Considerações
sobre o processo de conhecimento e o CPC/2015.
As bases para novo conceito de processo na
sistemática brasileira são inauguradas com o CPC/2015 que enxerga o processo
como um procedimento em contraditório e, se preocupa com a efetiva prestação
jurisdicional ofertada em tempo razoável e com respeito aos direitos
fundamentais, principalmente o acesso à justiça.
O que plenamente justifica a
atualização evolutiva do direito processual brasileiro que abandona a doutrina
de Büllow e adota francamente Élio Fazzallari. Com ênfase à primazia do
julgamento do mérito e que busca efetivamente sair da cultura do julgamento
para seguir a cultura da resolução do conflito, seja pelos meios
autocompositivos ou por meios judiciosos. Mas, jamais dissociados do respeito
ao princípio da boa-fé objetiva e ao princípio da cooperação presente no art.
6º do CPC/2015.
Em face do caráter geral e
abstrato do conceito de relação jurídica, o que vem a neutralizar o conceito
real de relação em vida, não escapando a teoria de Büllow de um cientificismo
neutro e bem peculiar da pandectística.
É verdade que a teoria de
Büllow fora capaz de demonstrar a dinâmica que envolve o demandante quando
busca a tutela jurisdicional, mas encobriu as reais intenções do Estado que
guarda o monopólio da jurisdição ou de quem exerce o poder, além de ignorar as
necessidades das partes entendidas nas situações de direito material e as
diferentes realidades dos casos concretos.
A pretensa neutralidade do
conceito de relação jurídica camuflou a realidade concreta, apesar de que
contribuiu para a formação da ciência processual que nasceu inicialmente imersa
em si mesma e longe da realidade material da vida.
Wassermann[1] doutrinador alemão
contemporâneo aludiu a respeito do conceitualismo pertinente ao processo civil
do Estado Liberal Clássico que fora traçado pelo nível de abstração, sendo a
principal marca de enraizamento ZPO no pensamento burguês e liberal.
Afinal tanto o conceitualismo
quanto a alta abstração foram típicos do direito civil da época e que
contaminou todo o ZPO, considerado o baluarte do formalismo processual.
A lógica do BGB (Código Civil Alemão) e suas principais referências o cunharam de extrema formalidade e isolado das referências sociais e, passando para o ZPO tais características acenando que toda a criação jurídica deve ser abstrata, se abstraindo e se distanciando completamente da realidade.
O postulado da igualdade era
formal, existindo somente perante a lei e raramente era debatido, sendo
identificado em matérias relacionadas à assistência judiciária gratuita
destinada aos pobres e indigentes.
Naquele tempo para o direito
processual a parte existente era somente a constante no rol processual. No
esquema da relação jurídica processual, a figura central era a jurisdição (daí
o porquê ser também chamado de direito jurisdicional) e do desprezar a
realidade concreta dos seus sujeitos, pôde-se acolher qualquer forma de
exercício de poder.
Lembremos que nenhum Estado é
neutro e tem fins e projetos orquestrados segundo seus valores. Porém, tal
obviedade era ignorada pelo conceito pandectístico da relação jurídica
processual.
Em verdade, a cientificidade
do conceito de relação jurídica processual, escondia a verdadeira face da parte
e, ignorava a realidade social. Sendo impossível cogitar na legitimidade da
jurisdição com base apenas na efetividade de participação das partes na
formação da decisão.
A legitimidade do poder relaciona-se com a efetividade da participação das partes e, ainda, na consideração dos aspectos sociais que são relevantes para materializar o acesso à justiça e garantir o acesso à ordem jurídica justa.
A crítica ao conceito de relação jurídica processual dirigiu-se à sua neutralidade descompromissada com a realidade da vida do homem, trata-se de uma crítica ideológico-cultural.
O processo contemporâneo vai
além da relação que envolve juiz e as partes. E, está compromissado com os
valores do Estado Constitucional. O processo é instrumento[2] por meio do qual Estado
cumpre seu dever de dar tutela aos direitos, devendo ser focalizado por
diversos ângulos que são imprescindíveis a concretização de um processo
adequado.
Contudo, a participação das
partes no procedimento embora relevante, sozinha seria insuficiente para
conferir toda a legitimidade da jurisdição. Afinal, além de a parte ter o
direito de influenciar na formação do convencimento do juiz, tem também o
direito ao procedimento adequado à tutela do direito material.
Tal direito incide sobre o
legislador obrigando-o a instituir procedimentos idôneos assim como sobre o
juiz, especialmente em razão das normas processuais abertas que permitem às
partes o poder de estruturar o procedimento segundo as necessidades do direito
material do caso concreto.
Neste
particular, destaco o art. 139 do CPC/2015 que in litteris: “O juiz dirigirá o processo
conforme as disposições deste Código, incumbindo-lhe:
III - prevenir ou reprimir
qualquer ato contrário à dignidade da justiça e indeferir postulações meramente
protelatórias;
IV - Determinar todas as medidas indutivas,
coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento
de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação
pecuniária;
V - Promover, a qualquer tempo, a
autocomposição, preferencialmente com auxílio de conciliadores e mediadores
judiciais;
VI - Dilatar os prazos processuais e alterar a
ordem de produção dos meios de prova, adequando-os às necessidades do conflito
de modo a conferir maior efetividade à tutela do direito;
VII - exercer o poder de
polícia, requisitando, quando necessário, força policial, além da segurança
interna dos fóruns e tribunais;
VIII - determinar, a
qualquer tempo, o comparecimento pessoal das partes, para inquiri-las sobre os
fatos da causa, hipótese em que não incidirá a pena de confesso;
IX - Determinar o suprimento de pressupostos
processuais e o saneamento de outros vícios processuais;
X - quando se deparar com diversas demandas
individuais repetitivas, oficiar o Ministério Público, a Defensoria Pública e,
na medida do possível, outros legitimados a que se referem o art. 5o da
Lei no 7.347,
de 24 de julho de 1985, e o art. 82 da Lei no 8.078,
de 11 de setembro de 1990, para, se for o caso, promover a propositura da ação coletiva
respectiva.”
O processo, nessa perspectiva,
exige mais um plus em relação à fria
e neutra concepção de relação jurídica processual. Assim a adequação
procedimental está relacionada aos princípios constitucionais de justiça. A
legitimidade da jurisdição não depende apenas da participação dos
jurisdicionados, mas igualmente da legitimidade de sua própria decisão que para
Luhmann[3], não se apresenta como
questão autônoma.
Inegavelmente uma das questões
mais empolgantes do processo contemporâneo é a legitimidade da decisão
jurisdicional especialmente quando o julgador confronta a lei
infraconstitucional diante dos direitos fundamentais, tarefa imprescindível ao
Estado Constitucional[4].
Sobre essa tormentosa questão
controvertem-se no mínimo três correntes doutrinárias, a saber: os
textualistas, os procedimentalistas e os substancialistas, cada uma dando sua
solução ao problema da legitimidade da decisão, o que afeta a jurisdição e o
processo que necessariamente aponta para decisão posta legitimada pelos
direitos fundamentais.
Lembremos que a decisão
judicial é o ato máximo de positivação do poder jurisdicional, ou seja, a razão
de ser e de seu desenvolvimento.
O processo, ao culminar em
decisão que coloca o direito fundamental em confronto com a lei
infraconstitucional, requer abertura à participação e observância de
argumentação peculiar, inclusive do próprio juiz.
A percepção da autonomia e a
natureza pública do direito processual não constitui fundamento para se
perguntar apenas pelo fim do processo esquecendo-se do procedimento.
Engana-se que veja no
procedimento uma mera sequência de atos que não tenha finalidade e nem visa
atender aos objetivos e necessidades específicas.
