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quinta-feira, 29 de novembro de 2012

Resenha de novembro de 2012

 

 

Olá, pessoal!

As indicações bibliográficas desse mês correspondem a uma das mais importantes, seja pelo peso dos autores e doutrinadores, seja pela relevância das temáticas tratadas que devem ser imprescindíveis para a boa atuação dos profissionais de Direito.

Há muito tempo que falo em minhas aulas o quanto é exigente o tempo para a Ciência do Direito, enfim, a atualização é pertinente portanto, para a prática da advocacia, é exigida nos concursos públicos, nos cursos de graduação, de pós-graduação e, enfim, até em mestrados e doutorados.

A obra é intitulada “Direito de Família – Uma Abordagem Psicanalítica” de autoria de Rodrigo Cunha Pereira, advogado, professor universitário, Doutor em Direito (UFPR), Mestre em Direito (UFMG) e Presidente do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM) do qual tenho a honra de pertencer.

A obra de fôlego foi publicada pelo Grupo Gen, Editora Forense, contendo o total de 216 páginas, disponível em livro impresso e também na versão e-book (electronic book ou livro eletrônico).

Enviei algumas parcas perguntas, entabulando uma entrevista com o notável autor que apresentou as seguintes respostas:

De qual forma o senhor, como autor e jurista sintetiza a família contemporânea e seus principais conflitos?

A família foi, é e continuará sendo o núcleo formador e estruturador do sujeito. Sem família não é possível existir nenhuma sociedade. Mas seu conceito hoje esta bem diferente de algumas décadas atrás. Ela não é mais singular, é plural. Ou seja, existem várias representações sociais de família e todas elas devem receber proteção do Estado. O grande desafio desta área do Direito hoje é buscar um conceito de família, pois aquele que se lia nos tradicionais livros doutrinários já não servem mais. Precisamos buscar um conceito que esteja acima de valores morais estigmatizantes para não repetir as injustiças históricas de exclusão e expropriação de cidadanias, como aconteceu com os filhos e famílias havidas fora do casamento, por exemplo.

2. Como analisa a legislação brasileira que regula atualmente o Direito de Família? Aponte, por favor, os prós e os contra.

A legislação brasileira ainda não atende a todas as relações familiares que merecem proteção do Estado. Embora o Código Civil tenha entrado em vigor em 2003, e tenha feito alguns avanços, em muitos aspectos ele é falho. É que a realidade tem mudado muito mais rápido que as regras jurídicas. Em razão disto o IBDFAM – Instituto Brasileiro de Direito de Família apresentou ao Congresso Nacional um Projeto de Lei denominado “Estatuto das Famílias”, reformulando toda a legislação sobre Direito de Família. Enquanto isto, e para não permitir que injustiças ocorram por falta de lei expressa sobre determinado assunto, podemos nos socorrer dos princípios constitucionais que assim como as regras jurídicas (leis) são também normas jurídicas.

3. De qual maneira a abordagem psicanalítica ajudou o autor a enfocar o Direito de Família?

A psicanálise proporciona compreender que em todas as relações jurídicas há uma subjetividade que as determina. Ou seja os atos e fatos jurídicos são determinados, ou predeterminados, pelo “sujeito do inconsciente”. O sujeito de direito é também sujeito de desejo, e como ser desejante é ele que faz e desfaz negócios jurídicos, casa, separa, reconhece ou não a paternidade etc. Ver o sujeito de direito como sujeito desejante nos remete a uma outra compreensão sobre Direito e em especial sobre o Direito de Família. Além disto o discurso psicanalítico proporciona desestigmatizar o conceito de família. Em outras palavras se a família não é um fenômeno da natureza, mas da cultura, é antes de tudo uma estruturação psíquica em que cada membro ocupa um lugar, uma função. Vista por esse ângulo, é possível compreendê-la em qualquer grupamento humano, em qualquer tempo ou espaço.

4. Qual é seu posicionamento doutrinário a respeito das uniões homoafetivas?

Se a família é uma estruturação psíquica, e é um elemento da cultura, e não da natureza, é possível que a relação entre pessoas do mesmo sexo constituam seus núcleos familiares, sejam parentais ou conjugais. O reconhecimento destas relações é um caminho sem volta, quer gostemos ou não, queiramos ou não, inclusive o casamento civil homoafetivo. A dificuldade das pessoas em aceitarem essas relações como nucleos familiares reside em fatores puramente morais, mas que não são éticos. E no fundo isto toca nas fantasias mais inconscientes do sujeito e no medo dos próprios fantasmas.

5. O que é mais importante para um operador de Direito ao atuar na seara do Direito de Família?(em termos de qualificações e habilidades)

Para atuar na área do Direito de Família é preciso antes de tudo ter sensibilidade. Depois desejo. E paciência. A abordagem psicanalítica na prática do Direito de Família nos remete a uma ética do bem. Isto significa não nos permitirmos ser instrumentos do “gozo” do cliente. A expressão “gozo” foi usada por Lacan, tomada emprestada do mundo jurídico, para resignificá-la como uma satisfação pulsional e o seu paradoxo com o prazer e o desprazer. Devemos mostrar aos nossos clientes que o seu verdadeiro interesse, às vezes, não é aquele que aparenta ser. Em outras palavras devemos evitar a montagem perversa que muitas vezes se torna uma demanda judicial, já que o processo judicial é a materialização de uma realidade subjetiva.

6. Possui outra obra em andamento, de qual tema?

Tenho me interessado cada vez mais em buscar ajuda em outros campos do conhecimento para fazer um Direito de Família melhor. Além da psicanálise, tenho pensado muito em trazer a arte para o Direito e romper um pouco as barreiras entre esses dois campos aparentemente tão diferentes. Mas Arte e Direito falam da mesma humanidade. E é exatamente nesta humanidade e humanização do Direito que podemos transformar o Direito de Família, cada vez mais, em Direitos Humanos e humanizadores.

Rodrigo da Cunha Pereira, 54, Advogado em Belo Horizonte onde mantém sua clínica do Direito, Doutor em Direito Civil (UFPR) e Presidente do IBDFAM – Instituto Brasileiro de Direito de Família.

Nos inúmeros prefácios da obra que já se encontra em quarta edição, mais precisamente no prefácio da segunda edição, assinado por Célio Garcia, psicanalista, professor aposentado na Faculdade de Medicina da UFMG, há uma interessante invocação a Joyce, que em muito elucida a abordagem feita pelo autor: "Quem é o pai que qualquer filho amaria, quem é o pai que amaria qualquer filho?"; Paternidade, num sentido consciente, é até hoje coisa desconhecida para o homem. De fato, ela é um estado místico, uma sucessão apostólica de pai para filho. (...) no vazio, na incerteza, na improbabilidade. A paternidade deve ser uma ficção legal, disse Joyce.

A erudita abordagem e pertinente obra torna-se ferramenta cabal para que tenhamos uma panótica e a devida compreensão do Direito de Família, das relações familiares e, sobretudo na indispensável defesa da dignidade da pessoa humana e pela crescente humanização da ciência do Direito.

Gostaria de parabenizar e agradecer o autor e jurista pela obra, a editora e principalmente por sua atenção e disponibilidade, pois prontamente respondeu minhas perguntas.

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Site do IBDFAM

http://www.ibdfam.org.br/novosite/

http://www.ibdfam.org.br/novosite/artigos/pagina/1

A outra indicação é Lições de Direito Empresarial, de autoria de Mônica Gusmão (Graduada em Direito pela Faculdade de Direito Cândido Mendes. Pós-Graduada em Direito Empresarial pela Faculdade de Direito Cândido Mendes. Pós-Graduada em Metodologia e Didática do Ensino Superior na Faculdade de Direito Cândido Mendes e na FGV – Fundação Getulio Vargas. Pós-Graduada em Metodologia e Didática do Ensino Superior à Distância na FGV – Fundação Getulio Vargas. Professora de Direito Comercial nos Cursos de Graduação (Direito e Ciências Contábeis) e da Pós-Graduação nas áreas de Controladoria e Finanças e nos Cursos de Especialização em Direito Empresarial e em Responsabilidade Civil da Faculdade de Direito Cândido Mendes. Professora de Direito Empresarial da EMERJ – Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro, na AMPERJ – Associação do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro, na FEMPERJ – Fundação Escola do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro, no IBMEC e na FGV. Autora de diversos artigos no âmbito jurídico.), que já se encontra na décima-primeira edição, publicada pelo Grupo Gen, Editora Forense, contendo 640 páginas. Trata a disciplina com eficiência, didática e principalmente atualização. Bastante recomendável para todos os níveis de ensino universitário, especialmente os concursandos.

