma das normas.

Os princípios constitucionais também norteiam o legislador ordinário, o Judiciário e até mesmo o Executivo. Posto que se situem no ápice do sistema jurídico, segundo Rolando E. Pina, em análise à jurisprudência alemã atentamente observou que é contínua a utilização da expressão “princípio jurídico-constitucional” nas decisões da Corte suprema germânica.

Os princípios essenciais são os summa genera do direito constitucional trazendo fórmulas basilares, postos-chaves, de interpretação e construção teórica do constitucionalismo, e daí, se justifica a enorme atenção doutrina desenvolvida em sua descoberta e elucidação.

Os princípios gerais correspondem aos tópicos de Aristóteles, ou às máximas do Digesto, ou ainda, aos primeiros princípios de todas as leis. Em verdade, essa noção permanece obscura e sua natureza incerta, como permanece a incerteza de suas fontes.

Admite-se a colidência entre princípios e tal situação pode ser resolvida por meio da aplicação do princípio da proporcionalidade[2]. Em verdade um valor vigora até determinado ponto a partir do qual recebe o influxo de um valor em sentido contrário.

E, ressalte-se que não existe hierarquia normativa[3] entre princípios. Apesar de que poderá existir uma distinção axiológica, mas não exatamente uma hierarquia normativa, posto que todas as normas constitucionais se encontrem num mesmo patamar, e não se pode atribuir superioridade apriorística, em relação de outro princípio, por força de algum valor relevante que no primeiro se vislumbre.

Com lucidez asseverou Eros Grau que um sistema ou ordenamento jurídico jamais será integrado exclusivamente por regras. Pois neste há princípios jurídicos ou princípios de Direito. É fato, portanto que os princípios de Direito, pois sempre esteve presente nos ordenamentos jurídicos.

A juridicidade dos princípios aponta para três fases distintas ao longo da evolução histórica: a jusnaturalista, a positivista e a póspositivista.

Na primeira fase, os princípios eram como axiomas, verdades universais, estabelecidos pela razão, Cabral de Moncada aponta que os princípios são premissas de onde se retiram as soluções mais adequadas, algo ao jeito dos édoxas aristotélicos ou regras indiscutidas por serem de aceitação geral a partir das quais se desenvolvem propostas dialéticas[4].

Dentro da acepção formalista, os princípios gerais do Direito assumem seu caráter positivo, sendo consagrados pelos códigos, mas apenas na exata medida da necessidade de colmatarem eventuais lacunas. Nessa fase, eram considerados fontes secundárias do Direito, não estavam acima das leis, mas ao lado, quando necessário fosse.

Espíndola aponta dois sentidos diversos de princípios jurídicos, primeiro como princípios positivos do Direito e, na segundo como princípios gerais de Direito. Tal divisão alude àquela fase em que em que os princípios gerais do Direito eram considerados decorrentes da ideia de Direito como externos ao Direito positivo, servindo apenas aos casos em que o Direito positivo, especialmente representado pela lei, não fosse capaz de fornecer solução específica, nos casos de lacuna da lei.

Na fase póspositivista teve a presença das novas constituições promulgadas acentuam a hegemonia axiológica dos princípios, convertidos em pedestal normativo sobre o qual assenta todo o edifício jurídico dos novos sistemas constitucionais.

De fato, a doutrina italiana já firmou entendimento sobre a força normativa dos princípios, e Bobbio ainda mais ressalta o caráter de normas fundamentais ou generalíssimas do sistema. Em verdade é velha a questão entre os doutrinadores, sobre saber se os princípios são normas. Para Bobbio definitivamente são normas tanto como todas as demais.

De qualquer forma, a expressão é evitada nos Códigos. Mas Bobbio lembrou de que a expressão “princípios gerais do Direito” foi usada pelo legislador de 1865, mas pelos equívocos que poderia suscitar, quando se deveria entender por Direito, posto havia a dúvida se referia ao direito natural ou ao direito positivo.

A Constituição Espanhola conforme alude Peces-Barba que o motivo pelo qual se preferiu o uso da expressão “valores superiores” e se deu para superar a antítese jusnaturalismo versus juspositivismo que é permanentemente latente na cultura jurídica contemporânea.

Contudo, o Brasil tomou caminho contrário, basta que observemos a Lei de Introdução ao Código Civil, o projeto primitivo de Beviláqua, o projeto de Coelho Rodrigues, que cogitava somente em princípios que se deduzem do espírito da lei. E, foi indicação de Lacerda de Almeida, membro da Comissão Revisora e sustentáculo da boa doutrina do Direito Natural (...) que enfim adotou a expressão “princípios gerais do direito”.

Segundo Bergel são regras de direito objetivo e não de direito natural ou ideal, expressas ou não nos textos, mas aplicadas pela jurisprudência e dotadas de um caráter suficiente de generalidade. Porém não são necessariamente enunciados por regras de direito positivo, são menos rígidos e menos precisos do que as prescrições textuais formais.