O procedimento no plano
dinâmico tem evidente compromisso com os fins do processo e da jurisdição e,
portanto, com a tutela dos direitos. ··.
O processo visto como
instrumento para a atuação da lei na esteira de Wach[5] e Chiovenda não permite
perceber que a jurisdição depende do procedimento que é fixado em abstrato pelo
legislador e, é aplicado e construído no caso concreto e, assim, compreendido
pelo juiz.
A jurisdição no Estado
contemporâneo caracteriza-se a partir do dever estatal de dar tutela aos
direitos, com base nos direitos fundamentais, seja através de normas,
princípios e atividades de jurisdição.
Ademais, o Estado
Constitucional tem o dever de proteger todas as espécies de direito, com isso o
juiz, é mais que mero aplicador da lei, tem o dever de compreender a lei a
partir dos direitos fundamentais, no caso concreto.
É verdade que a sentença ao
interpretar a lei e aplicá-la, confere características ao caso concreto, mas é
impossível que diante da pluralidade e diversidade da sociedade brasileira e
das constantes transformações dos fatos sociais, sendo necessário muito mais
que isso, uma vez que a interpretação da lei, ou a norma formulada pelo juiz,
dependa do sentido outorgado ao texto e ao caso concreto. Portanto, é
imprescindível compreender de perto o caso concreto.
O significado redimensionado
do contraditório foi ampliado a partir daquele previsto pelo direito liberal.
Vai além da simples bilateralidade em audiência, estabelecendo o dever de
diálogo e o direito de influência dos litigantes sobre o convencimento judicial
e, na vedação da decisão-surpresa.
Embora o CPC/2015 aluda ao
processo de conhecimento e ao processo de execução, é preciso reconhecer que o
processo não possa ser qualificado como de conhecimento ou como de execução.
Isto porque conhecer e
executar são atividades desempenhadas pelo juiz ao longo do processo.
Conhecimento e execução são técnicas processuais que o juiz se vale para
satisfazer ou acautelar os direitos, valendo-se do processo.
Essa divisão atende mais a organização ligada à tradição encarnada e positivada pelo Código Buzaid, do que a uma necessidade teórica ou prática supostamente inerente à estruturação do processo civil.
A rigor, o CPC/2015 sequer
poderia ser chamado de processo de conhecimento na medida em que se admite a
antecipação de tutela, e o cumprimento de sentença que deduzem a prática de
atos concretos que interferem efetivamente na órbita jurídica patrimonial dos litigantes.
Fazendo-nos a admitir que o processo de conhecimento admita dentro de si a
atividade executiva, o que reflete evidente contradição.
O CPC/2015 não mais divide o
procedimento comum de cognição ampla e exauriente em ordinário e sumário, como
fazia o Código anterior.
O procedimento comum é aquele
que se aplica à tutela cognitiva em caráter geral, é apenas um. Salvo os
procedimentos especiais, todas as ações de cognição (aquelas que objetivam a
uma sentença de definição de um conflito caracterizado pela incerteza de uma
situação jurídica controvertida) submetem-se ao procedimento previsto pelos
arts. 318 ao art. 538 do CPC/2015.
O procedimento no direito
brasileiro é sincrético ou unitário, assim, há uma única relação processual que
se presta a alcançar a sentença que define a situação conflituosa.
Não vige mais a velha
dicotomia entre a ação de conhecimento e a ação de execução de sentença (actio iudicati). O cumprimento da
sentença é apenas um capítulo ou parcela do procedimento comum que se segue à
definição do direito subjetivo material, ameaçado ou lesado, rumo a realizar,
concretamente a prestação a que faz jus aquele que provimento judicial que
reconheceu como titular de uma situação de vantagem tutelada pela ordem
jurídica.
O Código Buzaid, em sua
manjedoura em 1964, fora entregue ainda na qualidade de mero Anteprojeto,
atendendo ao convite do então Ministro da Justiça Oscar Pedroso Horta. Veio
somente em 1972, finalmente como projeto que fora encaminhado para o Congresso
Nacional, sendo aprovado e sancionado em 1973, pelo Presidente da República,
Emílio Garrastazu Médici, devidamente coadjuvado pelo então Ministro da Justiça
e seu autor, Alfredo Buzaid.
Sofrera o Código Buzaid forte
influência da processualística alemã do século XIX quando predominava o
pensamento pandectista, que, aliás, retirou seu nome do Pandectas também conhecido como Digesto que representava uma vasta
compilação de textos de mais 1500 livros escritos por jurisconsultos da época
romana clássica e que buscava a integração do Direito Romano modificado pelo
Direito Canônico (e ressalte-se humanizado por este) às leis imperiais alemãs e
ao direito consuetudinário local.
Possuía cunho primordialmente
normativista, considerava que o costume jurídico encontrava sua força cogente
por meio da vontade do legislador, plasmada pelo direito positivo. Sua
principal contribuição foi o uso do conjunto de sistematização e da
terceirização da experiência jurídica.
O pandectismo repudiava as
teorias jusnaturalistas bem como a concepção absoluta ou abstrata da ideia do
direito, considerado como um corpo de normas positivas a ser estabelecido com
base no sistema científico do direito romano e, apresentava pontos de
identidade com a Escola Francesa da Exegese[6], desenvolvida na mesma
época.
Diferentemente dos franceses
cuja premissa era a lei positivada e consubstanciada pelos Códigos promulgados
por Napoleão Bonaparte, os pandectistas, ante a inexistência de legislação
semelhante a francesa, procuravam se inspirar mais nos estudos romanísticos da
Escola Histórica do Direito[7].
Chiovenda[8] fora doutrinador essencial
e esclarecedor ao elaborar o estudo “Romanismo e germanismo no processo civil”
em 1901 que consoante Calamandrei[9], um dos mais vigorosos
discípulos do doutrinador italiano, constitui um dos pilares de toda obra
chiovendiana, sendo célebre também o estudo publicado em 1903 e intitulado “A
ação no sistema dos direitos”.
Buzaid recomendou a obra
“Instituições de Processo Civil” de Chiovenda como sendo o livro-mestre para a
compreensão de todo o CPC/1973, o que fora reforçado pelo ilustre doutrinador
Cândido Rangel Dinamarco.
A influência do conceitualismo processual[10] europeu no CPC/73 é nítida e notável a partir de sua estrutura. E, mesmo em linhas básicas podiam ser compreendidas diante de suas relações com a realidade social e o direito material civil que vivenciava o mesmo clima de cientificismo da época.
Na época de Buzaid bastavam
existir o processo de conhecimento, de execução e cautelar. Isto porque, devido
à visão conceitualista, o que interessava eram apenas os conceitos apenas
puramente processuais, impermeáveis ao direito material.
O processo[11] de conhecimento visa dar
a razão a uma das partes mediante sentença declaratória, constitutiva ou
condenatória. Inicia com a propositura da ação (protocolada a petição inicial)
que representa o direito ao processo e a um julgamento de mérito que termina
com a prolação de sentença.
O estudo da distinção entre o
processo e o procedimento representa um marco referencial da evolução
científica alcançada pelo direito processual. Por muito tempo a natureza
jurídica do processo tida como relação jurídica defendida por Büllow em sua
obra sobre as exceções e os pressupostos processuais feita em 1868.
A imanência do processo à
jurisdição por ser instrumental é fundamento para o agrupamento em
classificação conforme os fins da tutela requerida, por isso, a doutrina aponta
três clássicos tipos: o processo de cognição, de execução e o cautelar.
O processo de conhecimento é aquele onde a tutela jurisdicional exerce a mais genuína das missões: a de dizer o direito, a do poder de julgar. A execução é necessariamente posterior à cognição ou, pelo menos, à atividade que lhe deu origem. Há a conexão sucessiva entre a execução e cognição. Atua o juiz em execução através de meios sub-rogatórios.