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segunda-feira, 19 de novembro de 2012

Esclarecimentos sobre o direito civil contemporâneo

 

 

 

Tratar do direito civil atual principalmente em face da vigente legalidade constitucional, dos fundamentos da república brasileira e da incidência do constitucionalismo contemporâneo ou o neoconstitucionalismo é um enorme desafio.

 

Pretendo pois humildemente sintetizar sempre de forma didática todo o giro semântico que todo Direito Privado experimentou e, ainda tem passado, significando um alerta para a discussão sobre a natureza normativa das Constituições, marcando a passagem do Estado Liberal para o Estado Social, e acenando para a complexidade do caráter unitário do ordenamento jurídico.

 

E, ainda ousaremos nos embrenhar na renovada teoria da interpretação jurídica com fins aplicativos, o que nos remete prontamente ao reconhecimento do valor normativo dos princípios, das normas constitucionais, e, principalmente para supremacia do texto constitucional a requer vigilante controle de constitucionalidade.

 

Deve-se romper com o velho paradigma que informava que o jaez constitucional tinha como exclusivo destinatário o legislador ordinário.

 

Pois a normatividade constitucional se dirige a todos os sujeitos de direito, em especial, aos cidadãos. E não representa a normatividade constitucional apenas impor os limites e impedimentos à lei ordinária e nem erigir simples suportes hermenêuticos para o ordenamento jurídico.

 

A normatividade constitucional além de indicar os fundamentos e suas justificações para reger os valores interdisciplinares presentes tanto nas instituições jurídicos quanto nos institutos jurídicos.

 

A revisão dos institutos do direito civil feito à luz da constituição abarca ambiguidade, posto que destaque o objeto da interpretação com fins aplicativos na ordem infraconstitucional mas também servirá de meio interpretativo das disposições infraconstitucionais que deverão ser integradas às normas constitucionais.

 

Servindo uns em função dos outros e vice-versa, coordenados pela combinação de normas elaborando uma hermenêutica de mão dupla e precursora de grandes ambiguidades e reflexões.

 

A odiosa fragmentação do saber jurídico e a artificial divisão do direito em ramos e especializações tenta fechar o juristas em seu microssistema composto de ferramentas técnica-setoriais que operam de forma acrítica e insensível não logrando êxito de ser um projeto voltado para a sociedade e permanece indiferente ao embate dos grupos de poder e os grupos de pressão.

 

Não foi a indiferença que ajudou ao Direito enquanto ciência e técnica e o fez garantir conquistas como a cidadania, a democracia, o respeito à dignidade humana e o Estado Democrático de Direito.

 

O pluralismo das fontes de direito emanado da concepção estatal contemporânea traduza a relevância normativa e a necessidade do controle de legitimidade e reforça a necessária distinção entre validade, legalidade e eficácia.

 

Assim, o princípio da legalidade constitucional configura a garantia de sujeição aos valores fundamentais do ordenamento jurídico, inserindo o controle da legitimidade da lei, não só em seu aspecto procedimental (ou o iter formativo de lei) mas principalmente em razão do conteúdo da lei.

 

O controle da lei é, sobretudo, o controle da legitimidade constitucional e não atinge apenas a lei, mas também os atos e as atividades que são expressões da autonomia individual, coletiva e da discricionariedade administrativa.

 

Portanto, as autonomias e mesmo a singular liberdade representada pela iniciativa econômica privada e mercantil não escapam ao controle de merecimento diante dos valores constitucionais.

 

Neste contexto, a função e a destinação dos atos e institutos jurídicos assumem peculiar valor decisivo em razão ao seu conceito estrutural. A redimensão da iniciativa econômica não pode deixar de ter utilidade social que deve ser exercida de forma que não cause dano à segurança, à liberdade e à dignidade humana.

 

O direito civil constitucional representa a superação da interpretação formalista tão-somente fundamentada no mecanismo lógico-teórico da subsunção do fato concreto à norma jurídica abstrata; a proposta contemporânea de interpretação das disposições normativas enfatiza a hierarquia das fontes e dos valores dentro de uma acepção sistemática e lógica.

 

Desta forma, é possível formular os seguintes questionamentos:

- O que é mais importante: a livre iniciativa ou a preservação do meio ambiente?

- O que é mais relevante: o direito à privacidade ou intimidade ou o direito à identidade e à paternidade, direito ao nome?

- O que é mais valioso: o equilíbrio da base objetiva do negócio jurídico ou apenas ser fiel à literalidade da avença apesar de não obedecer aos rebus sic stantibus?

 

É impossível manter divorciada a teoria da interpretação das leis ordinárias da teoria da interpretação das normas constitucionais. O principal cânone sistemático exige que o ordenamento seja interpretado em sua unidade; ao passo que o cânone axiológico pressupõe que os valores constitucionais, comunitários e atualizem cada uma das normas ou conjunto de normas que devem ser lidas e interpretadas sempre, mesmo que aparentemente claras.

 

Desta forma, o intérprete realiza o controle obrigatório da legitimidade constitucional de qualquer disposição, seja a mais recente, seja antiga e que seja aplicada ao caso concreto pelo juiz.

 

A clareza da norma em verdade, é uma eventual posterius, e não um prius da interpretação. A norma clara ou obscura deve estar em conformidade com os princípios e valores do ordenamento e deve resultar de regular procedimento argumentativo não somente lógico, mas sobretudo axiologicamente de acordo com as escolhas de fundo do ordenamento.

 

Para cumprir essa finalidade é necessário:

a) A interpretação do fato e da lei e ainda a qualificação normativa do fato configuram um processo unitário e não divisível, onde o problema concreto e o sistema do ordenamento são indissolúveis e compreensíveis, não em fases distintas, mas unitariamente;

b) Conscientizar que o controle de conformidade da lei à Constituição é uma constante de qualquer interpretação para fins aplicativos que procure individualizar uma questão de fato, em um caso concreto, a solução não poderá ser coerente, adequada e razoável e então correspondente à tábua de valores normativos relevantes, presentes na Constituição.

 

Uma lei clara em seu texto ou dura em sua aplicação, que esteja em contraste com os princípios normativos da Constituição, é ilegítima, teria uma ratio inconstitucional e não integrativa à legalidade constitucional a que o intérprete está vinculado.

 

Precisamos adequar as técnicas e as noções aos valores principais evitando aceitar tão passivamente como válidas as práxis oficiais e as interpretações correntes.

 

A legalidade quanto mais seja portadora de maior e mais qualificada promoção e tutela da pessoa humana, e suas exigências endossarão no parâmetro hermenêutico o privilégio dos valores-guias da Constituição, assumindo pela historicidade e pela totalidade da experiência promovendo um justo equilíbrio entre o “dever-ser” e o ser, sabendo colher a natureza desses interesses e desses valores em conflito, ponderando-os em relação ao caso concreto segundo a axiologia constitucional e pronto a reconhecer nos aspectos valorativos de descontinuidade, o respeito à tradição, aos fatores, a um só tempo, de promoção e garantia do pacto constitucional.

 

Atentar para os critérios hermenêuticos inovadores e dos valores, da razoabilidade, da proporcionalidade, da adequação, da subsidiariedade, recuperando a factividade para a juridicidade.

 

A solução do caso concreto é procurada necessariamente na totalidade do ordenamento jurídico sem violentar as peculiaridades dos fatos, propondo o conhecimento da norma como fator decisivo para individualização normativa.

 

É preciso formar uma classe de jurista adequadamente preparada e capaz de construir uma jurisprudência avaliativa atenta às consequências das decisões. E que contribua para edificar a justiça segundo os valores da constituição, concretizados no impacto com a totalidade da experiência cultural como historicamente se determinar e se evolui.