Podem ser formulados ou não pelo juiz, comportam uma autoridade, um rigor e uma aplicabilidade que, sem isso, a vontade do legislador, que estes exprimem e concretizam. Porém, nem todas as regras que a jurisprudência aplica sem texto, nem todas correspondem aos princípios gerais de direito.

A preconizada fusão da maioria dos princípios gerais de Direito pela concepção jusnaturalista ou positivista conforme nas constituições atuais possui reconhecida força normativa, fez essa categoria sofrer aquela transformação mencionada, que os trouxe à fase póspositivista.

Celso Ribeiro Bastos professa que os princípios gerais de Direito encontram-se na Constituição, bem como servem de fundamento às demais áreas de nosso ordenamento jurídico. Portanto, estão presentes os princípios, como derradeira justificativa de legitimidade.

Num retrocesso histórico, no direito pátrio já existiam os princípios gerais de direito que já foram elevados ao status constitucional na Carta Política de 1934, em seu art. 113, n.37 que in verbis: “Nenhum juiz deixará de sentenciar por motivo de omissão da lei. Em tal caso deverá decidir por analogia, pelos princípios gerais de direito ou por equidade.” Era então, uma concepção predominante à época, que atribuía a estes um caráter meramente subsidiário na superação das lacunas da lei.

Os preâmbulos das Constituições francesas de 1946 e 1958 fazem referência aos princípios fundamentais. Os princípios gerais são muito heterogêneos quanto à forma e ao conteúdo. Alguns assumem forma de máximas, em geral de locuções latinas. Quanto ao conteúdo, certos princípios gerais parecem extraídos da moral, da equidade, ou do direito natural, assim o princípio da boa-fé[5], o brocardo fraus omnia corrumpit são, clara evidência de inspiração ética-moral.

Sobre esta subsidiariedade que fora assumida pelos princípios gerais de Direito, basta atentar para o teor do art. 4º da Lei de Introdução ao Código Civil. Contudo, há outro significado possível para a expressão “princípios gerais do Direito” correspondente aos princípios constitucionais gerais e meros princípios constitucionais.

A doutrina tem procurado distinguir, dentre os próprios princípios, alguns, que são expansivos e mais relevantes para o Direito considerado como um todo, e de outros mais específicos de determinados setores. Com esse objetivo, é comum cogitar-se em princípios fundamentais, princípios políticos fundamentais, princípios da Administração Pública, e outros tantos.

Enfim, os princípios constitucionais funcionam como cimento da sistemática jurídica[6], e traduzem uma unidade congruente de normas. Todas as leis, decretos e atos normativos de qualquer índole devem obediência e respeito aos mais altos cânones normativos, ou seja, aos princípios normativos. É assim que ocorre com todos os denominados ramos do Direito, seja o Direito Penal, o Civil, o Trabalhista, o Tributário, Processual ou qualquer outro.

Os princípios gerais, em sentido lato, constituem o arcabouço do pensamento jurídico e desempenham importante papel na interpretação da lei. Assim os princípios gerais poderão ser diretores ou corretores. Serão diretores posto que a ordem social dependa deles, é assim o princípio que informa que se supõe que ninguém ignora a lei, o da autoridade da coisa julgada, o princípio da igualdade perante a lei e perante os encargos públicos, as liberdades fundamentais, o princípio da não-retroatividade, o princípio de legalidade dos delitos e das penas. Já os princípios corretores de soluções legais são como o princípio de boa-fé são princípios incontestavelmente dessa natureza.

Existem muitos princípios que são alternadamente princípios diretores ou corretores conforme as situações em que são invocados e os outros princípios com que são confrontados. É também um princípio corretor o da autonomia da vontade. No direito francês há hierarquia dos princípios, na cumeeira os princípios fundamentais constantes na Constituição e nos textos com valor constitucional. E, os princípios e regras com valor constitucional são aqueles no preâmbulo da constituição e nos tratados e acordos internacionais.

Os princípios gerais simples constam das leis e textos legislativos infraconstitucionais (tais como leis ordinárias, decretos, leis complementares, e etc).

Nessas searas jurídicas é onde os princípios estão albergados infraconstitucionais, ou seja, são configurados em específicos setores do Direito, que os restringe sua aplicação. No caso brasileiro que é paradigmático no que se refere à ampla constitucionalização promovida, é possível afiançar que os principais princípios encontram-se realmente já plasmados na Constituição, apesar de serem reiterados pelas normas infraconstitucionais. E, nesse caso, prevalece a força normativa constitucional.

Ronald Dworkin[7] trata da diferença entre princípios e regras apontando para intensa abstratividade daqueles em face destas. Destaca que os princípios possuem a dimensão que as regras não possuem. O melhor traço distintivo entre regras e princípios reside exatamente no maior grau de abstração destes, posto que não se reportem a nenhuma descrição de situação fática (hipotética) em particular, adquirindo assim o grau máximo de abstração (objetividade).