O critério que fundamenta a
separação entre a cognição[12] e a execução é o critério
da atividade do juiz. Pelo direito romano clássico não se trata de fases
distintas de um mesmo processo, mas apenas atividades que devem ser realizadas,
de maneira naturalmente autônoma, em dois processos distintos.
Naquele o juiz apenas conhece
com o fim de decidir a causa, já no outro promove a adequação da realidade
àquilo que se encontra expresso no título judicial executivo.
Já o processo cautelar visa
assegurar que uma das partes, ou o próprio processo venha a sofrer dano
jurídico ocasionado pelo perigo de demora. O provimento cautelar é, nessa
linha, dependente do provimento do processo de cognição ou de execução.
É uma proteção provisória
emprestada aos processos de conhecimento e de execução. Por essa razão, passou
a se chamar tutela provisória[13] que se divide em tutela
de urgência e tutela de evidência.
No contexto do Estado
Constitucional do CPC de 2015 só pode ser entendido como sério esforço do
legislador infraconstitucional para densificar o direito de ação como direito a
um processo justo e, muito especialmente, como um direito à tutela
jurisdicional adequada, efetiva e tempestiva.
E, o mesmo se aplica ao
direito de defesa. O processo civil passa a ser concretização dos direitos
fundamentais processuais civis previstos na Constituição vigente. O CPC/2015
reafirma-se como código contemporâneo e, antes de tudo, um Código Central, cuja
ordem e unidade estão asseguradas pela Constituição Federal vigente.
O novo CPC brasileiro conta
com uma parte geral e uma parte especial dividida em processo de conhecimento,
cumprimento de sentença e processos nos tribunais e os meios de impugnação das
decisões judiciais.
Segundo Marinoni basicamente a
divisão está centrada em processo de conhecimento e processo de execução. E,
tanto um como o outro processo se resolvem como sincréticos. A rigor, o
processo de cognição não é somente de conhecimento assim como o processo de
execução não é apenas execução conforme se reputa.
Deve o CPC/2015 ser visto e
interpretado pela tutela de direitos, sendo apropriado haver uma reconstrução
interpretativa do sistema processual do novo CPC com base na teoria da tutela
dos direitos.
Dogmaticamente, podemos
dividi-lo em três grandes linhas doutrinárias: a primeira voltada para a teoria
geral do processo civil; a segunda preocupada com a tutela dos direitos
mediante o procedimento comum; e a terceira relacionada à tutela de direitos
mediante procedimentos diferenciados.
Há inúmeras técnicas
processuais que podem ser usadas como antecipatórias e as executivas e, ainda,
a tutela preventiva ou inibitória.
O uso de cláusulas gerais dotadas
com normas abertas e permeáveis dá maior importância à tutela de direitos não
patrimoniais como, por exemplo, os direitos de personalidade, o direito ao meio
ambiente equilibrado, o direito à higidez do mercado financeiro, o direito à
saúde, o direito à educação e o direito à segurança do trabalho dentre vários
outros.
O novo CPC utiliza expressões
que permitem a construção de sistema para a tutela dos direitos não só de
prestar a tutela repressiva voltada ao dano e vocacionada para a proteção de
direitos patrimoniais. Por isto, cogita em tutela do direito contra o ilícito e
de sua remoção (art. 497, parágrafo único). E, arrola inúmeras técnicas
processuais que podem ser usadas pelo juízo, como as previstas nos arts. 139,
IV, 497, 498, 536, 537 e 538.
A tutela de direitos faz ser
possível a tutela específica aos direitos, incluindo-se a tutela preventiva, ou
seja, a inibitória, rompendo-se com o círculo vicioso da violação dos direitos
e do seu mero ressarcimento em pecúnia como resposta padrão do processo civil.
O processo de conhecimento é
onde predomina a cognição que segundo Watanabe sendo prevalentemente um ato de
inteligência consistente em considerar, analisar e valorar as alegações e
provas produzidas pelas partes, isto é, as questões de fato e as de direito que
são deduzidas no processo e cujo resultado é o alicerce, o fundamento do iudicium, do julgamento do objeto
litigioso do processo.
É um dos mais relevantes
núcleos metodológicos para o estudo do processo contemporâneo e nos conduz ao
exame da técnica pela qual o magistrado tem acesso e resolve as questões que
lhe são postas para apreciação.
Ressalte-se, porém, que a
cognição não é atividade solitária do órgão jurisdicional e se realiza em um
procedimento estruturado no contraditório e organizado segundo o modelo
cooperativo, o que torna a participação das partes imprescindível.
A palavra “questão” assume
dentro da dogmática processual, pelo menos dois significados, a saber: é
qualquer ponto de fato ou de direito controvertido, de que dependa o
pronunciamento judicial. Nessa acepção, dir-se-á com propriedade que “a solução
é meio de que se vale o juiz para julgar”.
Por outro viés, a questão não
constitui, em si, o objeto de julgamento, mas, uma vez resolvida, insere-se
entre os fundamentos da decisão, entre as razões de decidir. Tal acepção é
utilizada pela quase totalidade da doutrina.
Egas Dirceu Moniz Aragão
ressaltava que: “Os litigantes formulam no processo afirmações que, constituem
pontos a examinar. Se uma dessas afirmações (ponto) é contrariada pelo
antagonista de quem a formulou, surge a questão, que é, portanto, o ponto
controverso”.
Desta forma, o vocábulo
“questão” pode ser entendido como thema
decidendum, ou ao menos cada uma das
partes em que ele se fraciona. E, neste caso se assemelha ao mérito, que nada
mais é a questão principal do processo, o seu objeto litigioso.
Cumpre distinguir que há
questões que são postas como fundamento para a solução de outras e, há aquelas
que são colocadas para que sobre estas haja decisão judicial. Em relação a
todas haverá cognitio, em relação às últimas, haverá também julgamento. Todas
enfim compõem o objeto de conhecimento do magistrado, mas somente as últimas
compõem o objeto de julgamento (thema
decidendum) ou objeto da declaração.
As primeiras são as questões
resolvidas incidenter tantum, mas de
regra tal solução não se presta a ficar imune pela coisa julgada. Mas, o
magistrado tem que resolvê-las como uma fase necessária do seu julgamento, mas
não as decidirá. Mas sua solução comporá a fundamentação da decisão. E os
incisos do art. 504 do CPC/2015 elucidam claramente ao informar que não fazem
coisa julgada os motivos da sentença e nem as verdades dos fatos.
Apenas se trata de regra
geral. Mas há casos em que a resolução de uma questão incidental pode, caso
sejam preenchidos certos pressupostos (§§ 1º e 2º do art. 503 do CPC/2015),
tornando-se indiscutível pela coisa julgada material, é o e que pode acontecer,
por exemplo, com a questão prejudicial incidental.
Há questões, no entanto, que
devem ser decididas, não somente conhecidos, são as questões postas para uma
solução principaliter (compõem o
objeto do julgamento), é o que se extrai do art. 503 do CPC: a decisão judicial
tem força de lei, nos limites da questão principal expressamente decidida. A
resolução de questão principal submete-se ao regime comum da coisa julgada – a
resolução da questão prejudicial incidental, que conforme visto, se submete ao
regime especial de coisa julgada.
A questão prejudicial pode ser
incidental ou principal. No primeiro caso, a sua resolução pode, quando
preenchidos certos pressupostos, tornar-se indiscutível pela coisa julgada
material, de acordo com o regime jurídico comum. Note-se que a coisa julgada
material de regime especial não se forma conforme a previsão contida nos
primeiros e segundo parágrafos do art. 503 do CPC/2015.
A resolução da questão principal submete-se ao regime comum da coisa julgada enquanto que a resolução de questão prejudicial incidental se submete ao regime especial de coisa julgada.