 

Segundo o neoconstitucionalismo é pungente o reconhecimento dos tratados internacionais que se refiram à pessoa humana e seus direitos fundamentais como valores conquistados em múltiplas formas.

 

No centro dos sistemas jurídicos contemporâneos, alvo dos documentos jurídicos e normativos como são as constituições que correspondem às cartas principiológicas de conteúdo ético, mas devem ser evolutivamente interpretados de acordo com a modificação dos valores ético-políticos da comunidade a que a constituição se refere.

 

O primado dos valores da pessoa humana e de seus direitos fundamentais exclui do direito civil a concepção patrimonialista fundada ora na centralidade da propriedade privada, ora sobre a noção de empresa.

 

Caio Mário da Silva Pereira ao receber merecidamente da Universidade de Coimbra o título de honoris causa, em 1999,afirmou que "é tempo de se reconhecer que a posição ocupada pelos princípios gerais de direito passou a ser preenchida pelas normas constitucionais, notadamente, pelos direitos fundamentais. Tal proposta consolidou em nossa doutrina "um direito civil constitucional" reconhecido definitivamente, nos meios acadêmicos e pelos tribunais".

 

O direito civil constitucional seguindo o constitucionalismo contemporâneo reconhece que a forte ideia de sistema não se refere somente ao mercado, mas numa perspectiva de despatrimonializar o direito.

 

A supremacia do direito e da política sobre o mercado e sobre a economia representa a epifania do direito civil constitucional que prega a superação da separação do direito privado e do direito público.

 

Realiza a concretização da ordem constitucional como sistema aberto também a internacionalização das relações civis, mas sob o controle vigiado e atento que não invalida a atuação dos direitos humanos democraticamente colocados no centro do pacto de convivência.

 

A contraposição “público-privado” se enfraqueceu e determinou nova composição de institutos e das instituições reavivados pela igualdade e, sobretudo, pela solidariedade como função primária do Estado contemporâneo.

 

Nos ordenamentos jurídicos onde o controle de constitucionalidade de um ato com força de lei é proposto perante a Corte Constitucional na via incidental da parte do juiz comum, é indispensável que o papel do julgador mude.

 

Dele se espera que diante de incompatibilidade absoluta e insanável, ou seja, na identificação de antinomia insuperável, perceba uma não-conformidade que pode ser superada por uma completa coordenação, desenvolvendo um controle difuso que se alie ao controle concentrado na Corte Constitucional.

 

Assim o juiz comum é convocado a ter uma linha interpretativa mais aprofundada sobre as questões constitucionais sem remetê-las ao STF, e promovendo a “conformação” do texto legislativo às normas constitucionais.

 

Em síntese, para solucionar o caso concreto a norma constitucional é utilizada, de toda maneira, seja na aplicação combinada com a legislação ordinária específica, ou as cláusulas gerais ou princípios gerais do direito, seja na aplicação direta.

 

Ao civilista se impõe um vasto e denso programa de estudo para melhor compreender o sistema do direito civil harmonizado com os valores constitucionais, sobretudo, o valor da pessoa humana, redefinindo os fundamentos, as rationes e extensões dos institutos jurídicos, resultando-lhes perfis funcionais.

 

O direito civil constitucional promove o encontro do direito com a justiça numa perspectiva ética e filosófica promovendo a leitura hermenêutica da Constituição, o que Dworkin afirmou ser também da moral.

 

Além dos civilistas, os constitucionalistas também se interessaram pelo fenômeno, refletindo sobre o impacto dessa inserção das relações civis no direito constitucional, ao ponto de J. J. Gomes Canotilho indagar se o processo não é inverso, ou seja, da civilização do direito constitucional.

 

A utilidade da filosofia do direito se mostra para reviver e construir adaptações do tempo decorrido através das decisões e, ainda, promover adequações necessárias mas sínteses conflitantes de conhecimentos, valores, símbolos produzidos e utilizados pelo homem dentro dos horizontes culturais e ideais que se renovam sempre de forma diacrônica e sincrônica, no norte e no sul do mundo na multiplicidade orgânica dos ordenamentos jurídicos.

 

Há, portanto, três superações do Direito Civil Constitucional brasileiro que destaco pontualmente:

 

- a superação do monismo das fontes de direito, pois não é somente a lei a única fonte do direito;

- a superação da rigidez literal da hermenêutica, da significação monolítica dos institutos e figuras jurídicas fundantes das relações sociais, como o contrato, a família e a propriedade.

 

O método de elastério dialético é assentado na crítica e na permanente construção dos sentidos atribuíveis ao campo jurídico.

 

Particularmente após o Código Civil Brasileiro de 2002 que só entrou em vigência em 2003 é idôneo e legítimo que sob o pensamento crítico sejam trazidos novos desafios e perspectivas.

 

Efetivando também a pedagogia dialógica para o ensino jurídico brasileiro incluindo além da reflexão objetiva a crítica aperfeiçoadora com reedificação da cidadania, e um sólido Estado Democrático de Direito.

 

As premissas do Direito Civil contemporâneo revitalizam seus principais institutos, o contrato, a propriedade, a família, a responsabilidade civil e até a empresa outorgando-lhes a função social, nas três dimensões( existência, validade e eficácia) emancipando o Direito numa tríplice constitucionalização (formal, material e prospectiva).

 

O desafio enfim é apreender a possibilidade de constitucionalização como ação contínua e permanente viabilizando na força criativa dos fatos sociais que se projetam para o Direito na doutrina, na legislação e na jurisprudência.

 

Construindo uma permanente e renovada resposta quando questionamos: para que serve e a quem serve o Direito?

 

Uma resposta para enfim encontrar uma sociedade mais justa, solidária e fundada na igualdade material na superação dos dogmatismos conceituais e da rigidez dos códigos e que consiga a efetiva tutela dos direitos fundamentais.

 

A Constitucionalização do Direito Civil Brasileiro tomou corpo principalmente a partir da última década do século XX, entre os juristas preocupados com a revitalização do direito civil e sua adequação aos valores constitucionais de 1988.

 

A insuficiência da codificação e a complexidade da vida contemporânea fizeram surgir diversos microssistemas jurídicos pluridisciplinares, como o direito do consumidor, o direito ambiental, os direitos da criança e dos adolescentes e do idoso.

 

Os trabalhos e pesquisas produzidas em diversos centro de estudos do país, notadamente nos programas de pós-graduação rapidamente repercutiram na jurisprudência dos tribunais, com resultados valiosos.

 

O distanciamento do direito civil e da codificação brasileira da realidade social demonstrou o anacronismo do Estado Liberal e o exacerbado individualismo e, ainda, a pertinência do Estado social fundado em constituições democráticas cuja característica principal é incorporar as relações privadas à índole dos valores constitucionais consagrados em 1988 na busca da justiça material.

 

De todos os ramos jurídicos são o direito civil e o direito constitucional os setores que mais dizem ao cotidiano da pessoa humana e de cada solidão.

 

É importante salientar que o fenômeno da constitucionalização dos direitos não se confunde com que no Brasil se denominou de publicização. Esta é entendida como supressão de matérias tradicionais do direito privado transladadas para o âmbito do direito público.

 

A vetusta dicotomia direito público e direito privado tem sido objeto de críticas que prognosticaram seu desaparecimento, mas permanece exercendo função prestante de classificação prática das matérias.

 

Não é a cogência da norma ou o maior grau de intervenção legislativa que torna pública uma relação, pois é justamente da natureza do Estado social essas características.

 

A falta ou substancial redução de autonomia, a exemplo do direito de família ou do direito do consumidor, não torna pública a relação entre privados que continua assim.

 

O critério do interesse também perdeu consistência, uma vez que há interesse público na regulação das relações privadas materialmente desiguais, quando uma das partes é considerada juridicamente vulnerável, o que no Estado Liberal era considerado domínio exclusivo do mercado ou da vida privada.

 

Portanto, é pública a relação jurídica na qual a desigualdade é predeterminada pelo necessário império do Estado de um lado, e da submissão do cidadão, no outro (direito financeiro, direito administrativo, direito penal, direito processual etc).

 

Mas é conveniente frisar que as relações entre familiares e seus parentes, entre contratantes, entre o proprietário e o alter, entre o causador do dano e sua vítima, entre herdeiros, enfim por mais constitucionalizadas que sejam, não perdem sua natureza estritamente civil.