No âmbito do superconceito de norma de Canotilho torna-se difícil a distinção. E, aponta o doutrinador lusitano para alguns critérios, entre eles o grua de abstração, de determinabilidade, proximidade da ideia de direito e, principalmente, o caráter de fundamentabilidade que representam os princípios para as fontes de direito.

Aduz Canotilho que os princípios são normas de natureza e com o papel fundamental no ordenamento jurídico devido à sua posição hierárquica no sistema das fontes, ou à sua importância estruturante dentro do sistema jurídico (como por exemplo, o princípio do Estado de Direito).

Assim, considerados como exigências de otimização permitem o balanceamento de valores e interesses, consoante o seu peso e ponderação de outros princípios eventualmente aplicáveis e conflitantes. As regras não deixam espaço para qualquer outra solução, posto que se existir uma regra validade esta deve ser cumprida em sua exata medida de suas prescrições.

Cabral de Moncada não viceja tal distinção qual igual nitidez, pois que calcada em meros critérios estruturais. Portanto, os princípios e regras apenas se distinguem quantitativamente, e, além do mais, a distinção dependeria sempre um elemento aleatório, a vontade do legislador pois que este pode até certo ponto manipular o alcance linguístico dos enunciados legislativos sem perda de conteúdo, apresentando-os de uma ou de outra forma.

A nota principiológica dos direitos fundamentais[8] impõe uma força normativa e, por consequência, uma norma, mas, em virtude de seu valor, como fundamental por óbvio, assume condição de princípios, tidos como posições jurídico-subjetivas, isto é, normas definidoras de direitos e garantias, mas também de deveres fundamentais.

Desta forma, o reconhecimento de direitos humanos não deva mais operar apenas verticalmente, ou seja, na relação existente entre liberdade-autoridade, entre particular- Estado. E, contemporaneamente há a grande ênfase na eficácia horizontal dos direitos humanos (e direitos fundamentais).

O enorme busilis do Direito contemporâneo é não prover previsão normativa para todas as demandas sociais, mas sim oferecer uma das diversas soluções encontráveis no sistema, particularmente nas constituições, como a mais adequada, o que envolve problemas de racionalização dos princípios existentes e justificação da escolha feita. Lembremos que apesar de nossa modernidade tardia, a Constituição garante o acesso à justiça e o direito à duração razoável do processo impõe uma hermenêutica célere, eficaz e justa.

Referências

ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Tradução Ernesto Garzon Valdés. Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 1997.

BERGEL, Jean-Louis. Teoria Geral do Direito. Tradução de Maria Ermantina Galvão. São Paulo: Editora Martins Fortes, 2001.

CANOTILHO, J.J. Gomes. Direito constitucional 6. Ed . Coimbra: Almedina, 2009.

DÓRIA, A. de Sampaio. Princípios constitucionais. São Paulo: Editora São Paulo, 1926.

DWORKIN, Ronald. Taking rights seriously - Levando os Direitos a Sério. Cambridge: Harvard, 1997. Tradução livre das autoras.

GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na Constituição de 1988. 3. Ed. São Paulo: Editora Malheiros, 1997.

TAVARES, André Ramos. Elementos para uma teoria geral dos princípios na perspectiva constitucional. In Dos Princípios Constitucionais – Considerações em torno das normas principiológicas da Constituição – George Salomão Leite (coordenação) 2. ed. ver. atual. e ampl. São Paulo: Editora Método, 2008;

JEANNEAU, B. La nature des príncipes généraux du droit français. Travaux et recherches de l’l Institut de droit compare de L’université de Paris, t. XXIII, 1962. Tradução livre das autoras.

DESCAMPS, Christian. As ideias filosóficas contemporâneas na França. Rio de Janeiro: Editora Zahar, 1991.

BOBBIO, Norberto. A teoria da norma jurídica. Tradução de Fernando Pavan Batista. Apresentação de Alaôr Caffé Alves 2. Ed. São Paulo: EDIPRO, 2003.

MONCADA, Luís S. Cabral de. Estudos de direito público. Coimbra: Editora Coimbra, 2001.

SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001.


[1] O juiz, no sentido genérico designa in casu, todos os órgãos que exercem a função judiciária.

[2] O texto constitucional brasileiro não prevê expressamente sobre o princípio da proporcionalidade, como o faz a Constituição portuguesa em seu art. 18º. Porém isso não impede seu reconhecimento posto que seja imposição natural de qualquer sistema constitucional que consagra as garantias fundamentais. É elemento intrínseco e essencial do documento jurídico que instaura Estado de direito democrático, posto que se preocupe com a preservação dos direitos fundamentais.

[3] Embora o direito francês entenda diferente.