A inconstitucionalidade da
lei, cuja aplicação in concreto se discute judicialmente, é questão prejudicial
que pode ser examinada por qualquer órgão julgador do Judiciário. Com a questão
prejudicial, o magistrado resolvê-la-á incidenter
tantum.
O controle difuso de
constitucionalidade das leis caracteriza-se exatamente por essa peculiaridade,
ou seja, qualquer magistrado, em qualquer processo, pode identificar a
inconstitucionalidade e examiná-la como fundamento de sua decisão.
No entanto, a
constitucionalidade da lei pode compor objeto litigioso do processo, pode ser a
questão principal, o thema decidendum.
É o que ocorre nos processos de controle concentrado de constitucionalidade das
leis (ação direta de inconstitucionalidade, ação declaratória de constitucionalidade
ou arguição de descumprimento de preceito fundamental).
Quando figurar como questão
principal a constitucionalidade da lei federal somente pode ser examinada pelo
STF, que tem competência exclusiva para decidir sobre a questão.
Observa-se que enquanto todos
os juízes podem conhecer dessa questão (incidenter
tantum) como simples fundamento, somente o STF pode decidir sobre esta como
principaliter ou thema decidendum, ou ainda, objeto de julgamento. É por isso, que a
solução de questão prejudicial incidental não se submete à coisa julgada, se o
juízo não tiver competência em razão da matéria para tanto (art. 503, §1º, III
do CPC/2015).
Atente-se que a distinção
entre questão incidental e questão principal é muito relevante para que se
possam confrontar os conceitos de objeto de processo e objeto litigioso do
processo.
O objeto do processo é
conjunto do qual o objeto litigioso do processo é elemento. Enquanto que o
objeto do processo abrange a totalidade das questões que estão sob a apreciação
dos órgãos julgadores, o objeto litigioso do processo restringe-se a um único
tipo de questão principal, o mérito da causa, da pretensão processual.
Conclui-se que o primeiro objeto faz parte apenas da cognição do magistrado
enquanto que o segundo corresponde ao objeto da decisão.
O conceito de demanda costuma
ser considerado como o ato que introduz o objeto litigioso, e, portanto, define
o objeto do ato final do procedimento. A demanda pode ser inicial (manejada com
a petição inicial) ou ulterior (como é o caso das demandas recursais,
incidentais, reconvencionais, deduzidas através de pedido contraposto,
incidente de falsidade, denunciação da lide, etc.).
Em doutrina se discute muito
em que consiste o objeto litigioso: se ele é apenas o pedido ou se neste se
inclui também a causa de pedir. Alguns doutrinadores não chegaram a alguma
conclusão, outros anunciam posição sem maior profundidade, mas segundo, a maior
parte da doutrina o objeto litigioso do processo é o pedido.
José Rogério Cruz e Tucci
entende que o objeto litigioso do processo é pedido identificado com a causa de
pedir. E, existe mesmo uma tendência doutrinária nesse mesmo sentido, até em
razão do regramento da coisa julgada no direito brasileiro, e que exige a identidade
de pedido e da causa de pedir para sua configuração (ex vi os arts. 337, §§ 1º, 2º e 4º, e, o art. 508 do CPC/2015).
Também comporá o objeto
litigioso do processo a demanda proposta pelo réu, por reconvenção ou pedido
contraposto. Mas tal concepção é apontada por Fredie Didier Jr., como
insuficiente.
Pois quando o réu em sua
defesa exerce um contradireito (direito que se exercita em face do exercício do
direito do autor), como nos casos de compensação, exceção de contrato não
cumprido e direito de retenção, o réu acrescenta ao processo a afirmação de um
direito que comporá o objeto litigioso da decisão. O juiz decidirá sobre a
existência desse contradireito, o que corresponde também a uma questão
principal.
Afinal, o contradireito é uma
situação jurídica ativa, situação de vantagem exercida como reação ao exercício
de um direito. É um direito contra outro direito, assim como o antídoto é um
veneno contra um veneno. É um direito que não é exercido por ação. A afirmação
desse direito é feita na defesa, e não na ação.
Quando reconvém, ou formula
pedido contraposto, o réu afirma ter direito e não um contradireito contra o
autor. Os contradireitos servem para neutralizar a situação jurídica afirmada
pelo autor, como é o caso da prescrição ou da exceção do contrato não cumprido,
ou extingui-la, como no caso da compensação e do direito previsto no §4º do
art. 1.228 do Código Civil brasileiro.
Há quem designe os primeiros
como as exceções substanciais, enquanto os outros seriam os direitos
potestativos exercitados na defesa. Talvez fosse preferível designar tudo como
exceção substancial, que se dividiria em duas espécies, conforme a respectiva
eficácia.
Desta forma, o réu ao
exercitar um contradireito, afirma a causa deste e pede a consequência jurídica
dele decorrente. A defesa, neste caso, não consiste em mera alegação de fato
impeditivo ou extintivo do direito afirmado pelo demandante, e, nem se trata de
defesa direta que nega os fatos afirmados pelo demandante ou questiona as
consequências jurídicas pretendidas. Trata-se de defesa pela qual o réu exerce
um direito, uma situação jurídica ativa, cuja peculiaridade é exatamente ser
exercida contra a afirmação de um direito feita por outra pessoa.
Portanto, o objeto litigioso
significa o conjunto de afirmações de existência de um direito feitas pelo
autor e pelo réu. Assim, o mérito do processo é o resultado da soma de dois
binômios, a saber: afirmação do direito pelo demandante (pedido somado à causa
de pedir) somando a afirmação do contradireito pelo réu (pedido mais a causa da
exceção).
E durante o processo, o objeto
litigioso pode ser ampliado, com a propositura de demandas incidentais, tais
como a denunciação da lide e o incidente de falsidade documental (que se
transformou em preliminar de contestação).
Conclui-se
que o exame da admissibilidade do procedimento corresponde ao exame da
possibilidade de o objeto litigioso ser apreciado. O que é aplicável a qualquer
procedimento, e não apenas ao procedimento principal: há objeto litigioso no
recurso, na exceção de incompetência relativa, na exceção de suspeição, na
reconvenção, e etc.
Quanto às questões de fato e de direito, há se lembrar de que fato e norma são elementos essenciais ao fenômeno jurídico: a eficácia jurídica surge após a incidência da hipótese normativa no suporte fático concreto (fato ou conjunto de fatos); ex facto oritur jus.
O fato
jurídico é exatamente o fato ou conjunto de fatos aptos a produzir os efeitos
jurídicos, em razão da incidência, o efeito jurídico é a consequência normativa
que decorre do fato jurídico.
Seja qual for a postulação
judicial, o demandante há de descrever os fatos e sobre o enquadramento normativo
do seu pleito. A tarefa de aplicação do direito será feita através do julgador
que irá examinar razoavelmente as questões de fato e as questões de direito. E,
a distinção entre uma e outra é complexa.
Um primeiro critério
distintivo fulcra-se no objeto da questão, na matéria na qual versa, seja
fática ou jurídica (fato jurídico ou efeito jurídico). Infelizmente, não é o melhor critério, pois é
indiscutível que mesmo no suporte fático concreto, se possa encontrar um fato
jurídico (fato após a incidência normativa) ou um efeito jurídico (relação
jurídica, direito, dever etc.).
Sendo possível funcionar como
questão fática uma questão que, olhada exclusivamente em seu objeto, mereceria
inclusão entre as questões jurídicas. É o caso da ação rescisória (art. 966 do
CPC/2015) onde boa parte dos fatos aptos a ensejar a rescisória envolve as
questões jurídicas como prevaricação, concussão, corrupção e, etc. E nem por
isso, se pode cogitar, numa perspectiva funcional, seriam estas questões de
direito.