 

Enfim, concluíram os civilistas que a elevação dos fundamentos do direito civil ao status constitucional foi uma deliberada escolha axiológica da sociedade, sendo indispensável para a consolidação do Estado democrático e Social de Direito e da consequente promoção da justiça social e da solidariedade.

 

É essencial a insuperável atuação do Estado para fazer prevalecer o interesse coletivo, e evitar os abusos e garantir o espaço público de afirmação da dignidade humana.

 

Nem mesmo o neoliberalismo e a globalização econômica que agitou o último quartel do século XX, abalou os alicerces do Estado Social, permanecendo cada vez mais forte a necessidade da ordem econômica e social, inclusive com o advento de direitos tutelares de novas dimensões da cidadania, a exemplo da legislação de proteção do consumidor.

 

Por essa razão, a Constituição, além de ser a norma hierarquicamente superior a todas as outras, determinante do sentido do ordenamento jurídico, absorveu de fato os valores que a sociedade conseguiu veicular para servir de fundamento ou base à organização social. Esses valores foram vertidos em princípios ou regras que colorem o direito como um todo.

 

É imprescindível observar que o direito civil e direito constitucional não pode convir uma cisão entre dois hemisférios normativos que estão inexoravelmente interligados, seja o Código Civil velho ou novo.

 

Cabe ao intérprete assegurar a compatibilidade de cada decisão, fundada em norma do Código Civil, com os princípios constitucionais, ainda que a estes não se refira expressamente. Cada interpretação é um microcosmo da imensa tarefa de realização de uma sociedade livre, justa e solidária.

 

Finalmente o Código Civil cumprirá sua vocação de pacificação social se for efetivamente iluminado pelos valores maiores projetados nas normas constitucionais, notadamente nos princípios.

 

Concluímos que a constitucionalização fez emergir o problema da dimensão normativa dos princípios no sentido contrário da tradição romano-germânica que se construiu na valorização da legalidade estrita.

 

A constitucionalização do direito civil trouxe a superação da tradição que tanto privilegiou a conduta hermenêutica simplificada da subsunção dos fatos à hipótese normativa, dentro de estrutura deôntica rígida.

 

Então, finalmente o Código Civil Brasileiro de 2002 rendeu-se aos princípios constitucionais compatibilizando-se com o Estado Social. E a irretorquível prova dessa mudança de paradigma foi a introdução principiológica do direito contratual que reconhecidamente é a parte que melhor exprime a liberdade e autonomia das pessoas, e, consequentemente, a mais refratária às considerações de interesses sociais.

 

O art. 421 do C.C. certamente é o mais relevante e que imprimiu ao contrato a função social, e não apenas a função autorreguladora dos interesses individuais dos contratantes e significou profundo redirecionamento da aplicação do direito civil.

 

Assim, apesar de garantida a liberdade contratual esta resta condicionada à realização da função social, que é um dos modos de concretização da justiça social e que deve permear toda atividade econômica (art. 170 da CF/1988).

 

É exatamente nesse contexto que surge a vinculação do direito civil contemporâneo, do constitucionalismo com as práticas das políticas públicas trazendo melhor avaliação qualitativa do momento econômico e o suporte para justificar o livre e pleno desenvolvimento da pessoa humana.

 

Muito obrigada a todos, em especial ao Dr. João Marcelo de Lima Assafim e toda equipe do Programa de Mestrado da UCAM.

domingo, 11 de novembro de 2012

O constitucionalismo do futuro

 

 

 

Saber qual movimento será o sucessor do neoconstitucionalismo implica em analisar as premissas básicas do atual constitucionalismo, sua institucionalização no direito positivo brasileiro e ainda suas aspirações mais ambiciosas apesar de profundamente carentes de realização.

 

O constitucionalismo ocidental vigente está muito próximo dos direitos e garantias fundamentais. Mais ganhou ênfase particularmente no pós-segunda guerra mundial e continuou a germinar mesmo durante a guerra fria e conflitos separatistas regionais, e ainda, diante do populismo latino-americano e do combate ao terror.

 

No campo político fortes influências foram atestadas como o globalismo ou globalização[1], o multiculturalismo e a maciça adesão dos blocos econômicos, a criação de tribunais internacionais de julgamento de crimes de guerra e contra a humanidade e atuação das Nações Unidas reforçaram o binômio constitucionalismo e garantias fundamentais.

 

No campo jurídico a Lei Fundamental de Bonn[2] então promulgada em 23 de maio de 1949 foi fundadora da República Federal da Alemanha[3], e constituiu um inovador paradigma quanto à noção de Estado Constitucional (onde se destacou a importância dada aos princípios e valores como elementares componentes dos sistemas jurídicos constitucionalizados); a utilização da ponderação como método interpretativo e de aplicação dos princípios e de resolução dos conflitos entre valores e bens constitucionais; a visão da Constituição como norma irradiadora de efeitos para todo o ordenamento jurídico, condicionando toda atividade (tanto a jurídica como a política) dos poderes do Estado e até mesmo as relações entre particulares na esfera privada; o protagonismo do juiz em relação ao legislador na missão de interpretar a Constituição e a aceitação de relativa conexão entre o Direito e a Moral.

 

Ainda no campo jurídico identifica-se a crise do positivismo e a volta dos elementos metajurídicos bem como a ênfase ao sentido jurídico atribuído às Constituições. Os principais pontos do constitucionalismo de cada etapa evolutiva que fizeram desabrochar um pretenso constitucionalismo do futuro que deve corrigir os excessos e pecadilhos do neoconstitucionalismo.

 

Lenio Luiz Streck com razão aponta essa crise do positivismo e questiona veementemente o fato de se conceber um direito imune às influências metajurídicas em sua análise hermenêutica conforme previa o positivismo clássico. Estaria o direito blindado às influências dessa revolução paradigmática[4]? Seria mesmo possível haver um direito isolado das transformações da filosofia da linguagem[5]?

 

Numa acepção liberal destacou Konrad Hesse que a Constituição jurídica vem condicionada pela realidade histórica. A partir da correlação entre o ser e o dever ser derivando as possibilidades e os limites da força normativa de uma Constituição. Acertadamente Daniel Sarmento aponta três críticas ao neoconstitucionalismo: a) a ter pendor justicialista e antidemocrático; b) a preferência por princípios e ponderação em substituição à subsunção; c) a de gerar uma panconstitucionalização[6] do Direito em detrimento da autonomia política do cidadão e da autonomia privada do indivíduo.

 

Numa força reativa contra os movimentos absolutistas do período medieval e como origem da concretização futura dos Estados Nacionais, surgiu o constitucionalismo em oposição à justificação divina e/ou imperativa do monarca, preocupado em impor limitação ao poder, mas também seus desdobramentos negativos como o autoritarismo e a censura.

 

Apesar das diversas fases pela qual o constitucionalismo passou sempre lhes foram características comuns, em maior ou menor grau de intensidade a limitação ao governo dos homens, a separação de funções e a garantia de direitos. Portanto, opôs-se ao governo arbitrário.

 

Joaquim José Gomes Canotilho defende um constitucionalismo uno, porém com diversos movimentos constitucionais em seu conteúdo: “Será preferível dizer que existem diversos movimentos constitucionais com corações nacionais, mas também com alguns elementos de aproximação entre si, fornecendo uma complexa tessitura histórico-cultural.” O Estado e o constitucionalismo lastreiam-se na garantia dos direitos fundamentais e na separação de poderes, compreendidos como identidade e rosto do Estado democrático de direito.

 

Logo na primeira fase, no constitucionalismo antigo, bem identificado Loewenstein entre os hebreus e nas Cidades-Estado gregas. E numa forma mais segura apesar de em moldes primários, o constitucionalismo ganhou notável força na Idade Média, com a Magna Carta de 1215 com a Petition of rights, de 1638, o Habeas Corpus Acta, de 1679 e o Bill of Rights[7], de 1689.