[4] Os raciocínios dialéticos repousam num conjunto de meios empregados na discussão com o fito de mostrar, refutar e trazer a convicção. Aplicam-se não às demonstrações científicas, mas às deliberações de controvérsias. Não excluem o silogismo.

[5] A socialização dos direitos trazida pela teoria do abuso dos direitos que previu que em quase todos os direitos é possível ocorrer o abuso, como por exemplo, o direito de propriedade, no contrato, no direito de greve. Portanto, não basta, para escapar de sua tipificação, entrincheirar-se por trás do fato de que é o titular de um direito, é indispensável não abusar desse direito. Posto que o abusador deva reparar prejuízo que causa a outrem. Concluímos que os direitos do indivíduo não são, portanto, absolutos e devem ser levados em conta o interesse social ao lado do interesse próprio.

[6] Em interessante entrevista ao CONJUR, Lênio Luiz Streck responde: Os princípios estão substituindo as leis? A era dos princípios não veio para transformar o Direito em um império de decisões baseadas na consciência individual de cada julgador. Princípios têm a função de resgatar o mundo prático no Direito. Por outro lado, decisionismos e/ou ativismos não são bons para a democracia. Se cada um decide como quer, os tribunais — mormente o STJ e o STF — acabam entulhados de processos. No fundo, a repercussão geral e as súmulas são uma resposta darwiniana a uma espécie de estado de natureza hermenêutico que criamos. Veja só: se fundamentarmos cada decisão até o limite, teremos uma maior accountabillity [prestação de contas em cada decisão]. Mais: se anulássemos decisões mal fundamentadas, não teríamos essa proliferação de embargos declaratórios. Sugiro, portanto, que cumpramos o artigo 93, inciso IX, da Constituição Federal [estabelece que os julgamentos têm que ser públicos e as decisões, fundamentadas] que, antes de ser um direito, é um dever fundamental do juiz.

(Disponível em http://leniostreck.com.br/index.php?option=com_content&task=view&id=87&Itemid=2 ).

[7] Ronald Dworkin tem razão quando afirmou que a interpretação do juiz deve ser constrangida pelo princípio da coerência normativa face à história do seu direito e da sua cultura jurídica. Entenda-se bem esse constrangido: Dworkin fala em have a duty.

[8] A Súmula Vinculante 11 do STF indicou que as algemas são excepcionais e, ainda quando necessárias, o seu uso deve preservar os direitos fundamentais. Preconizou prudência no uso das algemas e retirou a arbitrariedade lesiva por parte do algemador.

Estudar Direito

Elementos da perspectiva constitucional

 

 

Uma parte da eternidade, uma das quatro dimensões, o tempo é capaz de mostrar que a mudança é contínua em todo universo, o que erige para o jurista a necessidade de se procurar um valor essencial.

 

Toda norma jurídica é uma tentativa de estabilização das relações sociais em perpétuo devir, toda ordem jurídica corresponde a um desafio ao tempo, um esforço de conservação do estado social que esta estabelece. De sorte, que a importância do princípio para o fenômeno jurídica é representar um vetor de ajuste entre a realidade e literalidade.

 

O direito de hoje se fez com o direito de ontem como ode amanhã será oriundo do direito de hoje... O que corrobora com a expressão de Rousseau: “a imagem móvel da imóvel eternidade”.

 

Assim não se pode compreender adequadamente o direito contemporâneo sem cotejar o direito anterior, e nem prever o direito futuro sem extrapolação do direito atual. Compreender- lhes as fontes, o seu teor abstrato das crenças e dos saberes que estão bem impressos nos princípios gerais de direito.

 

Captar a alma constitucional é tarefa complexa, posto que se tem que observar o corpo integral, orgânico e ainda os valores filosóficos, morais, históricos, sociais, jurídicos e principalmente econômicos. Temos que entendê-la como lei funcional, fundamental e suprema do país.

 

E, nessa tarefa hercúlea o Direito vem sido envolvido e penetrado pelos muitos valores jurídicos fundamentais dominantes na comunidade. A doutrina contemporânea prevalente reconhece que as atuais constituições são tributárias de certos valores que albergam em seu bojo normativo as diretrizes, comandos e objetivos a serem alcançados por todo sistema normativo e também pelos operadores do Direito.

 

Nessa sua recente fase do Direito constitucional procura-se desmistificar a neutralidade axiológica da Constituição que vinha sendo apontada pela anterior doutrina, e que sempre foi mais aparente do que real. É certo que os valores habitam o plano axiológico enquanto que os princípios moram no plano deontológico, conforme bem esclareceu Robert Alexy.

 

De certa forma, os valores consagrados constitucionalmente significa o reconhecimento de um direito natural de conteúdo democrático. Embora que se pondere como o faz Cabral de Moncada se os valores não constituem objeto independente do conhecimento histórico das normas jurídicas positivas que lhe fornecem maior concretização e, de por outro lado, que é peculiar ao procedimento democrático de escolha que depende do essencial e respectivo conteúdo.