Portanto, reafirma-se ser
melhor distingui-las com base no critério funcional. Considera-se a questão de
fato toda aquela relacionada aos pressupostos fáticos da incidência, toda
questão relacionada à existência e às características do suporte fático
concreto, pouco importa se, examinada pela perspectiva do objeto, é questão de
fato ou questão de direito. Assim, toda questão relacionada à causa de pedir
será considerada questões de fato.
A questão de direito é aquela
relacionada com a aplicação da hipótese de incidência no suporte fático, são
todas as questões relacionadas às tarefas de subsunção do fato ou conjunto de
fatos à norma ou de concretização do texto normativo.
As questões de direito podem
ser apreciadas de ofício pelo magistrado. Vige a regra iuria novit curia, ou
seja, do direito cuida o juiz. Mas, o magistrado não resta adstrito à
iniciativa da parte para identificar a norma jurídica que lhe caiba aplicar.
Lembrando que tal tarefa deve ser realizada em respeito ao princípio da
cooperação (art. 6º do CPC/2015) e à regra que veda a decisão surpresa (art. 10
do CPC/2015).
Algumas questões de fato, como
aquelas relacionadas à causa de pedir e às exceções em sentido estrito, não
podem ser reconhecidas pelo juiz sem que tenha havido provocação da parte ou de
interessado (arts. 141 e 492 do CPC/2015); outras, no entanto, podem ser examinadas
ex officio, como se percebe do art.
493 do mesmo diploma legal.
As questões de direito não se
submetem, em regra à preclusão e podem ser alegados a qualquer tempo,
ressalvada a existência de anterior decisão a seu respeito, enquanto que as
questões de fato, ao contrário, no mais das vezes se submetem à preclusão.
Há incidentes processuais que somente
podem ter por objeto questões de direito, como é o caso do incidente de
resolução de demandas repetitivas (arts. 976 e seguintes do mesmo diploma
legal). Os recursos extraordinários, o recurso especial que somente podem ter
objeto de julgamento uma questão de direito.
As questões de fato compõem o
objeto de prova, ao passo que as questões de direito não requerem prova, mas
não se pode confundir, entretanto, com a prova do direito, a que se refere o
art. 376 do CPC/2015, pois neste caso, o teor e a vigência do direito objetivo
são fatos.
Outra importante definição
para o processo de conhecimento e, para o processo como um todo. É a definição
de questões prévias que se dividem em questões preliminares e questões
prejudiciais[14].
É cediço que existem questões
que devem ser examinadas antes, posto que sua solução preceda logicamente à de
outra. Eis as questões prévias e que sempre pressupõe a existência de ao menos
duas questões: a precedente e a subordinada. Quando entre as duas ou mais
questões existir relação de subordinação, dir-se-á que a questão subordinante é
uma questão prévia.
As questões prévias dividem-se
ainda em prejudiciais e preliminares. Entre duas ou mais questões pode existir
uma relação de ordenação, no sentido de que as duas questões, ou mais
exatamente as soluções que se lhe deem, estão ordenadas a um fim comum.
Não se distinguem às questões
prévias pelo seu conteúdo (mérito ou não-mérito). O que realmente importa na
distinção entre prejudicial e preliminar, não é, a natureza da questão
vinculada, mas o teor de influência da questão vinculante terá sobre a
vinculada.
Trata-se de equivocada
distinção que se faz entre prejudiciais, como se fossem sempre de mérito, e as
preliminares como se fossem sempre processuais.
A correta distinção baseia-se na relação que mantêm as diversas questões
postas à cognição judicial.
De qualquer forma, é relevante
sublinhar que a conceituação de questão preliminar e questão prejudicial são
conceitos relativos, não há de se cogitar que uma questão X que seja, em si
mesma, prejudicial ou preliminar, mas que é prejudicial ou preliminar da
questão Y.
Adotando a concepção de José
Carlos Barbosa Moreira. Considera-se preliminar a questão cuja solução,
conforme o sentido em que se pronuncie, cria ou remove obstáculo à apreciação
da outra. A própria possibilidade de apreciar-se a segunda questão depende,
pois, da maneira por que se resolva a primeira.
A preliminar é uma espécie de
obstáculo que o magistrado deve ultrapassar no exame de uma determina questão.
É como se fosse um semáforo acesa a luz verde, permite-se o exame da questão
subordinada, caso se acenda a vermelha, o exame torna-se impossível.
Normalmente se afirma que a
questão preliminar não pode ser objeto de processo autônomo, tendo em vista o
conceito estreito de questão. É plenamente possível que uma questão principal
(pedido) seja preliminar a outro.
Para Barbosa Moreira existem
três tipos de questões preliminares[15]: preliminares ao
conhecimento do mérito da causa, preliminares de mérito e preliminares de
recurso.
As questões preliminares ao
conhecimento do mérito da causa são, na medida em que, a depender da solução
que se lhes dê, podem impedir o exame do objeto litigioso do processo. Tais
preliminares são questões processuais.
As questões preliminares de
mérito já estão situadas dentro do meritum
causal, e são suscetíveis de serem resolvidas em certo sentido, de dispensar o
órgão julgador de prosseguir em sua atividade cognitiva (é o caso da
prescrição). Mas, é bom sublinhar, que nem sempre a prescrição seja uma questão
preliminar.
Pois conforme aduz Barbosa
Moreira, a prescrição é uma questão preliminar em relação às demais questões de
defesa suscitadas pelo demandado, uma vez acolhida a prescrição, as demais
alegações do réu, nem sempre serão examinadas. Sucede que a prescrição é,
porém, uma questão prejudicial ao exame do pedido (questão principal do
processo); uma vez acolhida a prescrição, rejeita-se o pedido.
O pedido será examinado, porém
não será acolhido. Reforça-se o que já se afirmou: uma questão não é
essencialmente preliminar ou prejudicial. Vai depender sempre do tipo de
relação de subordinação que mantém com a outra questão.
Quanto às questões
preliminares de recurso são aquelas cuja solução depende a possibilidade de
julgar-se o mérito da impugnação. São preliminares de recurso todos os seus
requisitos de admissibilidade, tais como: cabimento, legitimidade, interesse,
inexistência de fato impeditivo ou extintivo do direito de recorrer,
tempestividade, regularidade formal e preparo.
Considera-se questão
prejudicial aquela cuja solução dependerá não a possibilidade nem a forma do
pronunciamento sobre a outra questão, mas o teor mesmo desse pronunciamento.
A segunda questão depende da
primeira não no seu “ser”, mas no seu “modo de ser”. A questão prejudicial
funciona, utiliza Didier a metáfora, uma placa de trânsito que determina para
onde o motorista (o magistrado) deve seguir.
Costuma-se aduzir que as
questões prejudiciais[16] podem ser objeto
autônomo. Exemplificando sobre as questões prejudiciais: a) validade de
contrato, na demanda que se pretenda sua execução; b) filiação, na demanda por
alimentos; c) a inconstitucionalidade da lei, na demanda em que se pretenda a
repetição do indébito tributário, etc.
Quando a questão prejudicial
for o próprio objeto litigioso do processo, a ser resolvida como principaliter, a doutrina costuma
referir-se à causa prejudicial, ao invés de questão prejudicial, expressão que
é restrita à situação em que o exame da questão fará parte apenas da
fundamentação da decisão.
É de fato um problema
terminológico, basta que se tenha em vista que tanto é questão a que apenas
será conhecida como aquela que, além disso, será decidida.
A questão prejudicial pode ser
interna, quando surge no mesmo processo em que está a questão subordinada, ou
externa, quando está sendo discutida em outro processo. A distinção é relevante
para fins de suspensão do processo (art. 313, V, a do CPC/2015).
Tratando-se de questão
prejudicial interna, é possível que sua resolução como questão principal, não
seja da competência do juízo do processo, ainda que este detenha competência
para julgamento da questão prejudicial.