 

Mais tarde, com o constitucionalismo clássico ou liberal que se iniciou com a Constituição dos EUA em 1787[8] e com a Constituição francesa de 1791 (que vigeu apenas dois anos) e teve como preâmbulo a Declaração Universal dos Direitos dos Homens e do Cidadão[9], de 1789. Inaugurou-se a característica da rigidez constitucional, onde se defende a supremacia formal da Constituição, o que gera consequentemente o controle de constitucionalidade surgido em 1803, pela via difusa, no famosíssimo caso Marbury versus Marshall.

 

Juntamente com a tão propalada ideia de supremacia constitucional veio a atribuição ao Judiciário da missão de assegurá-la. É exatamente no constitucionalismo liberal que surge a primeira dimensão dos direitos fundamentais (valor igualdade[10]), feita no Brasil por Paulo Bonavides.

 

No pós-primeira grande guerra inicia-se a etapa menor, porém não sem importância, do movimento constitucionalista, é o constitucionalismo moderno ou social. Fruto do idealismo burguês, de caráter não intervencionista e exclusivista se revelou improfícuo em face das demandas sociais do período, o que levou à bancarrota o Estado Gendarme[11] e o constitucionalismo liberal, identificando-se a necessidade de uma onipresença estatal na vida cotidiana.

 

Nesse contexto existia uma Europa estava devastada por um primeiro conflito de caráter mundial, havia feridas abertas e não cicatrizadas embalsamadas pela paz aparente do Tratado de Versalhes, e o socialismo já soprava do vento leste. Nesse período histórico surge o positivismo jurídico em substituição ao jusnaturalismo do período anterior, divorciando direito e moral. Ademais é durante o constitucionalismo social que advém a segunda dimensão de direitos fundamentais, predominantemente individual ligada à igualdade, bem como as chamadas garantias institucionais.

 

Porém o constitucionalismo moderno pouco durou (indo do final da década de trinta ao primeiro lustro dos anos de 1940), quando se deu a ascensão das ditaduras democráticas, nazifascistas e mergulhou o mundo numa segunda grande guerra mundial. Onde se deparou com a lei que pode apenas servir de instrumento para ofender e violar a dignidade humana e transpor todos os limites civilizados de exercício de poder instituído.

 

Ao final do constitucionalismo moderno, veio então o constitucionalismo contemporâneo ou neoconstitucionalismo (ou ainda chamado de pós-positivismo[12]) que perdura até hoje.

 

É exatamente aqui que o discurso começa a ser no sentido de superar a dicotomia entre o direito natural e o direito positivo, equacionando os valores “justiça” e “segurança jurídica”, quando surge a terceira dimensão de direitos fundamentais ligada à fraternidade (predominantemente coletiva) e o Estado Democrático de Direito.

 

Sobre o neoconstitucionalismo há muita influência da normatividade da Constituição cujo expoente maior é Konrad Hesse[13] explicando através da normatividade, subtrai-se o viés preeminentemente político de um texto supremo para atribuir-lhe sentido jurídico confirmando a tendência já iniciada já no constitucionalismo clássico.

 

Com isso, solidifica-se a ideia de superioridade constitucional[14], a ideia de constitucionalização do direito, a eficácia horizontal dos direitos fundamentais, o fortalecimento do Poder Judiciário (cogita-se em judicialização da política).

 

Neste período, é nítida a influência das Constituições Mexicana, de 1917, e da República de Weimar[15], de 1919, bem como a ameaça da bem sucedida Revolução Bolchevique, de 1919, o que fez direitos sociais passassem a ser previstos nos textos constitucionais ocidentais muito mais por termos à “cortina de ferro”, que por benevolência propriamente dita.

 

O constitucionalismo do futuro consiste numa projeção do que haveria depois do neoconstitucionalismo, e segundo José Roberto Dromi[16], jurista argentino, que prevê um equilíbrio entre os atributos do constitucionalismo moderno e os excessos do neoconstitucionalismo.

 

Para Dromi, as Constituições do futuro teriam sete valores fundamentais supremos: verdade, solidariedade, consenso, continuidade, participação da sociedade na política, integração, universalização dos direitos fundamentais para todos os povos do mundo.

 

Pedro Lenza aponta que o constitucionalismo do futuro virá consolidar os chamados direitos humanos de terceira dimensão, incorporando à ideia de constitucionalismo social os valores de fraternidade e solidariedade[17], avançando e estabelecendo o equilíbrio entre o constitucionalismo moderno e alguns excesso do contemporâneo (...). A constituição não pode mais gerar falsas expectativas.

 

O constituinte só poderá prometer o que for viável de cumprir, devendo ser transparente e ético, a solidariedade revela-se em ser a nova perspectiva de igualdade, sedimentando entre os povos, na dignidade da pessoa humana e na justiça social; a constituição do futuro deverá ser fruto do consenso democrático, ao se reformar a constituição, a ruptura não pode deixar de considerar os avanços conquistados; deverá incentivar a efetiva participação dos corpos intermediários da sociedade, firmando a ideia de democracia participativa e de Estado Democrático de Direito[18].

 

A integração espiritual, moral, ética e institucional entre os povos proposta pelos órgãos supranacionais, a tendência da universalização refere-se à consagração dos direitos fundamentais internacionais nas constituições futuras, fazendo prevalecer o princípio da dignidade da pessoa humana de maneira universal e afastando, assim, qualquer forma de desumanização.

 

A preocupação com a verdade se impõe na medida da Constituição exibir promessas factíveis pelo Constituinte. De nada adianta extenso protecionismo, mas destituído de razoável exequibilidade. O texto constitucional não pode ser mera carta de intensões, sem fundamento ou cientificidade.

 

Em suma, cada Estado tem a Constituição que pode ter, isto é, respeitadas regras mínimas e suficientes de previsão de direitos fundamentais, em todas as suas subespécies (direitos individuais, direitos sociais, direitos políticos, etc.) ficaria o constituinte impedido de enganar o povo.

 

Esposando entendimento diferente, André Ramos Tavares aduz que a verdade significa o constitucionalismo da verdade, onde existem duas categorias de normas a serem analisadas. Uma parcela, que é constituída de normas que jamais possam ser programáticas e são praticamente inalcançáveis pela maioria dos Estados; e outra sorte de normas que não são implementadas por simples falta de motivação política dos administradores e governantes responsáveis (é a chamada falta de vontade política).

 

As primeiras normas deveriam ser erradicadas dos textos constitucionais, podendo, no máximo, figurar como objetivos a serem alcançados em longo prazo, e não como declarações de realidades[19] utópicas, como se bastasse a mera declaração jurídica para transformar-se o ferro em ouro.

 

As segundas normas precisam ser cobradas do Poder Público com maior força, o que envolve, em muitos casos, a participação da sociedade na gestão das políticas e verbas públicas, e a atuação de organismos de controle e cobrança, como o Ministério Público, na preservação da ordem jurídica e consecução do interesse público vertido nas cláusulas constitucionais.

 

Opondo-se diametralmente se posiciona Andreas Joachim Krell[20] que explica: “Segundo o Tribunal Constitucional Federal de Alemanha, esses direitos a prestações positivas (Teilhaberechte) estão sujeitos à reserva do possível no sentido daquilo que o indivíduo, de maneira racional[21], pode esperar a sociedade”. Essa teoria impossibilita exigências acima de certo limite básico social; a Corte recusou a tese de que o Estado seria obrigado a criar quantidade suficiente de vagas nas universidades públicas para tender a todos candidatos (...) Desta forma, o condicionamento da realização de direitos econômicos, sociais e culturais à existência de caixas cheios do Estado significa reduzir a sua eficácia sua zero; a subordinação aos condicionantes econômicos relativiza sua universalidade, condenando-os a serem considerados direitos de segunda categoria.” “Num país com um dos piores quadros de distribuição de renda do mundo, o conceito da redistribuição (Umverteilung) de recursos ganha uma dimensão completamente diferente”.

 

Quanto ao valor solidariedade sendo valor elencado por Dromi extrai-se triplo significado, a saber: a) o de solidariedade entre os povos; segundo, o de necessidade de implementação expressa desta dimensão fraternitária de direitos fundamentais nas Constituições ocidentais afora, algo que poucos textos fazem explicitamente.

 

A Constituição brasileira[22] vigente não consagra diretamente o princípio da solidariedade, porém aponta em seu art. 3º “construir uma sociedade livre, justa e solidária” e também é mais direta quando os valores referentes à igualdade e a liberdade promovidas à categoria fundamental de direitos.