 

Os valores significam outro material positivo e que são obviamente anteriores as normas, apenas sucedendo que estas concretizam o vago conteúdo axiológico em causa, transformando-o em regras deontológicas de conduta.

 

Tecnicamente resta evidente que os valores são estranhos a essência normativa, externos a esta, mas que nesta influenciam diretamente. Ademais, lembremos que o Direito apesar de ter conceito interpretativo, não é um fim em si mesmo, e sim uma medida, um instrumento capaz de propiciar um relacionamento social seguro.

 

E, como tal deverá refletir as aspirações e valores sociais desejados. E tal carga axiológica se faz particularmente presente no constituinte quando os representantes diretos do povo irão marcar as normas fundamentais.

 

Portanto, os valores ora representam autênticas normas posto que inseridas no corpo textual da constituição como também servem de diretrizes interpretativas. Posto que tragam certa concepção moral e histórica da realidade.

 

As constituições contemporâneas consagram-se em ser um natural receptáculo dos valores dominantes da sociedade. E, são positivados por meio dos princípios constitucionais que uma vez adotados desagua a carga axiológica incorporada pelo ordenamento jurídico.

 

A ideia de princípio cunhada pela Teoria Geral do Direito é multifacetada posto que ora designe a formulação dogmática de conceitos estruturados por sobre o direito positivo, e ora designe determinado tipo de norma e ora estabeleça teóricos postulados e proposições jurídicas concretas ou de institutos de direito ou normas legais vigentes.

 

Os princípios gerais podem de início parecer ser resultante da síntese de textos legislativos esparsos, ou extraídos da lei, por indução amplificadora, pois a jurisprudência utiliza a sistematização operada pela doutrina e as ideias mestras que esta discerniu dos textos.

 

Jeanneau acautelava que os princípios gerais não têm por si sós nenhuma existência própria: compete ao juiz[1] dar-lhes força e vida. Assim significam o espírito da lei, fruto das aspirações latentes do corpo social. Daí justificar-se sua intensa generalidade, permanência e a transcendência.

 

Sampaio Dória definiu os princípios do Direito Constitucional como bases orgânicas dos Estados, são aquelas generalidades do direito público, como sendo as naus da civilização que devem sobrenadar às tempestades políticas, e às paixões dos homens.

 

Os princípios constitucionais brasileiros são cânones com os quais não existiriam a União, tal qual é em suas características essenciais. Enfim, a Constituição em sua missão de Lei Maior do Estado, possui contorno e determina âmbitos para as demais normas do sistema jurídico, sendo fundamento necessário de sua validade, argumento há muito tempo desenvolvido por Kelsen.

 

Conclui-se que os princípios elevados à esfera constitucional angariaram maior importância sobre os demais princípios jurídicos. Servem de pautas ou critérios por excelência para avaliação de todos os conteúdos normativos, recebem positivação em elevado grau e instauram uma instância valorativa máxima, dando hegemonia às normas constitucionais, se convertem, pois em norma normarum, ou seja, norma das normas.

 

Os princípios constitucionais também norteiam o legislador ordinário, o Judiciário e até mesmo o Executivo. Posto que se situem no ápice do sistema jurídico, segundo Rolando E. Pina, em análise à jurisprudência alemã atentamente observou que é contínua a utilização da expressão “princípio jurídico-constitucional” nas decisões da Corte suprema germânica.

 

Os princípios essenciais são os summa genera do direito constitucional trazendo fórmulas basilares, postos-chaves, de interpretação e construção teórica do constitucionalismo, e daí, se justifica a enorme atenção doutrina desenvolvida em sua descoberta e elucidação.

 

Os princípios gerais correspondem aos tópicos de Aristóteles, ou às máximas do Digesto, ou ainda, aos primeiros princípios de todas as leis. Em verdade, essa noção permanece obscura e sua natureza incerta, como permanece a incerteza de suas fontes.

 

Admite-se a colidência entre princípios e tal situação pode ser resolvida por meio da aplicação do princípio da proporcionalidade[2]. Em verdade um valor vigora até determinado ponto a partir do qual recebe o influxo de um valor em sentido contrário.

 

E, ressalte-se que não existe hierarquia normativa[3] entre princípios. Apesar de que poderá existir uma distinção axiológica, mas não exatamente uma hierarquia normativa, posto que todas as normas constitucionais se encontrem num mesmo patamar, e não se pode atribuir superioridade apriorística, em relação de outro princípio, por força de algum valor relevante que no primeiro se vislumbre.

 

Com lucidez asseverou Eros Grau que um sistema ou ordenamento jurídico jamais será integrado exclusivamente por regras. Pois neste há princípios jurídicos ou princípios de Direito. É fato, portanto que os princípios de Direito, pois sempre esteve presente nos ordenamentos jurídicos.

 

A juridicidade dos princípios aponta para três fases distintas ao longo da evolução histórica: a jusnaturalista, a positivista e a póspositivista.