Nesse caso, três são as
possíveis soluções: a) remessa de todo o processo para o juízo competente para
o julgamento da questão prejudicial, que também teria a competência para
julgamento da prejudicada (como pode ocorrer com a aplicação do art. 947 do
CPC/2015); b) atribuição de competência ao juízo da causa para,
incidentalmente, resolver à questão prejudicial (por exemplo: art.93,§1º do
CPC/2015); c) são de julgamento, com a remessa do exame da questão prejudicial
para a solução pelo juízo com competência exclusiva para a matéria trata nesse
julgamento incidental, retornando o processo, a seguir, ao juízo originário
para a resolução da questão principal, de acordo com o que se houver decidido
no incidente (é o que ocorre no incidente de inconstitucionalidade em
julgamento no tribunal, arts. 948, 949 do CPC/2015).
A questão prejudicial pode ser
homogênea quando for integrante do mesmo ramo do Direito da questão subordinada
(filiação/alimentos) ou pode ser heterogênea, quando pertencem as questões a
ramos distintos de Direito (validade do casamento/crime de bigamia).
Essa distinção tem relevância
para a solução dos problemas relacionados com a conexão por prejudicialidade.
Se for heterogênea e externa a questão prejudicial, dificilmente será possível
a reunião dos feitos como efeito da conexão por prejudicialidade, por força da
incompetência absoluta em razão da matéria, a determinar, por isso mesmo, a
suspensão de um dos processos (art. 313, V, a do CPC/2015). Quando, não
obstante a heterogeneidade, o juízo tiver competência material para conhecer de
ambas, a reunião das causas se impõe, em razão da conexão.
Com a evolução dos estudos
processuais, disseminou-se a distinção entre os conceitos de ação, processo e
mérito, passando a doutrina a classificar as questões conforme o seguinte
trinômio: pressupostos processuais (que abarca tanto os de existência, como de
validade do processo), condições da ação e as questões de mérito.
Percebe-se que tal
classificação tem por base o objeto das questões. É mais correto dividir as
questões em de mérito e de admissibilidade, sendo que os pressupostos
processuais correspondem às questões de admissibilidade.
É que dois são os juízos
realizados pelo magistrado: o de admissibilidade (analisa a validade do
procedimento, a aptidão para prolação de sentença) e o juízo de mérito (juízo
sobre o objeto litigioso). Se apenas existem dois tipos de juízo, porém é
possível distinguir três tipos de questão: ou a questão é de mérito ou é de
admissibilidade, tertium non datur (princípio lógico do terceiro excluído).
Há requisitos de
admissibilidade do procedimento principal (aquele instaurado pela demanda
inicial), cuja ausência compromete todo o processo, e os requisitos de
admissibilidade de cada procedimento incidente ou recurso que companha a
estrutura da relação jurídica processual (requisitos de admissibilidade do
recurso, das exceções instrumentais, etc.), cuja falta inviabiliza apenas o
procedimento a que se relaciona.
Enfim, o juízo de
admissibilidade do procedimento consiste na verificação da possibilidade de o
objeto litigioso do procedimento ser apreciado.
As questões de mérito (lato sensu) podem ser divididas em: as
resolvidas pelo juiz com mero fundamento é o caso de algumas defesas do réu, o
exame da questão incidental de mérito. A doutrina geralmente nomeia apenas
essas como questões de mérito.
E, o mérito propriamente dito
ou stricto sensu que é a questão principal, correspondente ao objeto litigioso.
Chama-se de juízo de mérito a decisão sobre a questão de mérito principal, em
que se examinam as outras questões de mérito (fundamentos).
A legitimidade ad causam extraordinária é uma questão
de admissibilidade, mas pode vir a ser questão de mérito de um recurso onde se
discuta a ilegitimidade de uma das partes, a competência do juízo, é
geralmente, uma questão de admissibilidade, mas poderá ser questão de mérito na
ação rescisória por incompetência absoluta (art. 966, II do CPC/2015) e no
conflito de competência.
Quanto uma questão, que inicialmente era processual, vem a compor o mérito, haverá outras questões processuais que serão questões de admissibilidade. Sendo questão de mérito de um procedimento principal um pressuposto processual, a sua análise estará apta a ficar imune com a coisa julgada material.
O mérito do procedimento pode
ser composto somente por questões anteriormente eram processuais. Pois quando
se torna objeto litigioso do processo, a questão deixa de ser processual e
passa a ser uma questão material ou de mérito.
Não se pode ignorar que o
órgão jurisdicional realiza dois juízos no processo: admissibilidade e mérito.
E, o primeiro é preliminar ao segundo. E, em cada um desses juízos, há questões
incidentes e questões principais.
A questão principal do juízo
de admissibilidade é a validade do procedimento, a questão principal do juízo
de mérito é o pedido e a sua respectiva causa de pedir. Todas as questões que devem ser examinadas
para a solução dessas questões principais, são as questões incidentais.
Quanto às espécies de cognição
pode ser visualizada em dois planos: no horizontal (extensão) que se refere à
extensão e amplitude das questões que podem ser objeto da cognição judicial. É
onde se definem quais as questões podem ser examinadas pelo magistrado. A
cognição, assim poderá ser: plena onde não há limitação ao juiz conhecer; ou
poderá ser parcial ou limitada quando é limitado o que o juiz pode conhecer.
O procedimento comum é de
cognição plena, na medida em que não há qualquer restrição da matéria a ser
posta sob apreciação; o procedimento especial da desapropriação, no entanto, é
de cognição limitada, porquanto não se possa, em seu bojo, discutir a validade
do ato expropriatório.
A limitação da cognição
normalmente favorece à razoável duração do processo, daí a razão de muitos
procedimentos especiais terem por característica exatamente a limitação
cognitiva.
No plano vertical
(profundidade) que diz respeito ao modo como as questões serão conhecidas pelo
juiz.
A cognição ainda poderá ser,
portanto, exauriente ou sumária, conforme seja completo e profundo ou não o
exame. Somente as decisões fundadas em cognição exauriente podem estabilizar-se
pela coisa julgada. Daí poder afirmar-se que a cognição exauriente é a cognição
das decisões definitivas.
A cognição plena e exauriente
é a regra. Mas, pode haver a cognição parcial, mas a limitação é apenas do que,
quanto às questões que podem ser resolvidas, a cognição é exauriente, de sorte
que a sentença (julgado) tem aptidão para produzir coisa julgada material.
Ao estabelecer as limitações,
o legislador leva em conta: a) as peculiaridades do direito material e/ou a
necessidade de tornar o processo mais célere.
Ressalvando-se que o direito
de questionar as questões controvertidas excluídas em demanda autônoma. Existe
o prestígio dos valores de certeza e razoável duração do processo, na medida em
que se permite a sentença em tempo inferior àquele que seria necessário ao
exame de toda a extensão da situação litigiosa.
São clássicos exemplos: os embargos de terceiro e a desapropriação.
Vislumbra-se ainda a cognição
eventual[17]
que pode ser plena ou limitada, somente haverá cognição se o demandado tomar a
iniciativa do contraditório, eis porque eventual.
É exemplo a ação monitória
(arts. 700 ao art. 702 do CPC/2015). A estabilização da tutela provisória
satisfativa também se estrutura a partir desta técnica (art. 304 do CPC/2015).
Sendo própria da cognição sumária[18] a possibilidade de tutela
provisória seja esta satisfativa ou cautelar.
Referências:
MARINONI, Luiz Guilherme;
ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel. Novo Curso de Processo Civil. Volume
1. Teoria do Processo Civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015.
DIDIER JR., Fredie. Curso de
Direito Processual Civil. 17ª edição. Volume 1. Salvador: Editora JusPODIVM, 2015.
SILVA, Edward Carlyle. Direito
Processual Civil. 3ª edição. Niterói: Editora Impetus, 2014.