 

Noutro enfoque, a solidariedade pode ser vista como um clamor aos tempos, de cooperação e tolerância, bem como a redução das desigualdades étnicas, religiosas, raciais e regionais, almejando uma sociedade independente de ideologia, regida e guiada pela mesma bússola: - a Constituição.

 

Desta forma, as constituições deixariam o equalizador de igualdade entre diferentes filosofias e muita preocupadas com as minorias.

 

Com relação ao consenso que reserva grande vinculação com a solidariedade e atua na elaboração de leis, decretos e principalmente das constituições. O consenso é operacional posto que a diversidade de argumentos e ideologias faz surgir a impossibilidade de decisão unânime. É uma consequência do pluralismo político, e o consenso se revela na capacidade de fazer valer aquilo que um grupo, não necessariamente uma maioria decidiu, sem que haja grandes rupturas neste processo decisório.

 

Frise-se que consenso[23] não significa maioria e, pressupõe a manutenção da ordem democrática, com a adesão solidária da parte que consentiu, em prol de um interesse maior.

 

A continuidade deve ser analisada em dois aspectos distintos: na necessidade de uma constituição respeitar a história de seu país. Principalmente por ser a constituição o estatuto vigente da nação, mas não implica no surgimento desta, salvo se na condição de Constituições históricas[24].

 

A Magna Carta é capaz de definir as múltiplas diretrizes para o povo que tutela, mas respeitando sua história, dando unidade e prosperidade pelas lutas já creditadas, representa pois a continuidade de um ciclo evolutivo de um país, E, também pode a continuidade ser entendida como a escala de desenvolvimento de um povo. De sorte, que não parte a constituição de uma folha em branco, mas dos direitos já consagrados hoje, buscando sempre aperfeiçoá-los.

 

Deve-se enfim privilegiar a continuidade, vez que qualquer ruptura profunda a um ordenamento, ou a excessiva alteração a uma Constituição, pode constituir alto pernicioso, violador desta característica. Obviamente é perigoso conceber constituições que produzam uma ruptura da lógica dos antecedentes, uma descontinuidade com todo o sistema precedente.

 

A integração consiste na comunhão entre os povos, por meio de políticas e órgãos transnacionais. Promovendo-se o encurtamento entre as distâncias provocadas pelo desenvolvimento das telecomunicações e dos meios de transporte, bem como do respeito para com o estrangeiro em prol da reciprocidade, tal característica representa o rompimento dos feudos, a que resumiram alguns povos nos últimos tempos, para disponibilizá-los outros pontos de vista, desde que respeitada sua identidade e cultura embrionária.

 

A derradeira característica é a universalização dos direitos fundamentais para todos os povos do mundo. Seria a busca de fórmula fundamental com a dignidade da pessoa humana como denominador comum que pudesse ser aplicada em qualquer parte do mundo, seja em país desenvolvido ou subdesenvolvido.

 

As sete características fundamentais do constitucionalismo do futuro espera-se que não seja utópico, ou seria mera repetição dos institutos já outrora desenvolvidos nas outras etapas do constitucionalismo.

 

A mais saudável opinião é a que entende que não existe um constitucionalismo[25] do futuro. Sobre a verdade é fato que se mostra como medida salutar e não apenas assumida pelo constituinte, de compromissos desprovidos de concretude.

 

Superada a inicial euforia da reabertura política e da incipiente democracia brasileira, quando a concepção Welfare-state ecoou incondicionadamente pela doutrina constitucional, cogita-se que as funções estatais começaram a frear quanto à possibilidade de atingimento irrestrito de pessoas.

 

Já é farto o registro jurisprudencial assinalando a incapacidade do Estado em atender plenamente a todas as necessidades assumidas constitucionalmente. Há questões envolvendo internações hospitalares, o abarrotamento do sistema prisional, o fornecimento de medicamentos e a busca de critérios pelo STF mediante a utilização de audiências públicas. Então é verdade que o Estado não é onipresente o bastante como um dia pensou o bem-social social.

 

No que se refere à solidariedade e à integração entre os povos, tais características talvez pudessem melhor servir como norte para espaços ideologicamente delimitados pelo ódio entre extremistas e conservadores mais radicais (entre os xiitas e sunitas, entre israelenses e palestinos, indianos e paquistaneses e, etc.). A miscigenada identidade brasileira não se revela perfeita, porém não chega a ser um problema em nível de beligerância ou de guerra civil interna.

 

Sobre a integração, cabe sublinhar que já se adota uma política diplomática do diálogo, que permite à Nação negociar, ao mesmo tempo em que permite um relacionamento pacífico com os vizinhos latino-americanos, bem como ocupar a posição de destaque e liderança no Mercosul.

 

O que confirma que a solidariedade num país como o Brasil, jamais poderia ser dispensada, obviamente, mas que não constitui extrema urgência sua explícita previsão no ordenamento pátrio como necessidade de diminuir discrepância.

 

Quanto ao consenso, sabe-se que as constituições ocidentais deixaram de ser sinônimo da aprovação da maioria. E vieram representar a transição do viés político peculiar do pós-guerra. Até porque perpetuaria a maioria no poder, no esmagamento das minorias, e o impedimento de ascensão destas últimas a um nível de maior influência na tomada de decisões político-administrativas pátrias.

 

Atualmente, uma Constituição pode representar tanto uma vontade da maioria, como uma vontade da minoria, assim como pode vetar tanto a maioria como a minoria. Conclui-se que o consenso é uma premissa do futuro, se este pressuposto está em plena e atual aplicabilidade.

 

Quanto à continuidade, reconhece-se que as sucessivas alterações constitucionais não são hábeis a traduzir a tranquilidade da tutela constitucional. E, mesmo apesar da pretensa rigidez constitucional, da exigência de quórum qualificado para emenda constitucional, já contamos com setenta emendas constitucionais (sendo a última aprovada em 30.03.2012).

 

Não que algumas dessas emendas não fossem necessárias, mas produz fatidicamente a diluição paulatina do Poder Constituinte originário, retirando-se igualmente a identidade inicialmente atribuída por uma constituição do país.

 

Também não é o caso de se defender cegamente o interpretativismo originalista, ou a estrutura original da constituição[26], mas ainda cotejando a continuidade que denota a necessária ampliação contínua de direitos e garantias fundamentais, sobretudo os sociais, com o mínimo possível de involuções e retrocessos, também já encontra implementada no constitucionalismo atual, na forma da proibição do retrocesso.

 

J.J. Gomes Canotilho afirma: “Os direitos econômicos, sociais, culturais, garantidos por normas de escalão constitucional, dispõem de vinculatividade normativa geral. (...)” Implicam, genericamente na proibição do retrocesso social, querendo assim proteger as já consagradas prestações sociais, o legislador não pode depois eliminá-las sem alternativas ou compensações.

 

No referente à participação da sociedade na vida política, no Brasil observa-se o assento eclético no Conselho Nacional de Justiça principalmente com a EC 45/2004, de instrumentos de vontade popular como plebiscito, o referendo e a iniciativa popular (art. 14, I, II e III da CF/1988), além dos writs como mandado de segurança, mandado de injunção, o habeas data e a ação popular.

 

A derradeira premissa apontada por Dromi, a universalização dos direitos fundamentais para todos os povos do mundo, o jurista argentino enfocou particularmente as constituições ocidentais e não do mundo todo, dividindo temerariamente o mundo por mero meridiano, e resguardando as características do constitucionalismo exclusivamente ao oeste.

 

Convém salientar que também nos países do common law e mesmo do civil law franco-romano-germânico houve nítida evolução do constitucionalismo[27]. Mas é óbvia a impossibilidade de se adotar uma constituição mundial eivada de completude essencial, bem como infinita gama de direitos fundamentais e dotada de inviável aplicabilidade.

 

Os direitos fundamentais em sua essência como podem ser resguardados diante da China poluidora, da Coréia do Norte que não respeita o direito de expressão, a Cuba que não respeita o direito de ir e vir, a explícita poligamia árabe e as mais variadas penas de morte. E, ainda, como defendê-los diante da ainda praticante inferiorização da mulher, das crianças renegadas a mera condição de objeto. Como restaria incólume o princípio da igualdade?[28]

 

Conclui-se então que um único modelo constitucional sob o espectro da universalização dos direitos fundamentais parece ser utópico e distante posto que inaplicável.