 

Na primeira fase, os princípios eram como axiomas, verdades universais, estabelecidos pela razão, Cabral de Moncada aponta que os princípios são premissas de onde se retiram as soluções mais adequadas, algo ao jeito dos édoxas aristotélicos ou regras indiscutidas por serem de aceitação geral a partir das quais se desenvolvem propostas dialéticas[4].

 

Dentro da acepção formalista, os princípios gerais do Direito assumem seu caráter positivo, sendo consagrados pelos códigos, mas apenas na exata medida da necessidade de colmatarem eventuais lacunas. Nessa fase, eram considerados fontes secundárias do Direito, não estavam acima das leis, mas ao lado, quando necessário fosse.

 

Espíndola aponta dois sentidos diversos de princípios jurídicos, primeiro como princípios positivos do Direito e, na segundo como princípios gerais de Direito. Tal divisão alude àquela fase em que em que os princípios gerais do Direito eram considerados decorrentes da ideia de Direito como externos ao Direito positivo, servindo apenas aos casos em que o Direito positivo, especialmente representado pela lei, não fosse capaz de fornecer solução específica, nos casos de lacuna da lei.

 

Na fase póspositivista teve a presença das novas constituições promulgadas acentuam a hegemonia axiológica dos princípios, convertidos em pedestal normativo sobre o qual assenta todo o edifício jurídico dos novos sistemas constitucionais.

 

De fato, a doutrina italiana já firmou entendimento sobre a força normativa dos princípios, e Bobbio ainda mais ressalta o caráter de normas fundamentais ou generalíssimas do sistema. Em verdade é velha a questão entre os doutrinadores, sobre saber se os princípios são normas. Para Bobbio definitivamente são normas tanto como todas as demais.

 

De qualquer forma, a expressão é evitada nos Códigos. Mas Bobbio lembrou de que a expressão “princípios gerais do Direito” foi usada pelo legislador de 1865, mas pelos equívocos que poderia suscitar, quando se deveria entender por Direito, posto havia a dúvida se referia ao direito natural ou ao direito positivo.

 

A Constituição Espanhola conforme alude Peces-Barba que o motivo pelo qual se preferiu o uso da expressão “valores superiores” e se deu para superar a antítese jusnaturalismo versus juspositivismo que é permanentemente latente na cultura jurídica contemporânea.

 

Contudo, o Brasil tomou caminho contrário, basta que observemos a Lei de Introdução ao Código Civil, o projeto primitivo de Beviláqua, o projeto de Coelho Rodrigues, que cogitava somente em princípios que se deduzem do espírito da lei. E, foi indicação de Lacerda de Almeida, membro da Comissão Revisora e sustentáculo da boa doutrina do Direito Natural (...) que enfim adotou a expressão “princípios gerais do direito”.

 

Segundo Bergel são regras de direito objetivo e não de direito natural ou ideal, expressas ou não nos textos, mas aplicadas pela jurisprudência e dotadas de um caráter suficiente de generalidade. Porém não são necessariamente enunciados por regras de direito positivo, são menos rígidos e menos precisos do que as prescrições textuais formais.

 

Podem ser formulados ou não pelo juiz, comportam uma autoridade, um rigor e uma aplicabilidade que, sem isso, a vontade do legislador, que estes exprimem e concretizam. Porém, nem todas as regras que a jurisprudência aplica sem texto, nem todas correspondem aos princípios gerais de direito.

 

A preconizada fusão da maioria dos princípios gerais de Direito pela concepção jusnaturalista ou positivista conforme nas constituições atuais possui reconhecida força normativa, fez essa categoria sofrer aquela transformação mencionada, que os trouxe à fase póspositivista.

 

Celso Ribeiro Bastos professa que os princípios gerais de Direito encontram-se na Constituição, bem como servem de fundamento às demais áreas de nosso ordenamento jurídico. Portanto, estão presentes os princípios, como derradeira justificativa de legitimidade.

 

Num retrocesso histórico, no direito pátrio já existiam os princípios gerais de direito que já foram elevados ao status constitucional na Carta Política de 1934, em seu art. 113, n.37 que in verbis: “Nenhum juiz deixará de sentenciar por motivo de omissão da lei. Em tal caso deverá decidir por analogia, pelos princípios gerais de direito ou por equidade.” Era então, uma concepção predominante à época, que atribuía a estes um caráter meramente subsidiário na superação das lacunas da lei.

 

Os preâmbulos das Constituições francesas de 1946 e 1958 fazem referência aos princípios fundamentais. Os princípios gerais são muito heterogêneos quanto à forma e ao conteúdo. Alguns assumem forma de máximas, em geral de locuções latinas. Quanto ao conteúdo, certos princípios gerais parecem extraídos da moral, da equidade, ou do direito natural, assim o princípio da boa-fé[5], o brocardo fraus omnia corrumpit são, clara evidência de inspiração ética-moral.