PEREIRA, Clóvis Brasil. Os
procedimentos especiais no Novo CPC nº09 . Disponível em: http://www.prolegis.com.br/os-procedimentos-especiais-no-novo-cpc/ Acesso
em 10.10.2015.
[1]
Rudolf Wassermann (1925-2008) era doutrinador e advogado alemão. Entre
1971-1990 fora presidente do Tribunal Regional Superior de Braunschweig, fora
juiz (1956-1957) no Tribunal de Berlim. Publicou obras intituladas: "As
pessoas no tribunal" (1979), "A democracia espectador" (1986),
"O Poder Judiciário não pode sair da história" (1990) e "O equilíbrio
perturbado" (1995).
[2]
Processo
não é fim e sim instrumento. Não basta se falar que ele é instrumento, o
processo tem fins jurídicos que é efetivar a ordem jurídica material, mas não
só isso. Ele deve efetivar fins sociais e fins políticos, a pacificação social
é preocupação do processo. Os fins sociais devem ate falar mais alto que os
jurídicos.
O processo serve para efetivar o direito estatal, se o processo é ineficaz o Estado também é ineficaz, ele não consegue impor a ordem jurídica. Se eu não acredito no aparato Estatal eu recorro então a outros meios. Por isso fins políticos devem ser conseguidos pelo Direito Processual.
Assim como acontece com Direito civil e administrativo o Direito Processual também está constitucionalizado. Os escopos e princípios constitucionais devem ser buscados pelo Direito Processual. No processo você vai trabalhar também com categorias processuais como a proporcionalidade. A própria questão da efetividade não é um valor absoluto, acima da efetividade, outros valores devem ser considerados. Hoje trabalhamos com o Direito Processual Constitucional, valores Constitucionais são objetos de preocupação do processo.
[3] Niklas Luhmann (1927-1998) foi um sociólogo
alemão, sendo considerado um dos mais importantes representantes da sociologia
alemã contemporânea. Adepto de uma teoria particularmente própria do pensamento sistêmico. Teorizou a
sociedade como um sistema autopoiético. Ao aplicar o conceito dos sistemas
autopoiéticos ao direito. E, conseguiu reduzir a complexidade social. Os seus
estudos apregoam que o direito, em seu viés autopoiético, se recria com base
nos seus próprios elementos. Sua autorreferência permite que o direito mude a
sociedade e se altere ao mesmo tempo movendo-se com base em seu código binário
(direito/não direito). Tal característica permite a construção de um sistema
jurídica dinâmico mais adequado à hipercomplexidade da sociedade atual. O
elemento central da teoria de Luhmann é a comunicação. Sistemas sociais são
sistemas de comunicação e a sociedade é o sistema social mais abrangente. Um
sistema é definido pela fronteira entre ele mesmo e o ambiente, separando-o de
um exterior infinitamente complexo. O interior do sistema é uma zona de redução
de complexidade: a comunicação no interior do sistema opera selecionando apenas
uma quantidade limitada de informação disponível no exterior. O critério pelo
qual a informação é selecionada e processado é o sentido (em alemão Sinn).
[4]
Baseado no pacto fundante do Estado (constituição) são determinadas as questões
absolutamente indispensáveis para a vida, que serão declaradas intangíveis por
meio dos direitos fundamentais e de suas garantias. Daí a afirmação da
funcionalização dos poderes públicos em direção ao cumprimento dos direitos
fundamentais. Desta forma, neste sentido, as imposições constitucionais
careceriam de efetividade se não houvesse um órgão que garantisse, em última
instância, o seu cumprimento. O papel de destaque conferido ao Poder Judiciário
dentro do Estado constitucional de direito consiste em ser o órgão garantidor
deste cumprimento.
[5]
Adolf Eduard Ludwig Gustav (1843-1926) era jurista alemão. Avalia a teoria
Adolf Wach e a divisão do direito à tutela jurídica em uma pretensão de direito
material e outra processual.
Estuda o posicionamento de Giuseppe Chiovenda,
que concebia a ação como um direito potestativo em face do adversário e
concreto, ou seja, dependente da prolação de uma sentença de mérito favorável.
[6]
A Escola da exegese também chamada de Escola filológica, fora uma das primeiras
correntes juspositivistas. Floresceu em França no início do século XIX, a
partir do Código Napoleônico, mas ultrapassou as fronteiras de seu país de
origem, disseminando-se praticamente por toda Europa continental e América
Latina. E, ainda hoje exerce influência no ensino e nas práticas jurídicas dos
países de tradição romano-germânica. As origens da Escola remontam ao quadro
existente após a Revolução Francesa. E, tem como contexto as modificações
trazidas pela revolução liberal ao Estado, à sociedade e ao Direito, o que
criou a necessidade de novas concepções jurídicas que atendesse a nova
realidade.
Destacamos a mudança das
funções do jurista posto que não fosse mais responsável por "criar o
direito", devido à mudança na concepção das fontes do direito, mas
incumbido da tarefa de sistematizar o direito legislado através da sua exegese,
que era a descoberta do sentido do direito expresso em suas normas legais pela
vontade do legislador. Esse novo modo de formar juristas nas faculdades, se deu
através de novo método de ensino que dava primazia a exclusividade da lei, isto
é, no ensino da lei.
Preconizou a multiplicação
das codificações, de maneira que viesse a eliminar as lacunas da lei, com a
utilização de analogia para descobrir a norma oculta dada pela vontade do
legislador, porém não aparente no texto legal, defendia a interpretação mecânica
com base no silogismo, fundada na evidência do sentido literal do texto,
utilizando outros métodos interpretativos apenas com a função de esclarecer a
vontade do legislador que possuía a legitimação única da autoridade da lei, na
medida em que esta é a vontade geral do povo.
[7]
A Escola Histórica do Direito fora percursora do positivismo normativista que
apareceu com a chamada jurisprudência dos conceitos que surgira nos territórios
alemães no início do século XIX e exerceu firme influência em todos os países
de tradição jurídica romano-germânica. Fortemente influenciada pelo romantismo,
partia do pressuposto de que as normas jurídicas seriam o resultado da evolução
histórica e que a essência destas seria encontrada nos costumes e nas crenças
dos grupos sociais. Enxergava o Direito como um produto histórico e uma
manifestação cultural e que nascera do espírito do povo, o que em alemão seria Volksgeist. E, segundo Savigny, o
Direito teria suas origens nas forças silenciosas e não no arbítrio do
legislador.
[8]
Guiseppe Chiovenda (1872-1937) foi reconhecido jurista italiano e autor de
diversas obras jurídicas. Iniciou sua carreira de jurista lecionando nas
Universidades de Parma (1902), Bolonha (1905), Nápoles e, mais tarde, em Roma
(1907). Sua contribuição deu-se principalmente na área do direito processual,
sendo conhecido como um dos maiores expoentes na doutrina jurídica italiana.
Defensor do princípio da oralidade processual, seus pensamentos foram referências
importantes na elaboração do CPC italiano de 1940. É conhecido por ter
influenciado a doutrina processualística, dando-lhe rigor científico, superando
a vetusta teoria imanentista do direito de ação, onde o direito processual era
visto como mero reflexo do direito material. Atribui-se a Chiovenda a primazia
de ter afirmado a autonomia da ação enquanto direito potestativo conferido ao
autor, de obter, em face do adversário, uma atuação concreta da lei. Foi o
principal renovador dos estudos processuais, dotado de sólida formação em
direito romano, com grande domínio da dogmática e da história, tendo sido
criador de uma nova escola científica do direito processual, colocando esta
disciplina jurídica na categoria das ciências independentes e com um lugar próprio
de um sistema geral dos direitos.