 

Sem dúvida o constitucionalismo possui relevância dentro do processo civilizatório, principalmente ao cumprir sua missão de limitar o poder do monarca, para edificar a separação das funções estatais, bem como para assegurar a previsão e, sobretudo construir a concretude de direitos. Sendo assim, pode se cogitar num constitucionalismo uno, cujas camadas evolutivas foram sobrepujando-se uma às outras, até o momento atual, o neoconstitucional.

 

Referências

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LAZARI, Rafael José Nadim de. Reflexões críticas sobre a viabilidade de um “constitucionalismo do futuro” no Brasil: exegese valorativa. Revista de Direitos Fundamentais e Democracia. Curitiba, v.9, n.9, p.91-112, jan/jun. 2011.

MAULAZ, Ralph Batista de. Os paradigmas do Estado de Direito. O Estado Liberal, o Estado Social (socialista) e o Estado Democrático de Direito. Jus Navigandi, Teresina, ano 15, n. 2628, 11 set.2010. Disponível em: http://jus.com.br/revista/texto/17368. Acesso em: 10 nov. 2012.

CANOTILHO, José Joaquim; ORIONE, Marcus Gonçalves; CORREIA, Érica Paula Barcha. Direitos Fundamentais Sociais. São Paulo: Editora Saraiva, 2010.

CANOTILHO, José Joaquim. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. Lisboa: Editora Almedina, 2006.

LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. – 15 ed. – São Paulo: Saraiva, 2011.

MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. – 19 ed. – São Paulo: Atlas, 2006.

STRECK, Lenio Luiz. O que é isto – decido conforme minha consciência? 4ª. ed. São Paulo: Livraria do Advogado, 2012.

TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional. – 3 ed. – São Paulo: Saraiva, 2006.


[1] A globalização resvala em ser o mesmo velho imperialismo que existe desde os romanos. E, o imperialismo colonizou, matou, trucidou e agenciou genocídios de indígenas, negros e demais colonizados, e atualmente mata dotado de novas armas. O selvagem de antes é hoje o excluído social. O liberalismo reeditou sobre os mais frágeis, principalmente os mais fracos economicamente, que se se tornaram neoescravos, sem direitos e sem razões que a razão do mais forte não possa comprar, leiloar seguindo a percentagem de lucro que melhor lhe aprouver.

[2] A elaboração da Carta Magna alemã foi autorizada pelos três Aliados ocidentais nos chamados "Documentos de Frankfurt", em julho de 1948. Esta Assembleia Constituinte, batizada de Conselho Parlamentar, foi formada por 65 representantes de assembleias estaduais da Alemanha Ocidental e cinco observadores enviados por Berlim. O conselho foi presidido por Konrad Adenauer, da União Democrata Cristã, que ainda em 1949 seria eleito primeiro chefe de governo alemão ocidental pós-guerra. A tarefa da Assembleia Constituinte era redigir uma Lei Fundamental com poderes de Constituição, mas que não tivesse caráter definitivo, para não ameaçar a almejada unificação alemã. Depois da Segunda Guerra Mundial, a Alemanha havia sido dividida em duas, ocupadas por soviéticos e Aliados ocidentais. Em agosto de 1948, uma conferência havia definido as linhas gerais da Grundgesetz, prevendo os três poderes: Legislativo, Executivo e Judiciário. A tarefa dos parlamentares foi complementá-la com mecanismos que definissem todos os direitos civis e criassem os fundamentos jurídicos do país.

[3] Vital Moreira, professor da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, destaca a importância das cartas magnas alemãs no contexto internacional: "Já a Constituição de Weimar, de 1919, serviu de modelo para as constituições entre as duas guerras. A esta se deve a constitucionalização dos direitos sociais e da economia".

A Constituição de Weimar pela primeira vez ensaiara um compromisso no sistema de governo parlamentar, com um presidente da República eleito diretamente, dotado de importantes poderes institucionais próprios. Mas algumas das suas soluções acabaram por favorecer a instabilidade política da República de Weimar e, mais tarde, a tomada do poder por Hitler.

[4] A dimensão pragmática revela-se como dimensão transcendental-hermenêutica do acordo mútuo e intersubjetivo quanto ao sentido, e compõe, com a dimensão do pré-entendimento semântico mediatizador das coisas (ou melhor, do mundo) - que se encontra acobertado pelo conceito designativo da linguagem, uma unidade dialética.

[5] De forma aguçada, poder-se-ia dizer que a “filosofia primeira ” não é mais a investigação da " natureza " ou " da essência " das " coisas" ou dos " entes " (ontologia), nem tampouco a reflexão sobre as noções ou conceitos da consciência ou da razão (epistemologia), mas sim a reflexão sobre o significado ou o sentido de manifestações linguísticas (análise da linguagem).Portanto, não se trata apenas de filosofia teórica mas também a filosofia prática - a ética como metaética, por exemplo, precisa mediatizar metodicamente por uma análise filosófica do uso da linguagem, e assim, pela própria filosofia da linguagem.

[6] A Constituição não forma apenas a expressão de um ser, mas também de um dever ser. Graças ao objetivo de eficácia, a Constituição procura colocar ordem e adaptação à realidade política e social.

[7] Sendo pactos voltados à proteção de direitos individuais, bem como os Forais ou Cartas de Franquia, que se diferenciavam dos pactos por admitir que os súditos participassem no governo local.·.

[8] Tiveram os EUA a primazia da primeira Constituição escrita e solenemente ratificada, dotada de conteúdo sintético composto de sete artigos, aos quais se somaram as dez emendas conhecidas como Bill of Rights, aprovadas em 1791, tendo sido o ponto de partida de uma longa trajetória de sucesso institucional, fundada na efetiva separação dos poderes e num modelo triplamente original: republicano, federativo e presidencialista.

[9] Na dicção do art. 16, da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789, segundo a qual toute societé dans laquelle la garantie des droits n’est pas assurée, ni la séparation des pouvoirs determinée n’a point de constitution . (qualquer sociedade na qual a garantia dos direitos não é assegurada, nem a separação dos poderes determinada, não tem constituição).

[10] Se a liberdade (especialmente a individual) marcou o primeiro momento histórico moderno da conquista dos direitos fundamentais (dominando a própria concepção dos direitos de primeira dimensão) e a igualdade jurídica fecundou a segunda etapa (direitos de segunda dimensão), coube ao terceiro mote da trilogia revolucionária setecentista, refeito e rebatizado, assinalar a conquista dos direitos denominados de "terceira dimensão": a solidariedade social juridicamente concebida e exigida colore o constitucionalismo e tinge com novas tintas o princípio da dignidade humana. Agora, não mais apenas entre o homem e o Estado, ou entre o homem e o outro, mas, principalmente, o homem com o outro. Como direitos fundamentais da solidariedade social constitucionalmente positivada foram reconhecidos o direito ao desenvolvimento, à paz, ao meio ambiente saudável, à informação e comunicação e ao patrimônio comum da humanidade.

[11] A palavra "gendarmaria" tem origem no termo francês "gendarmerie", o qual deriva do termo "gendarme". Por sua vez, "gendarme" tem origem no francês antigo "gens d'armes", significando "homens de armas". Historicamente, o termo "homem de armas" referia-se a um cavaleiro dotado de armadura pesada, normalmente de origem nobre, que servia nos exércitos europeus da Idade Média. O termo ganhou conotações policiais no âmbito da Revolução Francesa, altura em que a anterior Maréchaussée (literalmente "marechalato") do Antigo Regime foi reorganizada e redesignada "Gendarmerie". O conceito e a criação de uma gendarmaria nacional surgiram assim, na Revolução Francesa, em consequência da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, na qual se prescrevia que a segurança era um dos direitos "naturais e imprescindíveis" e que, para preservá-la, era necessária a constituição de uma força pública, em benefício de todos. A criação da gendarmaria francesa inspirou e serviu de modelo para a criação de instituições semelhantes em outros países, como foram os casos da Guarda Real da Polícia de Portugal (1801), da Marechaussee dos Países Baixos (1814), dos Carabinieri do Reino da Sardenha (1814), da Zhandarmov do Império Russo (1836), da Guardia Civil da Espanha (1844) e da Gendarmerie do Império Austro-Húngaro (1848).