 

Sobre esta subsidiariedade que fora assumida pelos princípios gerais de Direito, basta atentar para o teor do art. 4º da Lei de Introdução ao Código Civil. Contudo, há outro significado possível para a expressão “princípios gerais do Direito” correspondente aos princípios constitucionais gerais e meros princípios constitucionais.

 

A doutrina tem procurado distinguir, dentre os próprios princípios, alguns, que são expansivos e mais relevantes para o Direito considerado como um todo, e de outros mais específicos de determinados setores. Com esse objetivo, é comum cogitar-se em princípios fundamentais, princípios políticos fundamentais, princípios da Administração Pública, e outros tantos.

 

Enfim, os princípios constitucionais funcionam como cimento da sistemática jurídica[6], e traduzem uma unidade congruente de normas. Todas as leis, decretos e atos normativos de qualquer índole devem obediência e respeito aos mais altos cânones normativos, ou seja, aos princípios normativos. É assim que ocorre com todos os denominados ramos do Direito, seja o Direito Penal, o Civil, o Trabalhista, o Tributário, Processual ou qualquer outro.

 

Os princípios gerais, em sentido lato, constituem o arcabouço do pensamento jurídico e desempenham importante papel na interpretação da lei. Assim os princípios gerais poderão ser diretores ou corretores. Serão diretores posto que a ordem social dependa deles, é assim o princípio que informa que se supõe que ninguém ignora a lei, o da autoridade da coisa julgada, o princípio da igualdade perante a lei e perante os encargos públicos, as liberdades fundamentais, o princípio da não-retroatividade, o princípio de legalidade dos delitos e das penas. Já os princípios corretores de soluções legais são como o princípio de boa-fé são princípios incontestavelmente dessa natureza.

 

Existem muitos princípios que são alternadamente princípios diretores ou corretores conforme as situações em que são invocados e os outros princípios com que são confrontados. É também um princípio corretor o da autonomia da vontade. No direito francês há hierarquia dos princípios, na cumeeira os princípios fundamentais constantes na Constituição e nos textos com valor constitucional. E, os princípios e regras com valor constitucional são aqueles no preâmbulo da constituição e nos tratados e acordos internacionais.

 

Os princípios gerais simples constam das leis e textos legislativos infraconstitucionais (tais como leis ordinárias, decretos, leis complementares, e etc).

 

Nessas searas jurídicas é onde os princípios estão albergados infraconstitucionais, ou seja, são configurados em específicos setores do Direito, que os restringe sua aplicação. No caso brasileiro que é paradigmático no que se refere à ampla constitucionalização promovida, é possível afiançar que os principais princípios encontram-se realmente já plasmados na Constituição, apesar de serem reiterados pelas normas infraconstitucionais. E, nesse caso, prevalece a força normativa constitucional.

 

Ronald Dworkin[7] trata da diferença entre princípios e regras apontando para intensa abstratividade daqueles em face destas. Destaca que os princípios possuem a dimensão que as regras não possuem. O melhor traço distintivo entre regras e princípios reside exatamente no maior grau de abstração destes, posto que não se reportem a nenhuma descrição de situação fática (hipotética) em particular, adquirindo assim o grau máximo de abstração (objetividade).

 

No âmbito do superconceito de norma de Canotilho torna-se difícil a distinção. E, aponta o doutrinador lusitano para alguns critérios, entre eles o grua de abstração, de determinabilidade, proximidade da ideia de direito e, principalmente, o caráter de fundamentabilidade que representam os princípios para as fontes de direito.

 

Aduz Canotilho que os princípios são normas de natureza e com o papel fundamental no ordenamento jurídico devido à sua posição hierárquica no sistema das fontes, ou à sua importância estruturante dentro do sistema jurídico (como por exemplo, o princípio do Estado de Direito).

 

Assim, considerados como exigências de otimização permitem o balanceamento de valores e interesses, consoante o seu peso e ponderação de outros princípios eventualmente aplicáveis e conflitantes. As regras não deixam espaço para qualquer outra solução, posto que se existir uma regra validade esta deve ser cumprida em sua exata medida de suas prescrições.

 

Cabral de Moncada não viceja tal distinção qual igual nitidez, pois que calcada em meros critérios estruturais. Portanto, os princípios e regras apenas se distinguem quantitativamente, e, além do mais, a distinção dependeria sempre um elemento aleatório, a vontade do legislador pois que este pode até certo ponto manipular o alcance linguístico dos enunciados legislativos sem perda de conteúdo, apresentando-os de uma ou de outra forma.

 

A nota principiológica dos direitos fundamentais[8] impõe uma força normativa e, por consequência, uma norma, mas, em virtude de seu valor, como fundamental por óbvio, assume condição de princípios, tidos como posições jurídico-subjetivas, isto é, normas definidoras de direitos e garantias, mas também de deveres fundamentais.