[9]
Piero Calamandrei (1869-1956) foi jornalista, jurista, político e docente
universitário italiano. Juntamente com Francesco Carnelutti e Enrico Redenti
foi um dos principais inspiradores do Código Processual Civil italiano, de
1940, onde trabalhou na formulação legislativa e no ensino fundamental da
escola de Chiovenda. Fora impedido de
continuar em sua carreira de professor universitário por não subscrever uma
carta de submissão ao duce que era a
exigência do fascismo reinante. Nomeado Reitor da Universidade de Florença em
26 de julho de 1943, até 8 de setembro, pois foi atingido por um mandado de
prisão, somente exerceu efetivamente seu mandato em setembro de 1944, com a
libertação em Florença, em outubro de 1947.
[10]
É uma visão introspectiva do processo ela vê os próprios conceitos esquecendo o
próprio objetivo do processo. É um estudo muito mais da estática, liga-se muito
mais a preliminares. Ele pode terminar com ou sem resolução do mérito. Quando
termina sem resolução de mérito o conflito não foi resolvido e torna-se uma
grande frustração. A máquina pública é acionada e o conflito fica sem ser
resolvido.
Antes não havia essa
preocupação, e até hoje isso predomina em alguns processualistas.
O processo deve ser voltado
para o lado pragmático, ele deve ter um objetivo que é resolver a lide. A visão
conceitualista trouxe frutos positivos, mas no final ela ficou defasada por ser
muito radical. Está teoria predominou na primeira metade do século XX.
Predominava o Direito a
teoria pura, deveria estudar a norma sem levar em consideração o pensamento da
sociedade, se uma norma obedeceu à forma para ser criada já basta para ter
validade.
No processo a preocupação
era com a pureza, as leis deveriam ser respeitadas religiosamente, não
importando o resultado.
[11]
Conforme assinalou a professora e doutrinadora Ada Pellegrini Grinover o
processo passa por uma transformação da linha abstrata para a linha concreta. A
ideia do processo como um método técnico-jurídico, passa por um histórico de
transformação nos anos 30, da escola processual de São Paulo e, a consolidação
como ramo autônomo do direito, sem se prender ao direito material. Sem dúvidas,
trata-se de uma fase crítica. Afinal chegamos ao processo como matriz
constitucional no Brasil.
E este movimento perde força
ao longo do século XX e ganhou força novamente na década de 1980, com a propagação
de novos direitos e garantias constitucionais. E, ganha uma posição sociopolítica
que abarca o tema de acesso à ordem jurídica justa, a universalidade da jurisdição,
efetividade do processo, instrumento do processo e participação dos sujeitos do
processo. Antes o processo não olha o que existia a sua volta. Depois, na fase
instrumentalista, passa perceber do contexto a sua volta. E, a Constituição,
abre-se um espaço para a crítica da posição sociopolítica. O processo ganha um
objetivo teleológico, finalístico e característico da Constituição Brasileira
de 1988. A transformação revista os institutos, princípios e dinâmica.
[12]
Quanto ao conteúdo da cognição há quatro teorias que o explicam. A primeira
teoria aponta que o objeto da cognição seria formado pelo binômio: pressupostos
e as condições da ação. Sendo certo que o juiz primeiramente deve analisar os
pressupostos processuais e depois as condições da ação. A segunda teoria que é
majoritária é defendida por Kazuo Watanabe, Liebman e Humberto Theodoro Júnior,
seria formado pelos pressupostos processuais, condições da ação e mérito. Para
a terceira teoria defendida por Celso Neves que cogita em pressuposto
processual, supostos processuais, as condições da ação e mérito. Existe segundo
esta teoria apenas um pressuposto processual que é o exercício do direito de
ação e que conhecemos hoje como propositura da demanda. A quarta teoria é de Alexandre
Freitas Câmara que aponta um trinômio por questões preliminares, questões
prejudiciais e mérito. Essa teoria ressalta a existência das chamadas questões
prévias.
[13]
Inicialmente, verifica-se que o CPC/2015 preferiu adotar a terminologia clássica
e distinguir a tutela provisória, fundada em cognição sumária, da definitiva,
baseada em cognição exauriente. Eis o porquê que a tutela provisória (seja de
urgência ou de evidência), quando concedida, conserva a sua eficácia na pendência
do processo, mas pode ser a qualquer momento, revogada ou modificada (art.
296). Ainda, cabe dizer, que a competência para seu conhecimento será do juízo
da causa ou, quando requerida em caráter antecedente, do juízo competente para
o pedido principal, podendo o magistrado determinar as medias que considerar
adequadas para a efetivação.
Especificamente, a tutela
de urgência é espécie da tutela provisória, que se subdivide em tutela de urgência
antecipada e tutela de urgência cautelar e que podem ser requeridas e
concedidas tanto em caráter antecedente ou incidental. Apesar de todos os esforços
doutrinários em diferenciar a tutela antecipatória e a tutela cautelar, o texto
positivado em verdade promoveu a aproximação dessas duas tutelas jurisdicionais
fundadas na urgência, ou seja, na necessidade imperiosa de dar solução, ainda
que provisória, a determinada situação grave e que tem o tempo como maior
inimigo.
O Código Fux deixa claro
que os requisitos comuns para a concessão da tutela provisória de urgência que
são: a probabilidade do direito ou fumus
boni iuris; perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo ou periculum in mora. Abandonou-se a
expressão "prova inequívoca de verossimilhança". Eis ainda a conclusão
presente no Enunciado 143 do Fórum Permanente de Processualistas Civis: "A
redação do art. 300, caput, superou a distinção entre os requisitos da concessão
para a tutela cautelar e para a tutela satisfativa de urgência, erigindo a
probabilidade e o perigo na demora a requisitos comuns para a prestação de
ambas as tutelas de forma antecipada”.
[14]
Tracemos as principais características da questão prejudicial: a) é antecedente
lógico do mérito da causa; b) é um caso de superordinação (contrária à
subordinação), ou seja, a prejudicial não está subordinada, é ela que subordina,
que deve ser apreciada antes do julgamento do mérito da causa; c) é autônoma,
porque se esta é questão de direito material, pode ser objeto de ação autônoma.
[15]
Existem as chamadas questões preliminares impróprias ou dilatórias que são
aquelas hipóteses que não acarretam a extinção do processo, tais como a conexão
e a incompetência absoluta. O processo não será extinto, mas sim, remetido ao
juízo competente para o julgamento da causa. Já as questões preliminares
extintivas ou peremptórias, em regra, acarretam a extinção do processo. São
estas: a inépcia da petição inicial, a perempção, a litispendência, a coisa
julgada material, a incapacidade da parte, a convenção de arbitragem, a
carência de ação, a falta de caução ou de outra prestação.
[16]
Parece ser oportuno aludir que o CPC/2015 aboliu a ação declaratória
incidental. Mas, por outro lado, compensando essa supressão passou a coisa
julgada material também abrigar a questão prejudicial ao mérito, restando
ressalvada de indiscutibilidade e estabilidade. É preciso acautelar-se sobre a
dimensão do objeto do processo, para que não se tenha prejuízos futuros.
[17]
A doutrina aponta ainda a cognição eventual plena ou parcial, mas exauriente (secundum eventum defensionis), que ocorrerá naqueles casos em que a cognição do juiz
estará vinculada à eventualidade de o demandado se manifestar no processo. São
os casos de: ação monitória e da ação de exigir contas.
[18]
É aquela baseada em um exame não tão profundo como a realizada na cognição
exauriente, mas que é pautada na existência de uma situação de urgência,
normalmente caracterizadora de uma situação de urgência e de perigo de dano
irreparável ou de difícil reparação, ou até mesmo da evidência do direito
pleiteado. É calcada no juízo de verossimilhança (probabilidade) o que a faz
ter a qualidade de provisória. Exemplificando as tutelas de urgência e de
evidência.