[12] De certa forma, o pós-positivismo se apresenta como terceira via entre as concepções positivistas e jusnaturalistas. E, não concebe o Direito desvinculado da filosofia moral e da filosofia política. Contestando a separação entre o direito, moral e política, não chega negar a especificidade do objeto de cada um desses domínios, mas para reconhecer a impossibilidade de trata-los como espaços totalmente segmentados, que não se influenciam mutuamente.

[13] O debate acerca da força normativa da Constituição só chegou à América Latina, de maneira consistente, ao longo da década de 80, tendo enfrentado as resistências previsíveis, segundo Luís Roberto Barroso.

[14] Segundo José Afonso da Silva, é da rigidez que resulta a supremacia da Constituição. A rigidez também se relaciona com o fato de normas constitucionais serem mais estáveis e de duração mais longa, em contraposição com normas inferiores que podem ser mudadas mais frequente e rapidamente. E daí se conclui o porquê dela se posicionar no vértice da pirâmide do ordenamento jurídico. Outro aspecto da supremacia da constituição é traduzido em uma superlegalidade formal e material. Como superlegalidade formal, entende-se a Constituição como criadora das outras normas. A superlegalidade material faz a relação entre as normas e a Constituição, observando se as normas estão de acordo com a Constituição. Esses aspectos garantem o chamado controle de constitucionalidade, que tem como origem o direito norte-americano. Esse controle garante que normas inferiores as constitucionais não podem ir contra a elas, pois se não, são consideradas nulas. “Toda lei contrastante com a constituição é nula”-John Marshall.

[15] A Constituição de Weimar - 1919, (a qual influenciou a Constituição Brasileira de 1934).

[16] José Roberto Dromi é advogado argentino especializado em direito administrativo e político. Atuou como Ministro das obras Públicas e Serviços da Argentina, durante a presidência de Carlos Menem( 1989-1991).

[17] Cogita-se também conforme salienta André Ramos Tavares, de uma fase atual de constitucionalismo globalizado, onde se busca difundia o ideal de proteção aos direitos humanos em nível mundial. Com grande ênfase aos chamados direitos de terceira dimensão ou geração, como fraternidade e solidariedade. Assim incentiva a autodeterminação dos povos, o desenvolvimento sustentável, a preservação do meio ambiente o aumento da qualidade de vida e, por fim, o reconhecimento e boa gestão do patrimônio cultural, histórico e artístico.

[18] Sem dúvida, a Constituição de 1988 inaugurou nova e importante fase do constitucionalismo e não apenas mais uma fase, mas principalmente por não encontrar paralelo no quadro anterior na experiência social e política. Conforme bem acentuou o saudoso Ulysses Guimarães, diferentemente das sete Constituições anteriores, começa com o homem. Graficamente testemunha a primazia do homem, que foi escrita para o homem, que homem é seu fim e sua esperança. É a Constituição Cidadã... O homem é o problema da sociedade brasileira: sem salário, analfabeto, sem casa, portanto sem cidadania.

[19] “Constituição real” e “Constituição jurídica” condicionam-se mutuamente, mas não dependem simplesmente uma da outra. A Constituição adquire força normativa conforme realiza sua pretensão de eficácia. Nesse contexto cabe analisar as possibilidades e limites de sua realização.

[20] É graduado em Ciências Jurídicas (Rechtswissenschaften) pela Freie Universität de Berlim (Alemanha - 1986), onde obteve também o seu título de Doutor em Direito (Doctor Juris - 1993). Atualmente é Professor Associado concursado de Direito Ambiental e Constitucional da Universidade Federal de Alagoas (UFAL, Maceió - desde 1995), onde leciona nos Cursos de Graduação e Mestrado em Direito; foi o primeiro Coordenador do Curso de Mestrado em Direito da UFAL (2004/06); em 2006, foi eleito Diretor da Faculdade de Direito da UFAL e reeleito em 2009. Desde 1996, é professor colaborador permanente do Programa de Pós-Graduação em Direito (Mestrado/Doutorado) da Faculdade de Direito do Recife (UFPE). Possui várias publicações (livros, capítulos, artigos) nas áreas temáticas do Direito Ambiental e Urbanístico, dos Direitos Fundamentais (sociais) e do Direito Constitucional (competências federativas) e Administrativo (discricionariedade, cooperação intergovernamental). Foi orientador de cerca de 70 dissertações de Mestrado e teses de Doutorado e ministrou aulas de pós-graduação e palestras em várias Instituições de Ensino Superior do Brasil. É pesquisador bolsista do CNPq (PQ - nível 1C) e representante da área do Direito (2010/13); além disso, consultor da CAPES, onde faz parte do Comitê de Avaliação na área do Direito. (Vide in: http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/visualizacv.do?metodo=apresentar&id=K4761514H6 )

[21] A racionalização do poder, ou seja, a tendência de incorporar nas novas Constituições elucubrações jurídicas prolongou de certo modo o constitucionalismo. De fato, a ideia de racionalizar a vida política já estava presente neste movimento, embora mais atenuada. Da mesma forma a pretensão de enquadrar pela lei inteiramente a vida política, que se desvenda pela racionalização, não passa de um exagero do desejo inerente ao constitucionalismo de se fixar por meio de regras escritas os lineamentos fundamentais da existência política.

[22] Destaca-se o Constitucionalismo Liberal, que exaltava valores como individualismo, absenteísmo estatal, valorização da propriedade privada e proteção ao indivíduo (tais valores muito influenciaram as constituições brasileiras de 1824 e 1891).··.

[23] Conceitualmente, um paradigma pode ser entendido como "consenso científico enraizado quanto às teorias, modelos e métodos de compreensão do mundo” Vide in MAULAZ, Ralph Batista. Os paradigmas do Estado de Direito. Jus Navigandi, Teresina, ano 15, n. 2628, 11 set.2010.Disponível em: http://jus.com.br/revista/texto/17368/os-paradigmas-do-estado-de-direito#ixzz2BsJiWu1j

[24] Apesar de reconhecer o significado dos fatores históricos, políticos e sociais para a força normativa da Constituição, Hesse enfatiza o aspecto da vontade de Constituição. A Constituição transforma-se em força ativa se existir a disposição de orientar a própria conduta segundo a ordem nela estabelecida, se estiverem presentes, na consciência geral (especialmente na consciência dos principais responsáveis pela ordem constitucional), não só a vontade de poder, mas também a vontade de Constituição.

[25] Interessante lembrar a influência de alguns pensadores como Thomas Hobbes que escreveu “Leviatã” (assegurar a paz); John Locke que escreveu o “Tratado do Governo Civil (que trata dos direitos naturais); e, ainda, Jean-Jacques Rousseau que escreveu o “Contrato Social” (bem às vésperas da Revolução Francesa e que também tratava sobre os direitos naturais e a representação do povo pelos representantes do Estado). A necessidade de limitação do poder preconizada Montesquieu ( “Do Espírito das Leis”) através da separação dos poderes.

[26] O modelo constitucional norte-americano nesses últimos cinquenta anos, irradiou-se pelo mundo e tornou-se vitorioso em países da Europa, da América Latina, da Ásia e da África. Apesar de que em seu plano doméstico, nunca fora tão intensamente questionado. A esquerda critica a supremacia judicial e defende um constitucionalismo mais popular. A direito, em seu lastro conservador, defende mas nem sempre pratica a autocontenção judicial.

[27] Podemos sintetizar a evolução do constitucionalismo e suas dimensões, a saber: a primeira dimensão: clássico (liberal/individualista); a segunda dimensão: moderno (social/intervencionista); a terceira dimensão: global ou contemporâneo (direito comunitário/globalização).

[28] Colômbia, Cuba, Haiti e Venezuela desrespeitam os direitos humanos. Vide: http://g1.globo.com/Noticias/Mundo/0,,MUL15912-5602,00-COLOMBIA+CUBA+HAITI+E+VENEZUELA+DESRESPEITAM+DIREITOS+HUMANOS.html