 

Desta forma, o reconhecimento de direitos humanos não deva mais operar apenas verticalmente, ou seja, na relação existente entre liberdade-autoridade, entre particular- Estado. E, contemporaneamente há a grande ênfase na eficácia horizontal dos direitos humanos (e direitos fundamentais).

 

O enorme busilis do Direito contemporâneo é não prover previsão normativa para todas as demandas sociais, mas sim oferecer uma das diversas soluções encontráveis no sistema, particularmente nas constituições, como a mais adequada, o que envolve problemas de racionalização dos princípios existentes e justificação da escolha feita. Lembremos que apesar de nossa modernidade tardia, a Constituição garante o acesso à justiça e o direito à duração razoável do processo impõe uma hermenêutica célere, eficaz e justa.

 

 

Referências

ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Tradução Ernesto Garzon Valdés. Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 1997.

BERGEL, Jean-Louis. Teoria Geral do Direito. Tradução de Maria Ermantina Galvão. São Paulo: Editora Martins Fortes, 2001.

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GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na Constituição de 1988. 3. Ed. São Paulo: Editora Malheiros, 1997.

TAVARES, André Ramos. Elementos para uma teoria geral dos princípios na perspectiva constitucional. In Dos Princípios Constitucionais – Considerações em torno das normas principiológicas da Constituição – George Salomão Leite (coordenação) 2. ed. ver. atual. e ampl. São Paulo: Editora Método, 2008;

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BOBBIO, Norberto. A teoria da norma jurídica. Tradução de Fernando Pavan Batista. Apresentação de Alaôr Caffé Alves 2. Ed. São Paulo: EDIPRO, 2003.

MONCADA, Luís S. Cabral de. Estudos de direito público. Coimbra: Editora Coimbra, 2001.

SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001.


[1] O juiz, no sentido genérico designa in casu, todos os órgãos que exercem a função judiciária.

[2] O texto constitucional brasileiro não prevê expressamente sobre o princípio da proporcionalidade, como o faz a Constituição portuguesa em seu art. 18º. Porém isso não impede seu reconhecimento posto que seja imposição natural de qualquer sistema constitucional que consagra as garantias fundamentais. É elemento intrínseco e essencial do documento jurídico que instaura Estado de direito democrático, posto que se preocupe com a preservação dos direitos fundamentais.

[3] Embora o direito francês entenda diferente.

[4] Os raciocínios dialéticos repousam num conjunto de meios empregados na discussão com o fito de mostrar, refutar e trazer a convicção. Aplicam-se não às demonstrações científicas, mas às deliberações de controvérsias. Não excluem o silogismo.

[5] A socialização dos direitos trazida pela teoria do abuso dos direitos que previu que em quase todos os direitos é possível ocorrer o abuso, como por exemplo, o direito de propriedade, no contrato, no direito de greve. Portanto, não basta, para escapar de sua tipificação, entrincheirar-se por trás do fato de que é o titular de um direito, é indispensável não abusar desse direito. Posto que o abusador deva reparar prejuízo que causa a outrem. Concluímos que os direitos do indivíduo não são, portanto, absolutos e devem ser levados em conta o interesse social ao lado do interesse próprio.

[6] Em interessante entrevista ao CONJUR, Lênio Luiz Streck responde: Os princípios estão substituindo as leis? A era dos princípios não veio para transformar o Direito em um império de decisões baseadas na consciência individual de cada julgador. Princípios têm a função de resgatar o mundo prático no Direito. Por outro lado, decisionismos e/ou ativismos não são bons para a democracia. Se cada um decide como quer, os tribunais — mormente o STJ e o STF — acabam entulhados de processos. No fundo, a repercussão geral e as súmulas são uma resposta darwiniana a uma espécie de estado de natureza hermenêutico que criamos. Veja só: se fundamentarmos cada decisão até o limite, teremos uma maior accountabillity [prestação de contas em cada decisão]. Mais: se anulássemos decisões mal fundamentadas, não teríamos essa proliferação de embargos declaratórios. Sugiro, portanto, que cumpramos o artigo 93, inciso IX, da Constituição Federal [estabelece que os julgamentos têm que ser públicos e as decisões, fundamentadas] que, antes de ser um direito, é um dever fundamental do juiz.

(Disponível em http://leniostreck.com.br/index.php?option=com_content&task=view&id=87&Itemid=2 ).

[7] Ronald Dworkin tem razão quando afirmou que a interpretação do juiz deve ser constrangida pelo princípio da coerência normativa face à história do seu direito e da sua cultura jurídica. Entenda-se bem esse constrangido: Dworkin fala em have a duty.

[8] A Súmula Vinculante 11 do STF indicou que as algemas são excepcionais e, ainda quando necessárias, o seu uso deve preservar os direitos fundamentais. Preconizou prudência no uso das algemas e retirou a arbitrariedade lesiva por parte do algemador.

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